Qual é o seu estado civil?
O que você vai encontrar por aqui: 
  • Novas formas de se relacionar 
  • O mapa da não-monogamia
  • O que é a monogamia revolucionária
  • Consumismo afetivo e as relações líquidas
  • O que é single-shaming 
  • Dicas para tornar suas relações mais sólidas
Boa leitura! 
Qual é o seu estado civil? Essa pergunta, presente em qualquer formulário que você precise preencher na vida adulta, pode ser um gatilho para um turbilhão de emoções. Isso porque relacionamentos amorosos são complexos e vivemos um momento histórico onde novas configurações afetivas surgem (ou ressurgem), na busca por atender uma pluralidade de desejos e necessidades tanto individuais, como do casal. 

Ao mesmo tempo, presenciamos uma espécie de “consumismo afetivo” na sociedade, em que relações duram o tempo exato da satisfação do prazer, para serem rapidamente substituídas na primeira dificuldade, o que o sociólogo Zygmunt Bauman chamou de “amor líquido". Não à toa, aplicativos de relacionamento crescem de forma exponencial no Brasil e no mundo, criando um paradoxo entre nossa busca por conexões reais e a facilidade de “descartar” o outro quando não se encaixa em nosso ideal romântico. 


Como em uma brincadeira de cabo de guerra interior, por um lado sentimos a necessidade de estabilidade, intimidade, cumplicidade e amor. Por outro, um desejo profundo por aventura, novidade e paixão. Conciliar necessidades tão contraditórias nos relacionamentos pode ser um desafio e tanto. Ainda, a intimidade nos coloca cara a cara com muitos de nossos fantasmas. Essa disposição por enxergar nosso lado menos belo e nossas fragilidades pode ser um motivo para afastar muitas pessoas de relacionamentos fixos.

Porém, sabemos que nossas relações possuem um papel crucial no nosso bem-estar e na nossa longevidade, já escrevemos muito sobre isso em nosso portal. Assim, acreditamos que vale a pena entender um pouco mais sobre os diferentes modelos de relacionamentos afetivos sendo praticados e o que cada um propõe, na busca por encontros significativos. Esperamos com isso te ajudar a refletir sobre seus desejos afetivos e, quem sabe, encontrar o formato ideal para o seu momento atual, respeitando a si e ao outro, criando muita felicidade em sua vida, seja a sós, a dois ou a mais.
Fundo no assunto
O casamento é uma construção social


Quando pensamos em relações conjugais temos a tendência de imaginar a seguinte história: duas pessoas se conhecem, se apaixonam, decidem se casar e, idealmente, ficam juntas e felizes até que a morte as separe. Esse roteiro, ainda hoje considerado o “mais bem-sucedido” de todos os cenários românticos, associando amor, sexualidade e casamento, faz parte de uma construção sociocultural que se estabeleceu, em grande medida, a partir do século XVIII, acompanhando uma mudança radical dos valores morais, sociais e econômicos da época.

Atualmente, presenciamos uma nova mudança cultural com respeito ao amor e à sexualidade. Desde a chamada revolução sexual, na década de 60, uma crescente discussão sobre novas configurações de relacionamentos éticos não-monogâmicos tem ganhado espaço na sociedade, propondo outros modelos de união conjugal, inclusive com reconhecimento jurídico

Mas, foi a partir de 2010 que houve, de fato, uma explosão no tema. Miguel Vagalume, mestre em sexologia, mostra em seu Ted Talk um crescimento exponencial nas publicações acadêmicas entre 2010 e 2018, somente com o tema do poliamor. Ele afirma que estamos vivendo mais do que “uma moda” passageira, mas uma transformação cultural na forma como enxergamos a intimidade, algo que ele compara com o surgimento do divórcio. Hoje, o divórcio se tornou algo aceitável na sociedade, mas nem por isso todos os casais se divorciam.

O ponto central de todas as questões ligadas aos relacionamentos amorosos, sejam eles monogâmicos ou não, é a forma como lidamos com nosso desejo. É esse complexo emaranhado de fantasias, o que desperta atração ou não, onde está a lealdade, como eu me sinto com relação ao desejo do outro, que leva uma pessoa a decidir por uma relação de exclusividade sexual e afetiva (monogamia), outra por separar a afetividade da sexualidade e permitir a exploração de relações sexuais com mais pessoas (relações abertas, swing, etc.), ou quem decida viver a pluralidade afetiva (poliamor). 

