Para Inspirar

Izabella Camargo em “Uma dor invisível”

Na terceira temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir, conheça a jornada de resistência e limites de Izabella Camargo

27 de Dezembro de 2020


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

[trilha sonora] Izabella Camargo: A Síndrome de Burnout é um conjunto de sinais e sintomas relacionados ao excesso de trabalho. Essa é a definição da Organização Mundial da Saúde. Já, na minha definição, burnout é a ausência de si mesmo. A pessoa ama tanto o que faz, que não vê problema em trabalhar demais, em deixar de dormir, de conviver com a família, por exemplo, pra trabalhar. Eu colocava o trabalho na agenda antes de mim mesma. Só que pra acumular mais e mais tarefas, eu tinha que abrir mão de muitas coisas. Nesse caso, das minhas horas de sono. Eu ultrapassei tanto os limites físicos e mentais, que cheguei ao ponto de receber o diagnóstico da Síndrome de Burnout. E esse diagnóstico mudou a minha vida. [trilha sonora] Geyze Diniz: Abrindo mão do sono, trabalhando madrugadas adentro e com a sensibilidade à flor da pele, o corpo e a mente da jornalista Izabella Camargo chegaram ao limite. A partir do diagnóstico de Síndrome de Burnout, Izabella se recolheu para recuperar a saúde. Neste processo, se reconectou com o próprio corpo, reorganizou suas prioridades e conquistou uma vida com mais sentido. Ouça no final do episódio as reflexões da professora Lúcia Helena Galvão para ajudar você a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se. [trilha sonora] Izabella Camargo: Eu sempre fui uma pessoa de sono fácil, daquelas que encosta a cabeça no travesseiro e apaga, sabe? Eu deitava às 10 da noite e levantava às 5 ou 6 da manhã sem despertador, olha que beleza! Eu sou do dia, então eu durmo cedo e acordo cedo. Eu vivi essa rotina de sono na maior parte do tempo até 2014, quando eu passei a trabalhar no telejornal Hora Um, que começava às 5h da manhã ao vivo na TV Globo. Por quatro anos, até o burnout e ser dispensada, eu precisava acordar meia-noite, uma ou duas da manhã. Só que para acordar meia-noite, por exemplo, eu tinha que dormir às 5h da tarde. Então, tente imaginar como é se deitar às 5h da tarde com o barulho da cidade, o calor, a claridade desse horário, especialmente no verão. Mesmo assim, com todas essas dificuldades, eu fiz de tudo para tentar me adaptar a essa dinâmica de vida.  Eu mudei do 3º pro 16º andar do prédio para ter menos barulho, mas não adiantou. Eu adotei um ritual pro cérebro desligar, tomando banho morno e bem demorado, muito chá de camomila, florais, meditação … Nada disso funcionou. Até que eu comecei a tomar remédios pra dormir. E ainda assim, não deu certo. Às vezes eram oito da noite e eu ainda nem tinha conseguido dormir. Fritava na cama. E aí, eu fazia a conta: 8, 9, 10, 11, meia-noite. Daqui 4 horas eu preciso levantar. E aí, o cérebro não desligava mesmo. Resultado: eu passei a dormir muito pouco e muito mal. E a privação do sono por muito tempo fez a minha mente e consequentemente o corpo saírem do eixo. [trilha sonora] O meu corpo começou a mandar sinais que algo não ia bem. O primeiro aviso veio pelo estômago. Tudo o que eu comia e bebia inflamava o meu estômago. Eu procurei uma nutricionista e depois um gastroenterologista. E aí, os alimentos levaram a culpa. Eu cortei lactose, café, como se a comida fosse a minha inimiga. E aí, vieram outros problemas de saúde. Problemas na pele, manchas, queda de cabelo, taquicardia. A privação de sono também atrapalha a recuperação venosa. Eu já acordava com as pernas inchadas e tive que fazer uma cirurgia pra retirar a safena esquerda. Os meus exames foram ficando completamente desregulados. O cortisol, por exemplo, que é o hormônio do estresse, chegou a 31, enquanto o máximo estabelecido para mulheres é de 18.  