Para Inspirar
Com o aumento das temperaturas e a iminência do aquecimento global, há riscos pouco conhecidos que podem comprometer a nossa saúde.
2 de Fevereiro de 2024
As notícias não são das melhores: o aquecimento
global, alertado pelos cientistas há muitas décadas, já chegou entre nós e não
para de ganhar forças. Esse aquecimento generalizado que avança a passos largos
não causa somente altas temperaturas, apesar do nome.
O fenômeno afeta de forma radical, fazendo com que
o planeta experimente extremos a todo tempo, invernos e verões sem precedentes
por toda a parte, sem falar nas estações do ano cada dia mais confusas e menos
estabelecidas. E em 2023, batemos o triste recorde de ter sido o ano mais quente da história.
Todas essas mudanças geram novos termos que tentam
traduzir as novas angústias. A eco ansiedade, por exemplo, que te contamos neste Tema da Vez, é um dos exemplos. Há até uma linha de pesquisa
que sugere apostar nos sonhos como caminho para reduzir a ansiedade com a
mudança climática, como conta esse artigo do jornal da USP.
Mas, hoje explicaremos um outro termo que afeta mais o nosso corpo do que a nossa mente: o estresse térmico.
Uma pesquisa recente trouxe um lado da questão climática que ainda não
debatíamos com a seriedade necessária: os efeitos que esse futuro do planeta
exerce sobre o nosso corpo e bem-estar. Realizado pelo Instituto de Saúde
Global de Barcelona (ISGlobal) e pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de
Londres, o estudo trouxe conclusões inéditas diante das temperaturas inéditas.
Ele foi publicado na revista Npj | Climate and
Atmospheric Science, da Nature, e reforça que os alertas dos serviços
meteorológicos sobre ondas de calor deveriam se basear não apenas nas
temperaturas, mas incluir também índices de estresse térmico que levem em
consideração fatores como umidade, vento e exposição ao Sol, como conta a BBC.
Um dos maiores problemas é o nível elevado de
umidade no ambiente junto a uma ausência de vento. Essa combinação pode fazer
com que uma temperatura de 37ºC seja mais prejudicial à saúde do que a mesma
temperatura em um ambiente seco ao dificultar o resfriamento do corpo humano.
É nessa toada que surge o “estresse térmico”, que,
em linhas gerais, “trata-se de levar em consideração que temperatura não é o
mesmo que calor", explica Xavier Rodó, um dos autores do estudo, à BBC
News Mundo, serviço em espanhol da BBC.
"A diferença está em como o corpo percebe
fisiologicamente a combinação entre uma temperatura alta e uma umidade alta.
Isso é o que os diferentes índices de estresse térmico levam em consideração de
certa forma, junto a outros parâmetros como vento e radiação, mas basicamente o
aspecto central é a umidade", acrescenta.
O ponto central desse estudo não é propriamente
combater o aquecimento global, apesar de ser um dos pilares que sustentam as
crenças dos envolvidos. Mas aqui, a estratégia é outra: o que o estudo faz
acima de tudo, segundo Rodó, é enfatizar que a comunicação por parte dos
serviços de meteorologia sobre como comunicam os eventos extremos está muito
focada em falar somente sobre as temperaturas máximas, e esquece dos outros
parâmetros.
Com a umidade acima de 50% e temperaturas elevadas,
explica o periódico, o corpo perde a capacidade de dissipar o excesso de calor
já que não consegue transpirar da mesma forma. A consequência direta disso é a
incapacidade de se resfriar - e é aí que mora o perigo.
Para ele, é preciso seguir o que Estados Unidos,
Canadá e Alemanha já vêm fazendo, que é incluir os índices de estresse térmico
em suas comunicações Isso é importante porque, como mencionamos anteriormente,
a mesma temperatura em diferentes níveis de umidade oferece riscos distintos.
É certo que cada indivíduo possui a sua própria
sensibilidade e resistência ao calor e ao frio. Uns são “friorentos”, outros
“calorentos” ou neutros. Além disso, há alguns fatores externos que podem
agravar algumas dessas sensações, como a menopausa, que pode aumentar a
sensação de quente, por exemplo.
Sendo assim, pode parecer tarefa impossível definir
um nível de alerta de calor único para todos, mas alguns já foram criados por
outras nações, como o humidex (Hu) usado no Canadá, o índice de calor (HI)
adotado nos EUA e o índice universal de clima térmico (UTCI), utilizado na
Alemanha.
Entretanto, essa mensagem continua a ter como foco
as temperaturas máximas, em partes por uma falta de entendimento do público
sobre as particularidades de cada cenário. É preciso que se estabeleça
parâmetros claros e de fácil compreensão para a população, afinal, essa
preocupação com o estresse térmico não surgiu do nada.
Para elaborar o estudo mencionado anteriormente, os
cientistas envolvidos estudaram as ondas de calor recorde que assolaram a
Europa, América do Norte e Ásia recentemente. Uma comparação foi feita entre os
mapas das temperaturas máximas diárias com os índices de estresse térmico
máximo de cada dia.