Compreender que o que consideramos aceitável em um relacionamento é produto de um conjunto de processos sociais, culturais e históricos, pode nos ajudar a revisitar nossas crenças e encontrar, a partir da nossa própria investigação pessoal, o que nos faz mais sentido e, por fim, mais felizes. Ao mesmo tempo, nos ajuda a normalizar a pluralidade de acordos consensuais que surgem atualmente entre as pessoas, em suas buscas pela expressão do afeto e do desejo, reduzindo preconceitos e estereótipos sobre o que é certo e adequado moralmente. 


A não-monogamia é um termo guarda-chuva para modelos de relacionamentos que defendem que amor, desejo e compromisso não precisam ser vivenciados exclusivamente entre duas pessoas. Contudo, ainda que muitos livros, oficinas, congressos, lives, profissionais e experiências diversas com relações não-monogâmicas estejam pipocando em nossa sociedade, esse é um tema que ainda pode gerar muita confusão. Isso porque entrar nos mares ainda pouco explorados dos relacionamentos éticos não-monogâmicos exige não só uma enorme disposição para romper padrões, mas muito diálogo entre todas as partes envolvidas para que funcione. Além disso, historicamente ainda é um tema relativamente novo.

Como colocou Miguel Vagalume, “não é passar de uma relação de dois para três, senão de dois a fazer as coisas de forma diferente”. O que pode, o que não pode, com quem pode, quero saber, não quero saber, o que quero saber, são somente alguns exemplos dos acordos que precisam ser definidos antes de começar um relacionamento não-monogâmico. É preciso compreender até onde vai a liberdade individual e o cuidado mútuo, ser cúmplices nesta mudança radical de paradigma para que gere crescimento pessoal e união.


O mapa da não-monogamia (ainda sem tradução para o português), produzido por Franklin Veaux e divulgado em seu blog Tacit, nos mostra um panorama geral da realidade complexa dos modelos de relação não-monogâmica. Além dos acordos, a falta de limites claros entre um tipo ou outro também pode gerar incertezas e conflitos. Mas, o que fica claro é que estamos vivendo um momento em que nunca se viu tanta diversidade e alternativas aos modelos tradicionais, o que pode ser considerado um ganho social, pois à medida que se tornam mais visíveis, aumentam o respeito e a aceitação a todas as formas de amar. 


Em um momento em que a fidelidade e a exclusividade estão sendo questionadas, é comum encontrar pessoas que criticam a monogamia, colocando-a em uma posição de “modelo ultrapassado”. Porém, como colocou Rita von Hunty, personagem drag queen do professor e ator Guilherme Terreri Lima Pereira, em seu canal no youtube, se por um lado a monogamia pode parecer negativa por nos fazer abrir mão de parte de nossos desejos e vontades, por outro pode trazer o reconhecimento de que o outro não está aqui para nos satisfazer, de que não precisamos ter tudo e é possível ser feliz com pouco. Neste sentido, “a monogamia é uma receita de amadurecimento interpessoal” e de autoconhecimento. 

Renato Nogueira, professor de filosofia e autor do livro “Por que amamos”, defende que a monogamia pode ser revolucionária. Em uma conversa com Carol Tilkian, no canal Soltos, ele explica que o começo de um relacionamento sempre está imerso em fantasia e paixão. Mas, após um tempo de relação, essa fantasia acaba e a intimidade toma conta, revelando vários afetos e sentimentos nem sempre agradáveis. Para ele, a intimidade de um relacionamento monogâmico nos obriga a entrar em contato com nossa humanidade e mostrar ao outro não só nosso lado mais bonito, mas o mais tenebroso também. 
Ele coloca também que, do ponto de vista moral, não há problema algum em ter vários relacionamentos. Já do ponto de vista pragmático, é preciso entender se você tem condições de se entregar para mais de uma pessoa. O ponto chave é a responsabilidade afetiva que devemos ter com todas as pessoas com quem nos envolvemos e, para isso, faz-se necessário saber o que cada um pode dar conta.  

Por fim, Nogueira propõe uma mudança de olhar sobre a origem do desejo. Enquanto a psicanálise afirma que o desejo se dá pela falta, e assim esperamos que o outro venha preencher um vazio interior,  para ele o desejo deve ser encarado como “um movimento da vontade de encontros que criem momentos harmônicos e equilibrados”, trazendo mais bem-estar e felicidade. O outro certamente pode contribuir para a construção desses momentos, mas é preciso entender que ele não vai suprir uma falta estrutural e nem é responsável por preencher esse vazio. 