Agora, o curioso é que e não negligenciei nenhum sintoma, tá? A cada sinal de descompasso, eu procurava um especialista. Todos os profissionais diziam que o meu problema estava relacionado ao horário de trabalho e o que eu fazia nessas horas de trabalho. Eu já fazia terapia cognitivo-comportamental há muito tempo. Eu sempre cuidei da espiritualidade, então não faltou Deus, não faltou psicólogo, não faltou exame médico, remédio, não era alimentação. Faltou apoio profissional mesmo para mudar aquela situação, eu pedi pra mudar de horário, mas eu não fui ouvida. Quando eu dizia pros outros o que estava acontecendo, sabe o que parecia? Reclamação. Mas na verdade, hoje eu vejo que eu estava pedindo socorro. [trilha sonora] Pra fazer televisão ao vivo, você precisa estar com o raciocínio ágil, porque você tem pouco tempo pra falar muita coisa. E eu trabalhava em três telejornais praticamente simultâneos. Já fazia um mês que eu estava muito mal, com o braço esquerdo adormecido, que, depois eu descobri, era um sinal perigosíssimo de infarto. Até que naquele dia 14 de agosto, às 6 e pouco da manhã, eu falava da previsão do tempo para algumas capitais do país. Quando chegou no Paraná, que é o meu estado natal, eu travei. Eu não consegui avançar na palavra “Curitiba”, eu não lembrava da palavra "Curitiba". E mais do que isso: eu não sabia onde eu estava, quem eu era, nem pra onde eu ia.  Se eu não estivesse com tantos problemas de saúde, aquele apagão teria passado batido, como outros passaram. Afinal, eu só esqueci a palavra “Curitiba”, não é? Mas ali não era um lapso de memória: era um ultimato. Quem rege o corpo é a mente. E o meu cérebro já tinha dado todos os sinais de que algo não ia bem. Com aquele apagão, ele quis me dizer: “Agora deu, né?” [trilha sonora] Assim que acabou o jornal, eu fui ao psiquiatra. E foi ali, que eu descobri que eu estava vivendo a temida Síndrome de Burnout. Receber aquele diagnóstico foi como levar uma pancada na cabeça. Como assim, doutor? [trilha sonora] O tratamento começou pelo afastamento do ambiente estressor. Na minha licença, eu chorei demais, fiquei confusa, senti angústia e muita culpa por ter deixado chegar naquele ponto. Ainda mais porque o burnout é um desequilíbrio invisível, então além de cuidar da minha saúde, eu ainda gastava muita energia, muito tempo e muita saúde tendo que compreender os julgamentos alheios. Eu ainda tive a sorte de contar com o apoio do meu marido, da minha mãe e de algumas amigas, que se mantiveram ao meu lado. O suporte emocional é tão ou mais importante que o tratamento. Eu recomendo para quem convive com pessoas que estão passando pela Síndrome de Burnout que não forcem a barra. Na minha opinião, a melhor maneira de oferecer ajuda é dizer: “Quando você estiver confortável, eu estou aqui para te ouvir, tá?”. Ou: “Como eu posso te ajudar?”, respeitando o tempo daquela pessoa. O meu marido soube fazer tudo isso e foi extremamente importante pra que eu não pirasse ainda mais. [trilha sonora] Mas daí, depois do laudo do perito do INSS, eu voltei ao trabalho depois de dois meses e 15 dias, mas sem estar totalmente recuperada, tá? Quantos anos levaram pra eu chegar naquele estado? Então a cura não viria de um mês pro outro. Mas o meu comprometimento com a carreira era tão grande, que eu não vi problema em me restabelecer trabalhando.  No mesmo dia em que eu retornei à emissora, eu fui demitida. Se eu tivesse o conhecimento que eu tenho hoje, dos direitos e responsabilidade do empregador sobre problemas ocupacionais, das leis, aquela demissão não teria acontecido da forma como foi. Por isso eu estou aqui pra te dizer: informação é tudo. [trilha sonora] Eu passei a estudar o burnout e a falar com quem recebeu o diagnóstico. Já entrevistei mais de 4 mil pessoas. Totalmente diferentes, mas com as mesmas dores. Aprendi também que burnout é um nome novo para um problema antigo. Burnout já foi chamado "neurastenia" em 1869. Naquela época, gente, que não existia nem luz elétrica, mas a sociedade já estava estressada pelo excesso de modernidade. [trilha sonora] A síndrome é cercada de julgamento e preconceito porque, por muitos séculos, medidas higienistas tacharam como loucos pessoas com qualquer desequilíbrio mental, de lapso de memória a esquizofrenia. Eu descobri que a intolerância a uma