Para Inspirar

Silvia Poppovic em "Vivendo a adolescência da maturidade"

A sétima temporada do Podcast Plenae está no ar! Confira a história da jornalista Silvia Poppovic. Aperte o play e inspire-se!

15 de Fevereiro de 2022


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:


[trilha sonora]


Silvia Poppovic: Durante muito tempo, eu não via a obesidade como uma doença. Eu tive uma grife plus size e dizia: “as mulheres podem ser do jeito que elas quiserem”. E podem mesmo. O problema é que é uma hipocrisia  dizer que quem tá acima do peso tá sempre bem. Gente, não é verdade. O excesso de peso pode trazer uma série de doenças metabólicas e fisiológicas. Eu negava os prejuízos da obesidade, até começar a sentir as consequências dela. 


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Geyze Diniz: Conhecida por sua presença e potência feminina na TV aberta por mais de 40 anos, a apresentadora Silvia Poppovic, aos 60 anos, resolveu tomar uma atitude radical em relação ao seu corpo: fazer uma cirurgia de redução do estômago. Depois de passar uma vida com excesso de peso, ela percebeu que para ter uma velhice com qualidade e longevidade, precisava perder um peso significativo. Com quase 50 quilos a menos, ela vivenciou prazeres singelos e rotineiros na vida de quem nunca viveu com sobrepeso. Como cruzar as pernas com conforto e vestir o que queria. Mais do que isso, Silvia hoje vive a adolescência da maturidade, como ela mesma diz. 


Conheça a história de autocuidado e zelo com o hoje e amanhã de Silvia Poppovic. Ouça, no final do episódio, as reflexões do especialista em desenvolvimento humano, Marc Kirst, para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e este é o podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.


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Silvia Poppovic: Quando eu tinha 26 anos, a minha mãe morreu num acidente de trânsito. Ela era educadora, psicóloga, uma pessoa energética, inteligente e MUITO importante na minha vida. E um dia, ela saiu pra trabalhar, foi dirigindo pela Avenida Sumaré, aqui em São Paulo. Na outra direção, vinha um jovem num carro grande, em altíssima velocidade. Esse motorista atropelou uma menininha de 8 anos, perdeu o controle do volante, atravessou a ilha de 4 metros que separa os dois sentidos da avenida e pegou a mamãe que estava vindo de frente. Matou ela na hora. 


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Acidente de trânsito é diferente de uma morte pra qual você se prepara. Ou que acontece num ambiente privado, dentro de casa. A minha mãe não. A minha mãe morreu no asfalto. Durante muitos anos, eu simplesmente não conseguia me deitar, porque eu sentia o que ela poderia ter sentido quando ela foi colocada sobre o asfalto. Muito forte isso. Eu nunca engoli direito essa tragédia, o jeito que ela morreu. O motorista fugiu, mas foi preso depois. Eu acredito na lei do retorno, e a vida dele não foi nada fácil depois disso. Agora… A minha também não foi.


Depois do acidente, eu comecei a trabalhar que nem uma maluca e abandonei os cuidados comigo mesma. Eu sempre fui uma pessoa acima do peso e, quando a mamãe morreu, eu simplesmente desencanei dessa preocupação. Fiquei obesa. Até os 40 anos eu fui muito gorda. Talvez tenha sido a época que eu fui mais prejudicada pelo excesso de peso.


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Eu nunca fui escrava do corpo gente, nem nunca deixei me vitimizar pela gordura. Não me incomodava ser fora do padrão. Eu namorava, me divertia, dançava, fazia tudo que tinha vontade. Mas algumas coisas eram BEM complicadas, por exemplo, como comprar roupa. Eu me apresentava num programa de TV diário e precisava de um figurino variado. No Brasil, simplesmente, não tinha manequim do meu tamanho nas marcas legais. Então eu tinha que viajar duas, três vezes por ano pros Estados Unidos. Ficava lá uns 3 ou 4 dias e comprava tudo que eu precisava, de calcinha a sutiã, calça, blusa, blazer. E eu descobri que essa moda se chamava plus size e resolvi então criar uma grife de tamanhos grandes. Durou 12 anos e foi um sucesso. Era uma maneira de fazer de um limão uma limonada.


