Para Inspirar

Espiritualidade: é possível aprendê-la?

Preocupação de muitos pais, incluir a religião e a fé no cotidiano das crianças pode ser mais fácil e importante do que você imagina.

26 de Março de 2021


No primeiro episódio da quarta temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir, você conheceu como a fé foi fiel aliada da modelo Isabella Fiorentino em momentos delicados de sua vida - como a morte de seu irmão e o parto prematuro de seus trigêmeos.

Após um período de UTI neonatal, seus filhos foram recebendo alta, um em cada semana. Passado o pesadelo, Lorenzo, Nicholas e Bernardo, hoje com 9 anos cada, cresceram saudáveis, felizes e, o melhor, espiritualizados. Isso porque Isabella, católica altamente praticante, fez questão de transmitir os seus mesmos valores para seus filhos de forma orgânica.

“Antes de dormir, faço uma atividade com as crianças que chamo de exame de consciência. A gente reza o Pai Nosso, a Ave Maria e agradece pelo dia. Aí eu pergunto: ‘O que vocês gostariam de agradecer a Deus pelo dia de hoje?’. Eles respondem e em seguida eu pergunto: ‘O que vocês fizeram hoje que poderiam ter feito melhor?’. E aí eles analisam as atitudes deles, como falar alto com alguém ou esquecer de agradecer antes de comer, por exemplo” conta ela.

De maneira simples, ela consegue o que muitos pais buscam em seus cotidianos: ensinar seus filhos a importância de acreditar no divino e, com ele, buscar ser uma pessoa melhor. Conheça alguns caminhos possíveis para se conseguir isso.

Espelho

Como o adolescente Leonardo Blagevitch trouxe em sua entrevista , é preciso que os pais, antes de tudo, sejam exemplos de tudo aquilo que buscam ensinar às suas crias. É preciso, antes de tudo, que a chama de sua própria espiritualidade esteja sempre acesa e a sua fé seja trabalhada e praticada todos os dias.

Se você é uma pessoa que não possui uma religião específica, logo, não pratica um dogma todos os dias, mas ainda assim quer que seus filhos sejam espiritualizados, é preciso trazer isso para o contexto deles por meio de suas ações. Crer que tudo irá melhorar, manter esse otimismo e positividade pautados em uma força maior e transmitir isso para suas crianças é de suma importância nesse processo.

Portanto, se você busca filhos mais espiritualizados, é preciso começar por você. Ser o vetor dessa força é o primeiro passo para a transmissão orgânica e realmente eficaz, afinal, o lar é um dos ambientes protagonistas na formação de um indivíduo.

Demonstrações

Ainda no caso de ausência de religião específica, mas o desejo de incluir crenças no seu modelo de educação, os pais não só podem como devem apresentar seus filhos às diferentes doutrinas existentes, demonstrando a força que cada uma delas exerce em seus seguidores. Isso irá contagiá-los a buscar a sua preferida.

Caso você possua uma crença, chame-os para participar de suas práticas, seja uma meditação, uma reza, a leitura de um livro sagrado ou tão somente a contemplação dentro de um templo, por exemplo. Aproxime-os daquilo que te faz bem e assista os efeitos disso neles.

Você ainda pode demonstrar a sua fé por meio de trabalhos religiosos, voluntários e até missões, levando-os consigo para fazer o bem ao próximo desde a mais tenra idade. Lembre-se de que é ainda na infância que o caráter e a índole de uma pessoa são formados, portanto, é preciso estar atento.

Elementos externos

Uma vez trabalhada a sua própria espiritualidade e demonstrada aos seus filhos, hora de trazer elementos externos para suas vidas. Você pode fazer uma escolha de filmes e livros que irão influenciá-los positivamente. Eles não precisam ser necessariamente religiosos, mas devem conter mensagens positivas de afeto, devoção e amor ao próximo em seus temas.

Os canais da cultura são poderosos por essência, pois conseguem simplificar mensagens complexas de maneira lúdica e interativa, além de terem um alto poder de viralização. Além disso, são tempos de múltiplas distrações e interferências, portanto, conseguir manter a atenção de seus pequenos pode ser tarefa difícil, e falar a língua deles é necessário.