dor invisível é muito grande. A família não sabe como lidar, muitos médicos têm dificuldade para fazer o diagnóstico. Mas sabe também o que eu aprendi? Que quando você vive uma experiência com burnout, você não é um profissional ruim. Você só está vivendo um momento ruim. O burnout atinge pessoas que, como eu, amam o que fazem, são idealistas e aí, por trabalharem tanto, se negligenciam. A Síndrome do Burnout acomete pessoas que trabalham demais não só para os seus padrões, mas para os padrões de todo ser humano. Não é à toa que a lei estabelece uma jornada de 8 horas. A gente sabe que existe uma cultura de valorização do workaholic, não é? É o máximo dizer que a gente tá sem tempo, porque tá trabalhando muito. Mas, me conta uma coisa, se não é legal falar de vício em drogas, cigarro, por exemplo, vício em trabalho pode? Tá tudo bem?   [trilha sonora] Hoje, eu faço um trabalho de prevenção, pra mostrar que a Síndrome de Burnout é só um freio, não é o fim. Dependendo da humildade da pessoa em reconhecer o diagnóstico, esse freio, essa pausa para o tratamento pode ser momentâneo, e não pra sempre. Atualmente, eu, Isabella, não preciso mais de remédio. Sou saudável, mesmo com um problema de saúde, aliás, isso é muito importante a gente dizer. E já sei que meu gatilho é excesso de trabalho como o diabético sabe que o gatilho é alimentação. simples assim. Eu entendi que se eu tiver uma agenda em que eu não consiga dormir direito, em que eu fique emendando um compromisso no outro, isso vai me deixar enjoada com a vista turva … Quando percebo que eu estou passando do meu limite, aí eu tenho que dizer "não", não pra mais trabalho, não pra entrevistas, não pra mais compromissos. Eu preciso dizer "não". Eu preciso treinar, lembrar que dizer "não" é o que vai me proteger do burnout.  [trilha sonora] Eu acredito que o fato de ter tornado público o diagnóstico de burnout tenha contribuído muito para trazer o tema pra pauta positiva. Saúde mental, a gente sabe, sempre foi o patinho feio das conversas. Mas em 2020 já entendemos que não é bem assim, não é? As 4 mil pessoas com quem conversei me dão força para continuar com a minha missão, porque uma informação correta pode transformar o futuro de uma pessoa que está chegando à exaustão. Uma informação correta tira alguém do sofrimento. Todos os dias recebo comentários ou pedindo ajuda ou agradecendo por alguma informação que eu tenha compartilhado. [trilha sonora] Hoje, eu luto com unhas e dentes pelas minhas horas de sono e também luto com unhas e dentes para lembrar que as suas horas de sono também são essenciais. São nas horas de sono que a gente recarrega a nossa bateria, de tão simples que é, eu sei que incomoda. Mas, eu repito, dormindo bem, você vive bem. Pode confiar. [trilha sonora] Lúcia Helena Galvão: Competição é palavra de ordem na pauta do dia. Êxito e sucesso só podem vir daí, ainda que o ponto mais alto do pódio possa ser um lugar bem solitário e não tão glamuroso quanto se pinta. O que a Iza começou cedo a perceber foi que este tipo de vida profissional utiliza o efeito torniquete, aperta sempre um pouco mais tirando o fôlego, a respiração, o sangue, a vida … Mas sempre exigindo que se mantenha uma boa aparência e um sorriso nos lábios até o fim. Aí vem o drama da doença invisível, negada e ignorada por tantos. Nós sabemos que o burnout é o irmão caçula de uma lista de doenças invisíveis, que incluem a depressão, a ansiedade e outras. Onde o doente parece não ter nada e estar simulando o próprio sofrimento. Isso faz com que a dor, que já é muito pesada, chegue ao nível do insuportável. Mas a terapêutica que ela empregou é altamente eficiente e sem contra indicações. Acolheu o sofrimento dos outros, discutiu, orientou, posicionou-se, comprometeu-se. Altruísmo é sempre analgésico de alta potência que não só alivia, mas pode até extinguir a dor. E aí está nossa Izabella, profissional como sempre, realizada, curada de burnout, mas severamente contagiada de humanidade. [trilha sonora] Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae. [trilha sonora]