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Aos 40 anos, eu me casei. Voltei a me cuidar mais. Aos 45, eu tive uma filha, que tem o nome de Ana, o nome da minha mãe. Só que eu engordei de novo e aí eu fui oscilando o peso na balança, até completar os 60 anos. Eu não sofria nenhum problema grave de saúde por causa da obesidade. Eu tinha colesterol e triglicérides altos, que eu controlava com remédio. Agora, o excesso de peso começou a atrapalhar a minha rotina. Eu comecei a ter dor nos lados, comecei a ter dor no joelho, nas costas, na sola do pé e passei a ter dificuldade pra caminhar. Então eu andava 2 quarteirões e tinha que me alongar. Era uma questão de mobilidade. Aí, nesse momento, caiu a ficha de que, naquele peso, eu ia envelhecer mal.


A minha filha tava com 18 anos e o meu pai tinha feito 90 anos. A Ana já estava  independente, cuidando de si, estudando medicina, pronta pra andar com as próprias pernas. O meu pai tava ótimo, com a cabeça lúcida aos 90 anos e eu me perguntei: “e eu?”. 


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Como eu sou muito otimista, no mínimo eu pretendo viver o mesmo tanto que o meu pai, ou mais, já que eu sou uma geração que vem depois Tendo uma filha tão jovem e uma tradição de longevidade, eu pensei o seguinte: “eu quero viver também a minha maturidade, bem, não sobreviver ela, eu quero viver com qualidade”. Agora, gorda daquele jeito, não ia dar. Eu precisava emagrecer. 


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Agora, gente, a obesidade é uma doença difícil de lidar. O gordo tem o metabolismo lento. Eu sou casada com um médico endocrinologista e testei todas as dietas. Agora, tem uma hora que não adianta. Você se esforça, se restringe, abre mão de prazeres, emagrece, e depois ganha tudo de novo, às vezes até mais do que você perdeu. Todo mundo com excesso de peso sabe como é isso. Por isso, em 17, exatamente em setembro de 2017, eu decidi seguir um caminho mais radical, que foi o da cirurgia bariátrica.


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A técnica de redução de estômago era perigosa no início. As pessoas morriam na mesa de operação. Mas a ciência foi se aperfeiçoando e hoje em dia é uma cirurgia controlada, com riscos pequenos. A obesidade oferece muito mais perigo do que qualquer operação.


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A cirurgia foi feita por laparoscopia e durou uns 30 ou 40 minutos. No outro dia, já tive alta, já tava em casa. Agora, não pense que a bariátrica é café com leite. As pessoas acham que a cirurgia é simples. Ah, pronto, se você opera já fica maravilhosa, já sai perdendo peso e tá tudo certo. Não é assim não. O pós-operatório até que é tranquilo, mas o pós-vida exige uma BAITA disciplina. 


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O corpo demorou a se adaptar nesse novo formato. Meu intestino ficou diferente e eu passei a comer muito menos do que eu comia. Eu como de tudo, mas em pequenas quantidades. Mas não posso comer e beber ao mesmo tempo, por exemplo, porque não cabe no estômago. Então, com o passar dos anos, eu me ajustei e essas questões sinceramente ficaram menores. A comida é importante? É. A comida é importante, mas sinceramente também, eu já comi tudo o que eu queria nessa vida.


Eu passei a descobrir outras fontes de prazer, como me vestir bem, por exemplo. Antes, era a roupa que me escolhia. Agora, o poder de decisão é meu. Com 48 quilos a menos, tudo que eu visto cai bem. É uma delícia entrar numa loja e comprar um biquíni que eu achei bonito, por exemplo. Ou usar uma calça marinheiro com um monte de botõezinhos, algo impensável antes. Não é que eu tô magra, eu tô no peso que eu tenho que ter: 65 quilos pra 1 metro e 70. É uma equação equilibrada. 