O que se descobriu é que as áreas geográficas onde
os índices de estresse térmico eram mais altos não necessariamente eram as
mesmas regiões em que foram registradas as temperaturas mais altas. Vale
reforçar que essas conclusões são extremamente recentes, até porque estamos
testemunhando diante de nossos olhos todas essas mudanças.
Em 2021, por exemplo, a Fundação Oswaldo Cruz já havia utilizado o termo“estresse térmico” em uma pesquisa até então
inédita, cujo objetivo era avaliar os potenciais riscos de aumento da
mortalidade por doenças cardiovasculares e respiratória sob o calor. Mas de lá
para cá, as conclusões evoluíram e as percepções também.
No final de 2023, uma fã da cantora pop Taylor
Swift entrou para as tristes estatísticas dos novos tempos e morreu durante o
show da cantora por exaustão térmica, segundo os laudos. Com pouco acesso a
água e exposta a uma sensação térmica de 60ºC, a estudante universitária Ana
Clara Benevides Machado sofreu um choque cardiovascular e comprometimento grave
dos pulmões, resultando em parada cardiorrespiratória.
Esse superaquecimento do corpo dilata os vasos sanguíneos, que leva a uma pressão arterial
baixa e faz com que o coração trabalhe mais para conseguir transportar o
sangue. Como explica outro artigo da BBC, se o corpo chega até os 39ºC ou 40°C,
o cérebro lança um comando para os músculos baixarem o ritmo, e acima dos 41°C,
o corpo começa a desligar.
É nesse estágio que os processos químicos são
afetados, causando deterioração das células, que pode levar a uma falência
múltipla de órgãos. Se houver suor excessivo, em uma tentativa do seu organismo
de resfriar e trazer o calor interno para a superfície, ele pode também perder
líquidos e sais minerais importantes.
Outros sinais para se estar atento antes do quadro piorar:
É importante não confundir esses sintomas de
exaustão térmica com os de insolação, que apresenta náusea,
dores de cabeça e batimentos cardíacos acelerados, mas apresenta ausência de suor, pele quente e seca, convulsões e perda de
consciência.
Alguns grupos estão mais sujeitos ao risco:
Há ainda condições que não são físicas, mas podem deixar as pessoas mais expostas, como indivíduos em situação de rua ou quem mora em apartamentos no último andar de prédios.
É preciso fazer uma análise prévia da gravidade da
situação e não tratar de forma leviana, mas sim como uma emergência médica. Se
o corpo da pessoa acometida puder ser resfriado em cerca de meia hora, como explica esse artigo, então a exaustão pelo calor normalmente não é tão
grave, pois passando esse tempo, trata-se de um quadro de insolação.
Mas ainda assim, movê-la para um local fresco e com
sombra deve ser a prioridade. Deitar e elevar os pés ajudará no controle da
pressão arterial e a hidratação - sobretudo com isotônicos - ajudará a repor os
líquidos perdidos no suor. Resfriar a pele da pessoa ajudará no controle da
temperatura externa, e isso pode ser feito borrifando água ou aplicando
compressas frias no pescoço, axila ou pulso.
"As lições aprendidas com as grandes ondas de
calor recentes sugerem que é necessário melhorar os protocolos de ação. Uma vez
emitido um alerta meteorológico, é necessário haver uma cadeia clara de
responsabilidades", diz Ivana Cvijanovic, principal autora do estudo
mencionado no começo do artigo, para a BBC.
"As autoridades devem agir prontamente e saber
quando fechar escolas ou suspender atividades esportivas ao ar livre, abrir
centros de refrigeração para populações socialmente vulneráveis e garantir
uma resposta de emergência suficiente. Educar a população em geral sobre como
se comportar durante as ondas de calor também é muito importante",
conclui. É preciso ação individual, mas também as coletivas, para lidar com um
problema que só tende a crescer.
Para Inspirar
Assim como o Caminho de Abraão trilhado por Ale Edelstein, muitas pessoas buscam em longas caminhadas, reencontrar sua fé e a si mesmo
3 de Dezembro de 2020
Na terceira temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir, conhecemos a história do cantor litúrgico Ale Edelstein. Utilizando um sapato como metáfora, ele nos conta como sentia que usava o mesmo calçado há tempos, e que passou a sentir necessidade de sentir o chão na sola dos pés.
Apesar de simbólico, Ale de fato saiu caminhando “por aí”, mais especificamente, trilhou o Caminho de Abraão, que tem como principal missão ser uma jornada de pacificação e paz entre diferenças crenças.
A trilha, que possui cerca de 2 mil quilômetros, busca atravessar os locais por onde, segundo a história conta, o personagem bíblico Abraão percorreu a mando de Deus. Hoje em dia, esse trajeto corresponde aos territórios de países como Túrquia e Israel.
Essa é uma das muitas opções de peregrinações que existem, sendo uma das principais e mais famosas - como aponta este site . Importante reforçar que a peregrinar não se resume somente ao fato de caminhar, mas diz respeito a uma jornada maior, que pode ser feita individualmente ou em grupo, tendo sempre um objetivo espiritual e de autoconhecimento envolvido.