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Para Inspirar

Celso Athayde em “A busca diária para a melhor versão de mim”

Fundador da CUFA, Celso Athayde conta no Podcast Plenae como fez a exceção se tornar regra para milhares de brasileiros

18 de Outubro de 2020


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

[trilha sonora] Celso Athayde:  Eu quero ser o cara mais rico do mundo. Mas, quando eu falo de riqueza, não é o dinheiro pelo dinheiro. Não é o dinheiro pelas coisas que ele pode comprar, nem o dinheiro pelo poder que ele pode me dar. É pela possibilidade de transformar. Porque eu acredito no meu valor. Mas meu projeto de vida, ele é coletivo. [trilha sonora] Geyze Diniz: Tive oportunidade de conhecer o Celso durante a pandemia e minha admiração por ele nesse período só aumentou. Sua capacidade de mobilizar e inspirar os outros é contagiante. No final do episódio, você ouvirá reflexões do doutor Victor Stirnimann para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Aproveite este momento, ouça e reconecte-se. [trilha sonora] Celso Athayde: Eu sou do Rio de Janeiro, da Baixada Fluminense, de uma cidade chamada Nilópolis, onde tem a Beija-Flor. Com seis anos de idade eu fui morar na rua, porque meus pais se separaram. Minha mãe e meu pai eram alcoólatras, brigavam todos os dias. Eu nem me lembro direito dessa época. Só consigo lembrar das brigas e que a gente morava numa favela no bairro do Cabral. Quando minha mãe resolveu ir embora de casa de verdade, eu e meu irmão fomos juntos com ela. Como minha mãe não tinha pra onde ir, a gente foi pra debaixo de um viaduto em Madureira na expectativa de que na semana seguinte a gente ia dar um jeito. Só que esse jeito nunca foi dado e passamos esse tempo ali, na condição de pedintes.  [trilha sonora] É claro que ninguém deveria morar na rua, mas foi ali que eu vivi a minha primeira experiência que iria mudar minha vida.  [trilha sonora] Eu conheci um cara que morava na rua também, como eu, e que dizia que antes de estar nessa situação, ele era empresário. Ele tinha tido um emprego, uma casa com piscina, uma família, escola pros filhos, viagens pro exterior... Pra muita gente, a história dele era a de um cara que perdeu tudo, mas eu enxerguei outra coisa ali. Eu enxerguei o cara que já teve tudo. E se ele estava ali, eu comecei a acreditar que comigo podia acontecer o inverso. Se ele perdeu tudo, então eu poderia conquistar tudo. Aí eu passei a sonhar com essas coisas. Eu passei a ter esperança e aumentar a régua da expectativa do que eu podia alcançar. [trilha sonora] Algum tempo depois, eu tinha mais ou menos 13 anos, uma enorme enchente acabou fazendo a gente sair do viaduto. Então fomos remanejados para um abrigo público  chamado Pavilhão de São Cristóvão e, de lá, para a Favela do Sapo, em cima do Camará, onde fui criado. Lá, conheci um outro cara super interessante, infelizmente ligado ao tráfico, um dos fundadores do Comando Vermelho. As histórias dele sobre o crime não me seduziam, mas suas ideias sobre a revolução social sim. Eu sentia que não queria fazer parte daquilo que ele fazia, mas queria fazer aquilo que ele dizia. E sempre que ele me falava de fazer contato com pessoas de fora da favela e abrir outras possibilidades, isso sim, alimentava em mim um jeito de pensar que marcaria para sempre o meu jeito de ser e de trabalhar.  Pensando nisso, fui trabalhar como camelô em Madureira e então reencontrei o viaduto onde eu havia morado, já com essa crença da possibilidade de uma transformação social e pessoal dentro de mim. Comecei, então, a organizar um baile de charme, um ritmo que bombava na favela e esse baile começou a ficar famoso. Nessa época, comecei a organizar também alguns encontros, que a gente chamava de Informe. A gente se encontrava em um espaço da favela em que as pessoas pudessem falar qualquer coisa que estivessem pensando. Alguém levantava um tema e a gente então passava um sábado inteiro conversando sobre aquilo. Aparecia de tudo: cinema novo, Tropicália, energia nuclear... Não importava o assunto, a gente estava ali para buscar algum tipo de identidade e não, necessariamente, para aprender algo. [trilha sonora] Foi assim que, em 1998, eu me encontro com o rap, com os Racionais MCs, que trouxeram outra energia contestadora para a história. Esse momento é importante porque os Racionais me ajudaram a organizar na minha cabeça uma série de sentimentos que eu já tinha, mas que estavam embaralhados e desconectados ainda. Uma vez que eu estruturei essas emoções, elas se desdobraram em ideias e pensamentos sobre o que realmente é importante pra mim. Isso me fez entender que eu era preto e ser preto era pertencer a algo maior. Isso me fez entender que o que eu precisava pra mim e pras pessoas à minha volta era, na verdade, uma jornada coletiva. Isso me fez entender onde eu estava, onde eu queria chegar e - principalmente - como eu poderia chegar. Isso é muito grande. Nessa mesma época eu conheci o rapper MV Bill. Ele fazia parte do movimento hip hop e também de vários grupos, e estava começando a tentar fazer algumas ações com os Racionais. Então me tornei empresário dos dois, tanto dos Racionais como do MV Bill, e fizemos vários