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Meus índices metabólicos se estabilizaram e eu não preciso mais de remédio pra nada. Tenho a saúde de uma menina. Estou in love com esse corpo que me oferece tantas possibilidades. Fazer exercício, que era um pesadelo, ficou muito mais fácil e prazeroso. Caminhar passou a ser uma coisa leve, gostosa. Hoje cruzo a perna com uma felicidade que ninguém imagina. Eu chego a dobrar duas vezes a perna. São pequenos prazeres que quem é magro não tem a menor ideia. Olha, tem uma Silvia que ficou abandonada por muito tempo e agora tá sendo mimada. Essa é que é a verdade. Eu tô me sentindo muito plena, eu estou me sentindo muito bem.


[trilha sonora] 


Se eu soubesse que seria tão bom, eu teria operado antes. Mesmo assim, eu agradeço por ter tido a oportunidade de fazer essa mudança, de ter acordado pra ela a tempo e de poder curtir o meu corpo. Porque envelhecer já é complicado. Mas, se a gente tá em forma, dá pra filtrar várias doenças e problemas. Essa é a verdade.


Aos 66 anos, estou vivendo a adolescência da maturidade, cheia de projetos de vida que eu nem pensava em realizar. Eu me reinventei nas redes sociais, gente. Eu tô numa fase criativa profissionalmente, aprendendo, tentando usar a credibilidade de 40 anos de TV aberta como uma jornalista pra me comunicar com o meu público. Estou desenvolvendo uma linha de mesa, de toalhas, de pratos. Eu adoro esse universo do servir e agora eu tô entrando nele, como empreendedora. Um montão de novos projetos.


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A maturidade pode ser uma fase muito gostosa. É quando você tem tempo e dinheiro pra fazer coisas que durante a vida talvez você não tenha tido. A gente não precisa temer a velhice, precisa se preparar pra vivê-la da melhor maneira possível. Essa fase não tem só ruga e doença. Tem também a coragem de ser quem você é. 


A gente pode recomeçar a qualquer tempo, basta ter curiosidade de aprender coisas novas e coragem pra dar os primeiros passos. Feliz de quem tem o insight de perceber isso e de viver na plenitude, em qualquer idade. Porque se você tem 30 anos e consegue viver na plenitude dos 30, maravilhoso, ótimo! Tem muita gente que, por neurose, vai empurrando os problemas com a barriga e sendo infeliz a vida inteira. É ou não é?  A vida é muito curta pra gente não ser feliz. Chega uma hora em que ou você toma uma providência pra mudar ou entra numa posição de vítima. 


Eu espero que o meu último terço de vida seja leve, com propósito, com saúde. E olha, com tudo isso eu posso sonhar com o amanhã. Espero que eu continue descobrindo o mundo e fazendo coisas que eu nunca fiz. Eu não canso de me reinventar. Eu me casei mais velha, fui mãe tardia. Aos 45 anos a Ana nasceu. Gente, 45 anos, isso era uma novidade na época. Essa mudança do meu corpo também aconteceu numa fase em que a maioria das pessoas nem pensa mais nisso. 


No fundo, todo mundo sabe onde está pecando e onde pode melhorar na sua própria vida. Com um autoexame e sinceridade consigo mesmo, você pode estabelecer projetos e concretizar esses projetos. A vida fica muito melhor quando você vai ticando a sua lista de desejos. Quem consegue fazer isso tem uma existência menos frustrante, menos amarga, menos problemática. A gente tem que estabelecer as nossas metas e realmente se comprometer com elas. Eu queria me comprometer com um corpo novo. Eu estou comprometida com ele e muito feliz por isso. 


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Marc Kirst: A transformação de Silvia chega colocando luz em algumas das grandes contradições que vivemos atualmente. Focamos no externo, negligenciando o interno. Nos doamos ao outro e esquecemos de nós mesmos. Buscamos o prazer do agora sem cuidar do amanhã. Em uma cultura que venera a correria, a estética e o reconhecimento externo, quantos de nós, realmente, incluímos no dia a dia o cuidado e a saúde do nosso corpo? É comum estar focado na próxima conquista profissional e esquecer que é ele, o corpo, o nosso veículo, a ferramenta, o instrumento que permite e potencializa toda e qualquer realização. E claro, quanto melhor a qualidade do nosso meio, melhor será o nosso fim e o nosso resultado. 