Você ainda pode incluí-los em atividades de sua própria igreja - se o seu caso for de igreja - e enturmá-lo com outros jovens frequentantes do mesmo ambiente. Há algumas doutrinas que promovem encontros específicos para cada faixa etária, além de oferecerem atividades como banda, acampamentos e clube do livro.

Aceitação

Por fim, mas não menos importante, aceite o tempo e as escolhas de seus filhos, que podem ou não atender às suas expectativas. É importante que a espiritualidade e sejam aceitas de bom grado e nunca impostas, pois isso a esvaziaria de sentido. Entenda o perfil deles, o que eles poderiam gostar, ideias que eles poderiam abraçar, e também os seus limites.

Estar ao lado e oferecer uma paternalidade parceira é a melhor devoção que um pai ou uma mãe podem oferecer dentro de seus papéis. Se preciso for, desapegue de nomes e crenças específicas e foque no que importa: criar seres humanos mais gratos, gentis, bondosos e compassivos para um mundo que, por vezes, pode se provar bastante hostil.

É preciso que eles se sintam parte de um contexto familiar que pratica o que prega, ainda que sua participação, de imediato, seja pequena. É preciso também que eles escutem, todos os dias, palavras de amor e de fé. Que a sua imaginação não seja minada, mas sim, sirva de ponte para caminhos maiores. E que seus sonhos e dúvidas possam ser compartilhados sem temer.

Inclua ainda hoje esse diálogo na mesa de jantar. Que tal começarem a praticar um diário juntos ou um exercício de consciência, como os de Isabella com seus filhos? Você ainda pode chamá-los para baixo de seu cobertor e assistir a um filme nos moldes que mencionamos juntos, ou contemplar a natureza em sua imensidão para que ele nunca se esqueça: há coisas tão grandes que a ciência não consegue explicar.

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O que estar entre a vida e a morte pode ensinar?

A experiência de quase-morte, também conhecida como EQM, pode deixar marcas profundas em que a viveu - mas lições igualmente profundas também

1 de Dezembro de 2023


No terceiro episódio da décima quarta temporada do Podcast Plenae, conhecemos a história transformadora de Aline Borges, que viu a morte mais perto do que gostaria, mas que viveu também uma conexão profunda e eterna com o divino. É por isso que ela representa o pilar Espírito nessa nova edição.

Acometida por uma condição raríssima - a síndrome de Guillain-Barré -, a enfermeira lutou pela sua vida desde o diagnóstico, quando os primeiros atendimentos ainda a descredibilizavam e não legitimavam os seus sintomas. Depois, lutou pela sua vida em coma, período de quase duas semanas e um grande apagão.

Por fim, lutou pela sua vida quando, ao tentar ser extubada - procedimento comum que visa tirar o tubo respiratório do paciente e fazê-lo respirar de forma natural - ela sofreu uma parada cardíaca. E foi nesse momento que Aline embarcou numa jornada que, no mundo terreno, teve apenas um minuto, mas no mundo espiritual, durou uma vida inteira.

Sua experiência consistiu em, principalmente, conhecer a figura que hoje ela acredita ser Jesus. Mas, mais do que isso, ela conta ter sido capaz de ver a sua vida toda passar como um filme, sobretudo os erros, para que ela pudesse aprender. Aline ainda revela ter sido expostas a acontecimentos que só se dariam no futuro - e que de fato se concretizaram com o tempo.

O que a nossa participante viveu não é inédito, apesar de ser único à sua maneira para quem vive. Diversas pessoas relatam ter visitado “o lado de lá” durante uma experiência de quase morte, as EQMs. Contamos um pouco mais sobre elas aqui, esse fenômeno cada dia mais observado também pela ótica da ciência, e não só pela ótica do sagrado.


Mas, afinal, qual o ensinamento que essas experiências deixam para quem as vive? Fomos atrás de relatos que pudessem nos dar algumas pistas!

“Tudo poderia ter acabado, mas não acabou”

A jornalista Tatiana Ferraz escorregou na escada de casa. O que parecia um acidente doméstico limitado foi o começo de uma outra jornada: no hospital, foi constatado um aneurisma cerebral, muito provavelmente causado pela queda. Isso a levou para a mesa de cirurgia, onde a morte era uma possibilidade clara. 