shows. Assim nasceu a CUFA, da ideia de transformar nosso inconformismo em atitude, em transformar o discurso do rap em ações práticas. Porque eu percebi que se eu não era feliz em ser quem eu era, se eu nunca aceitava o destino que eu achava que planejaram pra mim, então era preciso mudar. Esse espírito era tão forte que ficou na organização mesmo depois de eu deixar de fazer parte dela formalmente. A CUFA é, como sempre foi: a tentativa de continuar democratizando o conhecimento, mas também levar para os territórios um estímulo e um sistema para pessoas conseguirem transformar os seus discursos em ações. Em realizar a partir do que elas pensam, e não apenas reproduzir algo que ouviram de alguém por aí. Quero que as pessoas se tornem responsáveis por si mesmas, que tenham a insatisfação que eu sempre tive com a situação em que estou e que me faz o tempo todo querer melhorar.  [trilha sonora] Eu até lembro que minha mãe sempre dizia: "Filho, tu quer fazer tudo ao mesmo tempo, deixa de ser olho grande, rapá”. Mas ela também sabia que eu sempre precisava ir para o ponto seguinte. Essa vontade de alterar o cenário em que eu vivo está no centro da CUFA. Cada sonho que eu materializo não abre somente espaço para eu sonhar com outras coisas, abre principalmente espaço para outras pessoas sonharem com aquilo também. É assim que vou seguindo, caminhando, trilhando, buscando novos objetivos. Porque eu quero que cada vez mais gente tenha voz no caminho, que mais gente mude de vida. Queremos conscientizar a base da pirâmide na potência que ela tem. Fazemos isso por meio de oficinas de capacitação profissional e ações que elevam a autoestima da periferia e das favelas. Não queremos deixar ninguém para trás e, por isso, abraçamos tudo que existe na favela, tudo que existe nas periferias. Por isso, q​uanto mais pessoas da CUFA falarem, mais histórias inspiradoras a gente constrói, mais vidas são mudadas. E assim temos pessoas como Preto Zezé, do Ceará, que hoje é o presidente global da CUFA empossado em Nova York, na sede da ONU. E muitas outras pessoas têm espaço e falam. A divisão de poder e de vozes, sempre foi uma marca que eu achei legal em mim, uma característica minha que eu levo para todas os movimentos que eu faço e também para minha vida. ​Foi com essa estratégia que expandimos e hoje atuamos em todos os estados brasileiro, no Distrito Federal e em mais de 15 países. Esse processo fez a gente entender que se aumentar o número de vozes era legal, aumentar o número de ritmos era mais importante ainda. Por isso, apesar de estarmos com o rap há 20 anos, hoje tem gente que trabalha na CUFA e nem de hip hop gosta. Criamos projetos que trabalham com cultura de maneira ampla e também com educação, lazer e esportes. Nossas ações são para a favela entender que ela é importante, não importa o caminho. E tudo isso depende de dinheiro, sim. Quando a gente monta ações na CUFA que trazem dinheiro, conseguimos investir muito nas favelas, financiando organizações e a própria instituição. Esse pensamento me levou a deixar a CUFA para trabalhar em outra frente e formar a Favela Holding, que hoje tem 20 empresas. A grana que conseguimos lá, uma parte fica na própria holding e outra parte repassamos para a CUFA em forma de doação, para que ela possa desenvolver suas ações de forma sustentável. Eu chamo isso de "movimento social por vias econômicas". Acredito em mudar a realidade de uma população investindo em crescimento econômico e na distribuição de renda. O dinheiro não traz a felicidade direta, mas traz a autonomia. E só quem tem autonomia poderá ser feliz. É essa a mentalidade e a forma de trabalhar que hoje estou sistematizando para criar um documento que sirva para outras pessoas que também queiram atuar por uma transformação coletiva. Minha vontade é chamar organizações sociais que existem por aí e mostrar para elas o que fizemos e como é que elas podem ser nacionais também. Eu não quero o monopólio do bem, ao contrário, quem quer o monopólio do bem só vai conseguir fazer o mal. [trilha sonora] Hoje, com 57 anos, eu sigo insatisfeito com o lugar onde estou e com o que eu construí.  [trilha sonora] Mas insatisfação não é sinônimo de infelicidade. O fato é: eu não consigo ficar dormindo esperando o tempo passar, sabendo que tem uma guerra lá fora e com milhões de pessoas precisando de nós. Por isso, sigo buscando, agora na Favela Holding, as mesmas coisas que busquei a minha vida inteira, que foi liberdade, dinheiro, uma fonte de sobrevivência e independência. Criar bases para as pessoas deixarem o lugar de invisibilidade e serem protagonistas das suas próprias histórias é a nossa grande meta, é a nossa missão. Os invisíveis são invisíveis, então cabe às pessoas que têm fala pública a responsabilidade de ajudar a mudar essa história. Por isso, falo com todo tipo de gente, de todas as realidades e contextos, com empresas, políticos e com o máximo de pessoas que eu posso articular. Tenho como princípio que transitar é o nosso plano de paz, sem nunca abandonar quem eu sou, sem nunca pensar no meu sucesso ou no sucesso da CUFA como as exceções do lugar de onde eu vim. Mas em transformar isso em regra. E por esse projeto eu não paro de trabalhar nunca.

