Para Inspirar

Verônica Hipólito em "A zona de conforto é um lugar prazeroso, pena que nada acontece lá"

A sétima temporada do Podcast Plenae está no ar! Confira a história da atleta Verônica Hipólito. Aperte o play e inspire-se!

20 de Fevereiro de 2022


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:


[trilha sonora]


Verônica Hipólito: Eu tenho 25 anos e já passei por quatro cirurgias, três no cérebro e uma no intestino. Também sofri um AVC, que deixou uma sequela de paralisia no meu corpo. Mas eu não só isso. Eu também sou campeã mundial nos 200 metros rasos, tenho sete medalhas parapan-americanas, duas medalhas paralímpicas, uma de prata e outra de bronze. Sou uma das oito mulheres mais rápidas do mundo de todos os tempos do esporte paralímpico. Há quem diga que as minhas conquistas são fruto do destino, mas eu não compro essa história. Eu acredito em criar e aproveitar as janelas de oportunidade, se arriscar, sair da zona de conforto. 


[trilha sonora]


Geyze Diniz: Exemplo de resiliência, a atleta paralímpica Verônica Hipólito, ao longo da sua infância, adolescência e vida adulta, teve sempre que driblar seus problemas de saúde para ultrapassar seus recordes, desafios e, literalmente, correr atrás dos seus sonhos. Verônica se abala com as frustrações como qualquer um de nós, mas não se permite cair no lugar do vitimismo. Para ela, a chave do sucesso é aprender a jogar com as cartas que a vida lhe dá. 


Conheça a história da velocista e orgulho nacional Verônica Hipólito. Ouça, no final do episódio, as reflexões do especialista em desenvolvimento humano, Mark Kirst, para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.


[trilha sonora]



Verônica Hipólito: O esporte sempre fez parte da minha vida. Por incentivo dos meus pais, pratiquei de tudo um pouco. Natação, volêi, futebol, ginástica, futsal, basquete, tênis de mesa, de quadra, judô, karatê…Ufa! Os meus pais nunca pensaram em me transformar numa atleta profissional. Eles são professores de história e acreditam na educação e no esporte como ferramenta pra formação de caráter. Essa era a motivação deles.


[trilha sonora]

 

Eu era ruim em quase todas as modalidades, mas me encontrei no judô. Fui pro campeonato municipal, de lá pro estadual, depois pro estadual do interior e então consegui a tão sonhada vaga pra disputar o nacional. Umas semanas antes da competição brasileira, descobri que eu tinha um tumor na cabeça e precisava operar com urgência. Eu tinha 12 anos.

 

Minha mãe me disse na época pra fazer o que deveria ser feito. Eu operei, e depois da cirurgia soube que não poderia voltar pro campeonato nacional. Na verdade, eu nem sequer poderia lutar judô novamente, nem praticar qualquer modalidade de impacto.

 

[trilha sonora]


Eu fiquei muito chateada. De uma hora pra outra, eu não podia  fazer mais a atividade que eu mais amava. Ainda na infância, na base da porrada, eu comecei a aprender um conceito que seria vital pra mim até hoje: resiliência.

 

[trilha sonora]

 

Resiliência é a capacidade de se adaptar às más condições. Ou, nas minhas palavras, é a vida te derrubar, te encher de porrada e você se levantar. 

 

Meu pai viu que eu tava muito triste e me inscreveu num festival de atletismo, pertinho de casa. Era domingo, umas 7 horas da manhã, e eu não queria ir, mas ele me levou mesmo assim. Eu corri pela primeira vez, e levei uma surra. Não liguei pra derrota e saí de lá falando que queria ser a menina mais rápida da cidade. Meu pai disse: “Então, se esforce para isso”. Parece cena de filme, eu sei, mas aconteceu desse jeitinho.

[trilha sonora]


Eu comecei a treinar atletismo e me empolguei. Tava indo tudo bem, até que uma noite, aos 14 anos, senti um formigamento no braço e na perna. Eu tava em casa. Tentei falar pro meu irmão, mas a frase não saía da minha boca. Caí no chão e acordei no hospital, com a parte direita do meu corpo paralisada. Me disseram que eu tive um AVC e não poderia voltar a correr, talvez nem caminhar. Na alta, na porta do hospital, meu pai me disse pra eu não aceitar que alguém dissesse o que era possível ou impossível pra mim. Eu voltei pra fisioterapia e pra fonoaudiologia. Reaprendi a falar, a andar, a trotar, a correr e a correr mais rápido.