“Isso me modificou porque antes de entrar numa sala de cirurgia sabendo do risco, passa um filme na sua cabeça. Você lembra de tudo, lembra da infância, das pessoas, do marido, dos filhos. E isso faz com que, na hora que você acorda e vê que tudo passou e que você está bem e nada aconteceu, você olha pra tudo valorizando mais. Tudo poderia ter acabado, mas não acabou”, lembra.

No caso de Ferraz, não houve esse contato tão íntimo com o divino vivenciado por Aline. Mas houve um sonho. “Na véspera dessa cirurgia, eu sonhei com a minha mãe, que já é falecida. Ela veio no sonho, tocou meu coração e saiu andando. Eu acordei, lembrei muito desse sonho, imaginando que de onde quer que ela esteja, ela poderia me ajudar”, diz.

Para Tatiana, não é preciso que ninguém passe por essa experiência para valorizar mais a vida. “É uma vivência basicamente ruim, uma coisa de muito medo, angústia, apreensão. Mas ela ensina a ter paz, porque o que que tiver que acontecer, vai acontecer. É preciso esperar as coisas tomarem o seu rumo natural”, conclui.

“Eu queria que alguém tivesse me avisado”

Em um trecho de One More Time, música do trio californiano blink-182 que dá nome ao último álbum, o baixista e vocalista Mark Hoppus canta o seguinte trecho: “Eu gostaria que eles tivessem nos dito / Que não deveria ser preciso uma doença /

Ou aviões caindo do céu / Eu tenho que morrer para ouvir você dizer que sente minha falta? / Eu tenho que morrer para ouvir você dizer adeus?”.

A canção faz menção ao retorno da banda que, após algumas idas e vindas, resolveu entrar em uma turnê cuja essência é a nostalgia. Isso porque, mais do que uma banda, o trio é composto por amigos de longa data que se desencontraram em opiniões e preferências particulares. Esses desencontros não afetaram somente os rumos do grupo, como os rumos da amizade em si. 

Mas, em 2021, Hoppus foi diagnosticado com um tipo de câncer sanguíneo gravíssimo e em estágio avançado. Depois de uma longa jornada de tratamentos e contrariando algumas expectativas médicas, ele se curou e voltou a tocar. Mas, melhor do que isso: voltou a tocar com o blink-182.

A sua experiência de quase-morte, afinal, pode não ter sido tão súbita quanto a de Aline e de Tatiana, mencionadas anteriormente. Uma doença ameaçadora de vida traz ensinamentos igualmente poderosos e há ainda o agravante de se estender por dias, meses, mantendo o enfermo nessa condição reflexiva que é sim, muito angustiante, mas igualmente transformadora. 

“Para Hoppus, o ano passado não apenas aprofundou seu apreço por sua família e amigos, mas também o ensinou a lidar com o horror inesperado com humildade, graça, humor, e – esta é a novidade – um coração aberto que ainda está aprendendo a se sentir merecedor”, escreve Chris Gayomali, editor de artigos da GQ em sua entrevista com Mark Hoppus logo após a remissão de seu câncer. 

“Pensei muito sobre minha própria mortalidade, pensei muito sobre o que aconteceria quando eu partir”, disse ele. “E então tenho ouvido 'Adam's Song' e pensei: Sim, amanhã haverá dias melhores”, conta Hoppus na mesma entrevista, fazendo menção a uma música mais antiga de blink-182 que fala justamente sobre a morte. 

Esse foi meu chamado para despertar”

Vale dizer que o baterista da mesma banda, Travis Barker, também vivenciou uma experiência de quase morte em 2008, quando o jato particular em que ele voaria colidiu com um barranco ainda na decolagem, provocando um incêndio do qual somente ele e outro passageiro saíssem vivos. O acidente rendeu três meses de hospital, um livro de memórias com passagens marcantes sobre o acontecimento e mais de uma década sem voar. 