Depois de décadas minimizando a dor e o incômodo do excesso de peso, Silvia chegou ao ponto de não conseguir andar com as próprias pernas. E com a liberdade de ir e vir ameaçada, despertou a necessidade de levar a própria saúde a sério. Autoconhecimento, honestidade e comprometimento foram a base para o nascimento de um novo nível de potência e satisfação que era até inesperado. O que antes era impossível se tornou privilégio diário. Quantos pequenos incômodos ignoramos no cotidiano, sem perceber os problemas sérios que estamos arriscando ter no futuro. Muitos precisam encarar consequências extremas pra admitir o que precisa ser feito. Te convidamos a decidir pela tua mudança, agora. 


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Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


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Para Inspirar

Depressão infantojuvenil: como reconhecer os sinais e o que fazer?

O assunto delicado que quase ninguém quer falar, mas que é urgente entre nós: nossos filhos podem estar deprimidos e precisamos saber ajudá-los.

17 de Novembro de 2023


A depressão não é brincadeira: estima-se que mais de 300 milhões de pessoas no mundo, de todas as idades, sofram com esse transtorno, sendo a principal causa de incapacidade mundial e afetando mais as mulheres do que os homens. Mas, há uma camada ainda mais fina, sutil e preocupante nesses dados, trazidos pela Organização Mundial da Saúde: em seu pior desfecho, ela pode levar ao suicídio.

Cerca de 800 mil pessoas tiram suas próprias vidas a cada ano, sendo essa a segunda principal causa de morte entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos.
E é sobre isso que vamos falar hoje. Inspirados pelo relate potente de Luciane Zaimoski, que abre a décima quarta temporada do Podcast Plenae, fomos entender um pouco mais sobre depressão infantojuvenil, doença que acometeu seu filho.

Sabemos que o assunto pode ser difícil e delicado, mas ele se faz igualmente necessário. É preciso reconhecer os sinais enquanto há tempo e saber o que fazer a partir disso. Conversamos com três especialistas para te ajudar nessa jornada!

A depressão na primeira infância

Sim, você leu corretamente: infância e depressão na mesma frase, essa triste realidade que não pode mais ser ignorada. Das 300 milhões de pessoas afetadas por ela, cerca de 2% são os pequenos. Um estudo exploratório buscou entender as manifestações clínicas dessa condição, que difere em alguns pontos dos adultos.

Segundo essa pesquisa, os sintomas giram principalmente em torno do 
transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, baixa autoestima, tristeza, medos, distúrbios do sono, enurese, dores abdominais e sintomas somáticos. Outras queixas podem aparecer e serem tratadas inicialmente sem serem identificados como depressão. São as dores de cabeça, diarreia, falta de apetite ou apetite exagerado, insônia, irritabilidade, agressividade ou passividade exagerada, choro sem razão aparente, dificuldades cognitivas, comportamento antissocial, indisciplina, ideias ou comportamento suicidas.

Realizar esse diagnóstico não é fácil, já que as crianças apresentam dificuldade para nomear esses sintomas, que aparecem de forma multifacetada, e ainda estão em desenvolvimento. Além disso, o tema só ganhou força de investigação somente em 1970 – o que é historicamente recente -, pode trazer grandes prejuízos futuros no desenvolvimento desse indivíduo que se tornará um adulto em algum momento.

“Em crianças muito pequenas, pensando de 1 até 7 anos, a gente identifica uma possível depressão ou ansiedade ou essas questões clínicas de acordo com o comportamento”, explica Carolina Bifulco, pedagoga e psicóloga especializada em primeira infância, professora bilíngue e educadora parental em Disciplina Positiva. “São alguns pontos de atenção: uma criança  que não se sente capaz de realizar as tarefas, que não se sente parte do grupo ou que está mais excluída e brinca mais sozinha”, diz.