 

Procurei a melhor equipe de atletismo da cidade, fiz um teste e passei. Mas, por mais que eu treinasse, eu continuava mancando. Eu tinha espasmos e meu braço ficava extremamente rígido. O treinador da época disse que provavelmente eu era uma atleta paralímpica, que estava competindo com os olímpicos. 

 

Aos 16 anos, fiz uma classificação pra saber se eu tinha legitimidade ou não pra entrar no movimento paralímpico. E eu tinha, pela sequela do AVC. No campeonato regional, conquistei 3 medalhas de ouro. Depois, mais três no nacional. E no meu primeiro mundial, me tornei campeã e recordista dos 200 metros rasos. Naquele momento, eu não era só a mais rápida da cidade, eu era a mais rápida do planeta! 

 

[trilha sonora]

Eu continuei ganhando tudo e, aos 19 anos, faltava só um ano pra competição mais desejada por todos os atletas: as paralimpíadas. Até que eu comecei a me sentir mais fraca, com sono, e descobri que tinha mais de 200 tumores no meu intestino grosso. Não é câncer, mas é uma mutação genética que facilita a produção de tumores benignos em alguns lugares do meu corpo. De novo: problema versus solução. Eu acreditei na ciência e encarei a cirurgia pra retirar 90% do meu intestino grosso. Me recuperei e voltei a correr, conquistei o índice pros jogos paralímpicos e fui pro Rio de Janeiro. Foi a minha consagração. Eu ganhei a medalha de prata nos 100 metros rasos e bronze nos 400. 

[trilha sonora]


É claro que, como atleta, eu sempre quero mais. Eu tava voando e mirando nos ouros que eu queria conquistar em Tóquio. Mas o tumor no cérebro voltou. Eu operei. Em 2018, tive que repetir a cirurgia, por causa de erro médico. Dessa vez, o baque foi imenso, o maior de todos. 

 

Eu já não tinha uma parte da minha hipófise, que é uma das glândulas que produz hormônios. Por causa dos remédios, o meu peso foi de 47 quilos pra mais de 70. Eu vestia PP com folga e, de repente, passei a usar GG. De repente, eu tava cheia de estrias, com uma barriga enorme. Eu não aceitava aquele corpo.

 

[trilha sonora]


Foi muito frustrante. Eu me perguntava: por que eu? Se tem tanta gente que faz coisa errada, por que isso acontece comigo? Por que minha família tem que passar por isso de novo? Eu busquei uma resposta em vários lugares: no catolicismo, no protestantismo, na umbanda, no espiritismo, no budismo, em tudo que tinha “ismo”. E não encontrei um por quê. Ninguém desceu do céu pra falar comigo. Eu não queria mais treinar, e eu sentia raiva o tempo todo. Era só raiva, raiva e raiva. Demorou um tempo pra eu entender que aquele não era o melhor jeito de encarar as coisas.

A minha inspiração pra voltar a treinar foi olhar pros meus pais, pra minha saudade de correr, pra minha equipe, pras pessoas que me incentivam. Eu entendi que eu podia sentir raiva, ficar brava, insegura, mas eu tinha que voltar a fazer aquilo que eu sei, aquilo que eu amo: correr. 

 

[trilha sonora]


A primeira corrida de treino eu me lembro muito bem. Tinha chovido a semana inteira. No dia, fez um sol de rachar a cabeça. Eu já tava me firmando bem em pé, e o meu fisioterapeuta, o Mauro Meloni, falou pra mim: “Tenta correr, mas só um pouquinho”. 

 

[trilha sonora]

 

Eu fiquei com medo. Aí refletiu um raio de sol numa placa de vidro e fez um reflexo fortíssimo. Eu sou fã de Star Wars, e o Mauro disse: “Corre em direção à luz”. Eu dei risada, tomei coragem e consegui dar quase um trote.