Um vasto número de pesquisas e estudos mostram que relacionamentos satisfatórios e duradouros estão diretamente ligados à nossa felicidade, saúde e longevidade. Segundo o psicólogo Keith Witt, que falou sobre o tema em um de nossos eventos, somos uma das poucas espécies de animais que buscam compartilhar a vida com um(a) parceiro(a) fixo e formar família. Essa parceria faz parte de nosso processo evolutivo, pois aumentou nossa capacidade de sobrevivência. 

O casamento, quando saudável, é capaz de atuar de maneira intensa nos nossos sistemas fisiológicos até na manutenção da nossa saúde emocional, como comentamos nesta matéria. Para criar esta realidade é necessário se comprometer com o bem-estar do outro, abandonar o modo consumo onde olhamos para a relação com a frase “vou continuar nesse relacionamento enquanto…”, ou conceitos do mercado como custo/benefício, e trazer um comprometimento mais real, onde a frase se torna “vou fazer o que for necessário para…”. 
O que dizem por aí
E os solteiros, como ficam? 


          

Com tantas possibilidades de relacionamentos, é comum que pessoas solteiras se sintam um pouco perdidas na busca por uma parceria. Carol Tilkian, comunicadora à frente do Soltos, canal no youtube dedicado a esse público, comenta neste artigo que a principal dificuldade é que “ninguém quer ser o primeiro a cobrar o outro e por isso evitam dialogar sobre as expectativas de cada um, com medo de parecerem apressados ou de como serão interpretados”. 

Ao mesmo tempo, aplicativos de paquera e redes sociais criaram um “atacadão do amor”, potencializando encontros cada vez mais rasos e mais efêmeros, deixando a sensação de que "ninguém quer nada com nada”. Esta sensação é um dos sintomas das relações líquidas, onde o amor se torna frágil e a busca pela satisfação constante e sem esforço dificulta a construção de relações afetivas significativas. 

Laura Pires, escritora e pesquisadora sobre relações de afeto, fala em seu perfil no Instagram sobre como a hierarquização das relações reforça este consumismo afetivo, onde as pessoas sentem permissão para ir experimentando (e descartando) outras pessoas em relações “casuais”, até que encontrem uma relação amorosa para dedicar seu afeto e seu cuidado.


Outra dificuldade enfrentada por pessoas solteiras é a constante pressão social para que deixem este estado (transitório ou não), como se o fato de estarem sozinhas significasse um certo “fracasso” pessoal. Afinal, com tantas possibilidades de estar em um relacionamento, como assim a pessoa está solteira? O que tem de errado com ela?

Essas e outras perguntas desconfortáveis são tão comuns que este comportamento tem até nome: “single-shaming” (vergonha de estar solteiro, em tradução livre). E, por mais que lá no fundo saibamos que nosso valor não se define por nossos parceiros românticos, a solteirice segue sendo extremamente estigmatizada
 
Mas estudos já mostram que ser solteiro pode ter inúmeros benefícios e é possível ser muito feliz sem estar, necessariamente, em um relacionamento romântico. Dentre as principais vantagens está a tendência de manter mais contato com amigos e mais autonomia. O segredo está em saber transformar a solidão em solitude, termos parecidos mas que possuem diferenças cruciais em seu significados,  como explicamos nesta matéria
Cultivando relações

       
Sabemos que nossas relações possuem extrema importância para nossa saúde e bem-estar, não por acaso dedicamos um de nossos seis pilares a ela. Para que essas relações te proporcionem felicidade, é preciso que sejam duradouras, profundas e gratificantes. Sejam elas relações amorosas, de amizade ou laços familiares, o que importa é que tenham afeto e te façam sentir bem com quem você é. Aqui deixamos algumas dicas de como tornar suas relações mais sólidas a partir de perguntas significativas que ajudam a fortalecer e estreitar laços. 

Quer saber mais? Separamos alguns conteúdos que podem te ajudar
a fazer um mergulho ainda mais profundo, não deixe de conferir!

Livro: A rosa mais vermelha desabrocha - Liv Strömquist


Podcast: Um relacionamento interessante ensina sobre nós mesmos - Podcast Gama 

Série: Modern Love - Prime Vídeo
 

Livro: A parte que falta - Shel Silverstein