Além disso, Carolina ainda destaca dois pontos muito relevantes nessa investigação: um comportamento agressivo com os outros e consigo e a apatia. “A automutilação – criança que se arranha o corpo ou o rosto quando se desregula emocionalmente ou a agressividade com o outro: aquela criança que começa a brigar muito com os colegas e começa a usar violência para conseguir o que quer”, explica.

Uma criança que não quer fazer atividade, não quer brincar, ou só quer dormir também é preocupante – e esse, como frisa Bifulco, talvez seja o maior ponto de atenção. “Quando ela não demonstra vontade de ser criança é quando a gente tem que parar e tentar entender o porquê que ela está agindo daquela maneira”, diz.

Sandra Evangelista, psicóloga especializada em família, casal, luto, primeiros socorros psicológicos (situações de crise), prevenção e pósvenção do suicídio, reforça a importância de diferenciar uma tristeza comum de uma depressão. “Vamos dar um exemplo: a mãe que não deixa com que o filho faça uma atividade específica. O que essa criança vai manifestar como emoção? A tristeza. Só que essa tristeza vai durar algumas horas, talvez um dia, ela não vai durar a semana ou o mês todo”, diz.

Para Evangelista, a definição do que é ser criança é ser uma “exploradora do mundo”. Então, a falta de curiosidade, a apatia, o isolamento e a agressividade, são realmente pontos que merecem essa atenção, como Bifulco havia pontuado. A dificuldade em separação e ainda a criança que se machuca de propósito também preocupam.

A depressão na adolescência 

Da mesma forma que o transtorno mental e emocional pode acometer crianças pequenas, ele pode se dar na adolescência e é ainda mais comum. As condições de saúde mental são responsáveis por 16% da carga global de doenças e lesões em pessoas entre 10 e 19 anos, segundo dados da Organização Mundialda Saúde.

Metade de todas as condições de saúde mental, continua o estudo, começam aos 14 anos de idade, mas a maioria dos casos não é detectada nem tratada. E as consequências de não abordar o tema com seriedade se estendem à idade adulta, prejudicando a saúde física e mental e limitando futuras oportunidades.

“O primeiro conhecimento que precisamos ter sobre o adolescente é: o seu cérebro, suas conexões sinápticas, a carga máxima química e hormonal, não estão prontos. Ele está em processo de amadurecimento e desenvolvimento e será finalizado em média aos 18/20 anos. O córtex frontal é responsável pelas tomadas de decisões, controle inibitório e flexibilidade cognitiva - o último a ser formado. Por isso, ele é naturalmente impulsivo, com poucos recursos e manejos diante de situações e pensamentos catastróficos, e não lida bem com o estresse. Exigir que ele haja como adulto é um erro.”, explica Thaís Malta Romano, neuropsicóloga e mestre em Ciências da Saúde pela UNIFESP.

Os sintomas do adolescente são próximos ao da criança: ainda mais irritabilidade, o isolamento e a apatia. Aqui entra o segundo ponto levantado por Romano: atenção a durabilidade e intensidade desses sintomas, pois isso fará toda a diferença. “Sinais de ansiedade e depressão tem características semelhantes ao comportamento base de qualquer adolescente. O que vai diferenciar se é um comportamento comum ou patológico é a duração e intensidade dos eventos, prejuízo sociais, acadêmicos e físicos”, explica.

O adolescente, diferente do adulto, vai apresentar pior humor, acessos de raiva e hostilidade, dores inexplicáveis na cabeça, estômago, coluna e pescoço travados com frequência, uma altíssima sensibilidade a críticas, podendo apresentar choros, crises de raiva e até automutilação, além de uma vulnerabilidade extrema à rejeição e ao fracasso”, continua Thaís.

Há um isolamento exacerbado também que pode ocorrer, e não só aquele clássico do quarto, jogando videogame, mas um isolamento dos melhores amigos também. Isso pode ser o início de um comportamento evitativo com aqueles que o conhecem melhor, cujo objetivo é esconder um machucado, um olho inchado ou somente uma expressão de tristeza. A observação das microexpressões faciais aqui será muito importante.