Depois veio a primeira competição, no Centro de Treinamento Paralímpico Brasileiro, em São Paulo. Era uma prova de 100 metros. Eu só consegui índice pra tá lá, porque pegaram a minha marca do ano anterior. Tinha muita gente assistindo e eu queria que todo mundo fosse embora antes da minha corrida. Mas a galera não foi. Quando eu entrei na pista, a arquibancada tava lotada, lotada de tudo. E aí alguém berrou: “A Verônica vai conseguir, ela sempre consegue”. Aí mais gente gritou palavras de incentivo.

Quando comecei a correr, os 100 metros pareciam mil quilômetros. Meu tempo foi péssimo, mais de 14 segundos, que é muito acima da minha melhor marca, 12 segundos e 80 centésimos. Tomei um coro e cheguei em último lugar. Doeu. Eu chorei de raiva, tristeza, desespero e até felicidade, tudo misturado. Minha mãe tava lá e ela falou: “Agora é trabalhar”.

Fui pro Parapan, em Lima. Como eu não acreditava no pódio, eu não queria que minha mãe fosse comigo. Ela insistiu e disse: “Eu vou porque eu quero te ver, no primeiro lugar ou não”. Na hora da competição, me deram 5 minutos e eu pensei: “Meu, já que eu tô aqui, bora. Minha mãe vai continuar me assistindo, meus amigos vão me assistir, eu vou fazer o que?” Eu ainda tava acima do peso, me recuperando de duas canelas quebradas, mas dei o meu melhor. Na prova de 200 metros, eu saí muito rápido. Faltando 30 metros pra acabar, eu sabia que eu ia conquistar a prata e comecei a chorar de felicidade. Depois meu professor brigou comigo depois. Se eu não tivesse chorado, dava pra tentar o ouro. Mas eu ganhei a prata também nos 100 metros. Eu, que antes desprezava a prata, fiquei MUITO feliz com essas medalhas. O significado delas era gigante.

 

[trilha sonora]

Mas a minha principal conquista de todas, curiosamente, foi NÃO conseguir ir pros Jogos Paralímpicos de Tóquio. Sabe aquele tumor no cérebro? Ele voltou e interrompeu o meu treino. Dessa vez, parece que virou uma chavinha na minha cabeça. Eu não senti raiva. Eu não perguntei o “por que eu?”, eu nem fui buscar respostas no além. 

 

A gente tem a mania de só considerar o sucesso quando traça um plano e aquele plano dá certo. Eu entendi que não é bem assim. O sucesso não necessariamente vem da maneira que a gente desenhou. E aí entra, de novo, a resiliência. Eu aprendi a jogar com as cartas que a vida me dá. É chato ter operado tantas vezes? É chato. Eu fico chateada? MUITO! Mas a vida não foi feita pra gente ficar chorando e resmungando. Eu sinto a raiva e a tristeza, mas depois enxugo as lágrimas e busco a solução. Para que complicar? De uma maneira inesperada, recebi um convite do canal SporTV pra comentar os Jogos Paralímpicos de Tóquio. Eu me diverti e aprendi MUITO. Foi uma maneira diferente de ir pra competição, sem o peso de antes.

 

[trilha sonora]


Muita gente brinca que a vida não é uma corrida de 100 metros, mas sim uma maratona. A minha provavelmente é uma maratona, de tantas coisas que acontecem. Mas uma maratona formada por ciclos de 100 metros. E uma corrida de 100 metros não é definida em 12 , ou em 9 segundos, se você for o Usain Bolt. O resultado é definido no dia-a-dia, quando você decide se levantar ou ficar na cama. Quando você decide sentar e chorar ou ir pra cima. Todos os dias, eu coloco um tijolinho na construção da minha final Paralímpica, na medalha de ouro que eu quero buscar em Paris. Eu vou operar o cérebro pela quarta vez e vou voltar aos treinos.

A zona de conforto é um lugar prazeroso, pena que nada acontece lá. Já a zona onde estão os seus sonhos é um lugar cansativo, muitas vezes dolorido e cheio de frustrações. Na zona de conforto você não sente medo e raiva, mas fica estagnado pra sempre. Vive no eterno “e se”, “e se eu tivesse tentado?”

Muitos achavam que seria impossível eu voltar a andar depois do AVC. Eu voltei a correr. Muitos achavam que seria impossível eu conseguir ser reconhecida no mundo esportivo. Eu me tornei a mulher mais rápida do mundo e me tornei medalhista paralímpica. Muitos achavam que seria impossível eu ir pra Tóquio. Eu fui, de uma maneira inesperada, mas fui. Nada é impossível. Trabalho duro, humildade, honestidade e resiliência nos levam para lugares incríveis. Tente.