Um de seus principais aprendizados foi, na verdade, uma conquista: largar o vício em remédios. “As pessoas estão sempre tipo, ‘Você foi para a reabilitação?’”, comentou o artista em conversa com a revista Men’s Health. “E eu [digo] ,‘Não, eu estava em um acidente de avião’. Essa foi a minha reabilitação. Perder três de seus amigos e quase morrer? Essa foi a minha chamada para despertar. Se eu não estivesse em um acidente, provavelmente nunca teria desistido”. 

Hoje, superado o trauma, Travis olha para esses dias com profundo respeito, já que estar diante da morte de imediato o deu mais vontade de morrer. Ele conta que até mesmo ofereceu dinheiro para que terminassem com esse sofrimento e que a depressão na qual ficou mergulhado o fazia pensar no porquê de ter sobrevivido. E mesmo diante de toda essa carga emocional e física, ele conseguiu vencer o vício.

"Senti que a existência era aquilo. Como se o universo fosse aquele momento"

Uma reportagem do UOL Tab trouxe um relato impressionante e bonito de quase morte da jornalista Valéria Palma. Foi durante um acidente de carro, em 1991, que ela fez as pazes com a morte e realmente sentiu o momento chegar, ainda que ela tenha sobrevivido. "Foi o melhor momento da minha vida estar morta", conta ao site.

Na semana anterior, ela havia sonhado com um acidente de carro fatal. A lembrança desse sonho, que a tomou no momento em que estava presa às ferragens, soou como uma confirmação. “Senti que estava morrendo. Não era um raciocínio, mas uma consciência da morte. Percebi que estava indo embora", rememora. 

Seu único desejo era que a família soubesse que ela estava bem. Mas ao pensar nisso, em seguida foi sugada para um túnel extremamente branco. Seu corpo, como conta a reportagem, deslizou suavemente pelo túnel, onde não havia ninguém, e se dividiu em partículas que foram se diluindo na luz. Por fim, tornou-se parte dele. Mergulhou sem medo na sensação de leveza, paz e plenitude e quis ficar ali para sempre”.

 "Senti que a existência era aquilo. Como se o universo fosse aquele momento", recorda. Despertou numa maca do Hospital Municipal de Itanhaém, acreditando estar morta, pois não se viu voltando do túnel. Então ouviu vozes de dois médicos. "Ela acordou", disse um deles. Acabava ali a sua experiência de quase morte, experiência que a marcaria para sempre.

Apesar de não falar muito sobre o assunto, Valéria conta que a experiência de quase morte a acompanha o tempo inteiro — mesmo depois de 30 anos. Foi em um curso de tanatologia (estudo científico da morte), muitos anos depois, que ela ouviria pela primeira vez o termo EQM. Ela ainda conta que falar ajuda a afastar o desconforto inicial que o tema lhe causa. 

Ela não interpreta a experiência como sendo religiosa, mas sim espiritual, “por não ser desse mundo” - relato muito parecido com o de Aline. Mesmo sem saber onde esteve, ela abre um sorriso quando diz que era maravilhoso. "Na hora, tive a percepção de que ali era a origem da vida. A morte parecia ser a origem de tudo. É dali que tudo nasce. Portanto, é para lá que tudo vai", contou ao UOL. 

De lá para cá, ela trouxe o tema da morte à mesa e continua convivendo com a finitude. Há alguns anos foi voluntária na área de cuidados paliativos, que te contamos mais aqui, e também atua como terapeuta do luto. O segredo de não achar o trabalho pesado? Entender que partir é algo natural, uma viagem na qual todos nós embarcaremos. 

A gratidão que impera

Os relatos são infinitos, poderíamos trazer centenas deles aqui. Mas, o que parece comum a todos é uma sensação de gratidão que impera a todos que sobreviveram. Além disso, um outro ponto comum para aqueles que experimentaram “o lado de lá”, é retratá-lo como um lugar de paz, que dá vontade de ficar.


É certo que só saberemos o que há de fato na outra dimensão - se é que ela existe - quando a nossa hora chegar. Mas, fazer as pazes com a finitude pode ser um bom caminho para experimentar o que esses pacientes experimentaram sem ter que realmente correr risco de vida. Comece a praticar essa gratidão em estar vivo ainda hoje! Acredite: o amanhã não é garantido.

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