A queda no rendimento escolar ou pedidos de falta com muita frequência e uso de substâncias como álcool e drogas, podem ser tanto consequências de um quadro psiquiátrico já instalado quanto um gatilho para o desenvolvimento de um. 

O adolescente que está sempre muito cansado, uma exaustão extrema que não é sobre o sono – afinal, é natural que eles durmam mais horas e, por sua vez, será extremamente importante para a manutenção da saúde mental e física – também são atípicas. O abandono de atividades que gosta e não simplesmente mudança de preferências, mudança no comportamento alimentar, tudo isso é relevante nessa jornada da observação”, pontua.

E, por fim, chegamos à automutilação. Ela pode começar com algo “leve”, como roer unhas até sangrar, arrancar peles pequenas da boca, cutucar espinhas e causar machucados menores pelo corpo ao menor sinal de ansiedade. Acontece que esse comportamento pode levar a outro pior: se cortar ou se machucar de forma mais intensa ou até atentar contra a sua própria vida, o estágio final e mais preocupante de todos. “Essa automutilação é uma forma que o adolescente encontra para se autorregular emocionalmente quando não tem recursos sociais e cognitivos suficientes para lidar com o problema”, diz.

O papel da escola e dos especialistas na jornada da depressão infantojuvenil

Para as três entrevistadas, o papel da escola é fundamental. “O primeiro passo a ser feito quando você começa a enxergar uma mudança de comportamento dessa criança é marcar uma reunião com o coordenador e o professor dela para entender se esse comportamento que você está observando em casa se mantém na escola. Depois dessa reunião, se eles baterem na tecla que ela de fato está diferente, o próximo passo é procurar um psicólogo especializado em clínica infantil”, pontua Carolina Bifulco.

É no ambiente escolar onde a criança será assistida por olhos diferentes e onde o tema da saúde mental poderá ser promovido em sala de aula ou em atividades extracurriculares. É por lá também que ela irá socializar, atividade que pode escancarar alguns comportamentos que mencionamos, como o isolamento ou a agressividade.


“As escolas precisam ainda promover formações para os seus profissionais visando a questão da saúde mental, promover campanhas internas para seus professores e funcionários, ensinando-os como identificar, como intervir, etc. Tem que ser uma coisa maior, que faça parte do projeto político-pedagógico da instituição. Os pais também têm que ser contemplados nessa campanha com palestras, debates, formações sobre a prevenção, entre outros”, continua Bifulco.

Mas, é preciso cautela nessa transferência, pois a escola é parte de um todo, e não a responsável total pelo problema, como reforça Thaís Malta. “Direcionar a responsabilidade total aos educadores é sobrecarregar um profissional que não está habilitado para tal função. A realidade é diferente do desejo, há professores com dois turnos de trabalho, com três ou quatro salas de quarenta alunos. Há casos que naturalmente chamam mais atenção, mas o que nos preocupa são os adolescentes discretos com suas dores”, pontua.

Algumas possibilidades sugeridas por Thaís para driblar esse impasse são os dias temáticos, atividades extracurriculares, palestras, rodas de conversa. “Dessa forma, podemos instrumentalizar os adolescentes a reconhecer sinais em si e nos colegas, prevenir o bullying, o assédio, as brigas. Um educador físico que ensine consciência corporal, respiração, relaxamento, meditação. Ter uma equipe de acolhimento, com um espaço seguro para que eles possam se expressar sem julgamentos ou ameaças.”

A escola, como dito anteriormente, trabalhará em conjunto com os especialistas. Mas, quem são eles? “São duas abordagens mais utilizadas nesse caso: a psicanálise e a comportamental. A segunda é mais específica para ensinar novos comportamentos, mudar uma fobia ou atender crianças atípicas. Se a questão for de comportamento emocional ou de pensamento, a psicanálise Winnicottiana seria ideal para começar a investigar e entender o que essa criança está sentindo”, explica Carolina.