[trilha sonora]


Mark kirst: A história de infinitas superações de Verônica é capaz de nos demonstrar, na prática, um dos maiores segredos no uso da nossa mais perigosa e potente ferramenta humana: a mente. Nesta existência atual, duas forças convivem a todo momento. Um pulso evolutivo e expansivo, que nos estimula a crescer, superar os nossos limites e conquistar mais vida a cada oportunidade. A outra força é a da resistência, que busca poupar energia, preservar o conhecido e defender a famosa zona de conforto. 


A mente é o filtro que determina qual dessas forças vencerá a prova de cada dia. O segredo aberto para todos, mas compreendido por poucos, é o poder de decisão que todos temos ao alcance a todo momento. Veronica define a virada de perspectiva com simplicidade: “vou encarar a situação como problema ou solução”? Fomos inspirados a nos permitir sentir a potência da raiva para depois poder transmutar a dor em força de evolução. Independente da magnitude do obstáculo ou desafio, se cedermos a reatividade automática e negativa da mente, cairemos numa espiral descendente que nos leva a questionar a própria capacidade, sabotar as possibilidades e paralisar qualquer ação. Ao encarar desafios de tamanhos inimagináveis para a maioria de nós, e continuar mesmo assim escolhendo pela volta por cima, Verônica nos convida a perceber que a nossa realidade é sim produto da nossa liberdade de interpretação. Qual é a sua corrida? E quais são os seus obstáculos? Sua vitória mora no ouro, ou na capacidade de cair e levantar? 


[trilha sonora]


Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


[trilha sonora]

Compartilhar:


A conquista da solitude

Solidão e solitude são conceitos diferentes, quase conflitantes, apesar de prefixos idênticos.

15 de Abril de 2024


Solidão e solitude são conceitos diferentes, quase conflitantes, apesar de prefixos idênticos. Se o primeiro termo fala de um sentimento ruim, originário de uma situação imposta, o segundo fala sobre uma atitude perante a vida. A solidão não é uma opção intencional e agradável, remete à melancolia. A solitude é simplesmente saber ser só e gostar de sua própria companhia. 

Mas saber ser só é tarefa que exige de nós habilidades múltiplas. A capacidade de silenciar-se e permitir-se ouvir o barulho ao seu redor sem contribuir como falante, apenas como ouvinte. A resiliência de tentar quantas vezes for preciso algum processo interno ou externo, mas que depende só de você.  

Saber ser só não é saber com profundidade aquilo que te faz bem e, mais do que isso, o momento certo das coisas. É também ser grande o suficiente para escolher quando se quer estar com os outros ou não, pois a solitude não precisa ser condição eterna. Lembre-se: é preciso partilhar a vida com seus semelhantes. 

Caminhar em alegria e harmonia consigo é ter atingido um nível profundo de autoconhecimento e paz interior, mas que não são inabaláveis, pois a vida não é uma linha reta e são as curvas que tornam o trajeto tão bonito. É preciso saber ser só, pois essa é enfim a condição humana. Afinal, grande parte do nosso tempo, estamos com mais ninguém senão nós mesmos.  

E que lindo é poder se olhar no espelho e gostar daquilo que se vê para além da beleza física. Que importante é poder andar sem fones, ouvindo seus próprios pensamentos. Como é bom rir sozinho, cozinhar o seu prato favorito, respeitar os seus limites. E que potente é vislumbrar um futuro onde todos os seus planos têm você por toda a parte. Viva a solitude daqueles que sabem ser só!

A conquista da solitude A conquista da solitude A conquista da solitude A conquista da solitude

Compartilhar:


Inscreva-se na nossa Newsletter!

Inscreva-se na nossa Newsletter!


Seu encontro marcado todo mês com muito bem-estar e qualidade de vida!

Grau Plenae

Para empresas
Utilizamos cookies com base em nossos interesses legítimos, para melhorar o desempenho do site, analisar como você interage com ele, personalizar o conteúdo que você recebe e medir a eficácia de nossos anúncios. Caso queira saber mais sobre os cookies que utilizamos, por favor acesse nossa Política de Privacidade.
Quero Saber Mais