[trilha sonora]

Victor Stirnimann: Esta história é uma autêntica jornada do herói. Para quem conhece os mitos, está tudo ali. Um começo inocente exposto a perigos e desafios que poderiam representar o fim da linha ou mesmo um mergulho sem volta no lado mais escuro da alma. Mas o herói é aquele que está sempre aprendendo e que sempre põe em prática aquilo que aprendeu. Isto exige humildade, desapego, mas leva um super-poder. Para alguém assim, cada pessoa que cruza seu caminho se torna um professor. Ouvir o Celso é perceber como ele se tornou um líder e um exemplo apesar das dificuldades. Ele teve encontros com pessoas que foram abrindo seus olhos para horizontes cada vez maiores e criou novas metas e iniciativas a partir dali, com a coragem de quem tem muito pouco a perder e com o coração alimentado de ideais, que é a marca registrada de todas as grandes almas. Ideais que não deixam esquecer que a batalha de um é a batalha de todos e que a verdadeira razão de ser do herói é a transformação do coletivo de onde ele partiu. Porque a mensagem maior de toda sabedoria é sempre a mesma: a vida é uma grande aventura. Estamos todos aqui para fazer descobertas, para nos expressarmos, para evoluir e transformar. Por isso, não importa se você conhece os mitos, os mitos conhecem você.

[trilha sonora] Geyze Diniz: as nossas histórias não acabam por aqui. Acompanhe semanalmente nossos episódios e confira nossos conteúdos em plenae.com e no perfil @portalplenae no Instagram.  [trilha sonora]

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