O papel dos pais na jornada da depressão infantojuvenil

Se a escola e a escuta profissional são parte do caminho, a outra parte, é claro, fica aos tutores. E vale dizer, uma parte bastante significativa. Sabemos que há um fator genético importante envolvido em vários casos de depressão. Mas, há outros vários casos que se dão por conta de um ambiente estressor ou algum gatilho específico, uma situação vivida por aquela criança ou adolescente, por exemplo.

“Se eu tenho um ambiente familiar disfuncional com muita agressividade, brigas entre o casal, violências físicas, psicológicas e às vezes até um abuso sexual, esses fatores todos vão marcar significativamente essa criança e esse adolescente, aumentando a possibilidade do desenvolvimento de um transtorno”, revela Sandra Evangelista.

“O que nós temos hoje são os pais provedores da família, que saem para trabalhar e ficam distantes dos seus filhos. Oferecer boas oportunidades para seus filhos é importante. Porém, mais importante ainda é garantir o afeto e a segurança emocional. E como a gente faz isso? Sendo presença. Estando perto. Brincando junto. Entendendo como está sendo o dia a dia deles, quais são as dificuldades”, pontua.

Sandra menciona também os benefícios da previsibilidade e da rotina: ter horas para as atividades e ter regras torna o lar um ambiente seguro, com limites, contorno e bem-estar. Para Thais, tratar a dor de seu filho como “mimimi” é parte do problema. Dizer frases como “na sua época eu já trabalhava e não tinha tempo para pensar nisso” não são um mérito, pois esse cuidador deve se perguntar: o que eu passei me tornou um adulto hoje feliz? Era necessário ter vivido aquela situação?", questiona Thais.

“Estamos falando de pais que, em sua adolescência e até mesmo na vida adulta, não tiveram e não têm suas emoções e sentimentos acolhidos e validados. Como é que eu acolho meu filho, meu neto, meu sobrinho, se eu não tive essa experiência? Mas há alguns passos possíveis de serem feitos por todos”.

Legitimar e validar os sentimentos do seu filho é um passo importante na Disciplina Positiva, assunto que abordamos por aqui em um Plenae Drops. “A disciplina positiva consiste em uma forma de se criar crianças com base em firmeza e gentileza sem o uso de punição. Não se trata de não impor limites, mas de colocá-los sem violência. O primeiro passo de tudo é criar esse ambiente seguro em casa onde a criança pode se expressar, falar o que ela pensa, conversar, se expor e principalmente, ser levada a sério", explica Carolina Bifulco.

Outros passos importantes dessa filosofia é parar de buscar culpados e procurarem juntos uma solução, além de dar o peso devido às coisas. “Se um amigo seu adulto derruba um copo, você não grita com ele. Por que fazer isso com uma criança que, ao contrário do seu amigo, está aprendendo a ter equilíbrio e coordenação motora?”, questiona Bifulco.

Por fim, um ambiente seguro e acolhedor é também um ambiente onde as crianças são encorajadas a testarem, se arriscarem e, claro, errarem. Essa confiança fará a criança se sentir capaz de tudo e isso, no futuro, irá refletir em um adulto que expressa suas ideias sem medo, autônomo, livre e com uma boa autoestima.

Aos pais de adolescente: resista fortemente a qualquer impulso de criticar ou julgar o  quando ele estiver falando – e isso inclui sem caras e bocas. Demonstre, enfatize, fale sobre o interesse em ouvi-lo, reconheça, acolha e valide seus sentimentos. Persista no diálogo, mas com respeito.

"Dificilmente o adolescente vai te procurar, mas nenhuma conversa deve cair num limbo. Retome semanalmente, quinzenalmente, até se tornar um hábito o diálogo entre vocês”, explica. “Tenha a curiosidade sobre o adolescente, pergunte sobre suas referências públicas nas redes sociais, conheça os seus amigos, promova encontro entre eles. E por fim acredite: você está dando o seu melhor". Você é capaz de abraçar essa causa e tornar a vida do seu filho muito melhor: acredite! 

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