O destino final das peregrinações também são específicos. Portanto, além da busca pela sua essência que a trajetória reserva, o peregrino recebe como recompensa final o prazer de ter chegado em um local considerado sagrado do ponto de vista religioso e histórico - seja por já ter abrigado manifestações sobrenaturais, acontecimentos importantes ou somente a passagem de um ser superior.
Marco Antonio dos Reis Serra foi um dos milhares de peregrinos que atravessam longas distâncias em busca de um sentido maior para a vida. Depois de dedicar toda a sua vida trabalhando no mercado financeiro, ao completar 50 anos, ele se viu em busca de mais.
Do momento da decisão até o da viagem foram apenas 2 meses. O gatilho para essa decisão foi a volta de uma viagem de trabalho. Enquanto lia dentro do avião, se deparou com um trecho que o provocou de tal maneira que, desde então, nunca mais se sentiu o mesmo.
Passagens compradas, uma mala e uma bota, e isso foi o bastante para que ele embarcasse, pela primeira vez, sem nenhum planejamento. “Pouca gente sabe disso, mas o Caminho de Santiago tem centenas de rotas. Mas o caminho francês é o caminho mais tradicional e foi o que eu fiz, o trecho de 800 km que começa na França e termina no último ponto da Espanha”. Confira o relato completo a seguir.
“Fiz o que eles chamam de caminho francês, em Santiago da Compostela, que é o caminho mais tradicional desse tipo de peregrinação. Mas ele não é um caminho único e nem se sabe se foi o primeiro, porque o Caminho de Santiago é milenar, há muitos anos percorrem essa jornada. Ele é basicamente um caminho que tem aproximadamente 800 km de extensão, liga uma cidade que chama Saint Jean Pied de Port até Santiago de Compostela, na Espanha.
Antigamente as pessoas faziam esse trajeto somente por questões religiosas católicas, mas eu fiz mais pelo isolamento, pela experiência. Santiago foi o primeiro apóstolo de cristo a morrer após a crucificação, por continuar a pregar a palavra de Cristo - proibida na época. Depois, os restos mortais dele, no ano de 42 D.c, foram roubados por fiéis que levaram ele da região onde hoje é a Palestina até Santiago de Compostela. Os restos mortais dele, em teoria, estão lá na catedral. Existem rotas que vem desde Istambul também, existem muitas rotas. Chama Compostela porque tem a ver com a descoberta de que esses restos mortais estavam lá e foram descobertos por jesuítas por meio de uma indicação luminosa de estrelas que indicavam que ali estariam esses os restos. A partir de então, isso virou uma peregrinação.
Muita gente pergunta porque foi de Palestina até lá. A explicação lógica é que depois de Santiago de Compostela, se você andar mais uns 120 km, você chega em um lugar chamado Finisterra, que é o ponto mais ao Ocidente da Europa, e antigamente se acreditava que a Terra acabava lá.
A questão toda desse caminho é que ele te expõe a um isolamento, uma meditação. Há ainda quem faça por homenagem a alguém. Não envolve se cercar de luxo, mas sim de simplicidade e introspecção. Tem alguns lugares que são até credenciados do Caminho de Santiago. Você leva um passaporte do peregrino e vai carimbando, e quando você chega no lugar final, eles te dão uma carta escrita com fio de ouro, dependendo da sua rota eles colocam quanto tempo você caminhou e tudo mais. Você pouco passa em cidades grandes, e mesmo as grandes, são bem pequenas, tipo Jundiaí, em São Paulo. Visitei cidades que tinham 28 habitantes, são lugares de cultura mais bucólicos, provincianos e rurais. Depois de um tempo nesse caminho, você acaba até se sentindo meio mal quando entra em cidade grande, é um turismo que você percebe que é tóxico, feio, agitado, psicótico de uma certa forma.
A maioria das pessoas viajam sozinhas. O peregrino costuma acordar bem cedo, às vezes antes do sol nascer, e passa o dia caminhando. Chega no ponto de parada, dorme e caminha mais no dia seguinte. Você usa esse caminhar como um processo de pensar, conversar consigo mesmo. E aí, quando você chega nos lugares de parada, conversa com as pessoas, conhece gente do mundo todo, divide experiências. Caminhei com gente que estava já na décima vez fazendo esse caminho, conheci uma mulher belga de 91 anos que andava quilômetros a fio, tranquilamente. Caminhei com uma japonesa que fazia em homenagem ao seu marido falecido e fez 40km em um só dia. Vi cadeirantes fazendo também. É um sentimento de colaboração e solidariedade que não existe, todos querem te ajudar de alguma forma.
Eu estava fazendo 50 anos, não me preparei muito, decidi 2 meses antes de ir. Eu comprei uma passagem de avião, uma mochila e uma bota, nem sabia onde ia dormir. Eu fui na experiência de não ter planos, no desconhecido, de não saber onde eu ia estar no dia seguinte. E isso foi uma riqueza infinita pra mim, porque na vida da sociedade moderna, tudo é muito planejado, você tem que se planejar, ver o que vc vai fazer no ano seguinte, seu plano de carreira, de férias. E uma das coisas que percebi é que entrar no desconhecido e estar fragilizado nisso era uma força e eu precisava disso.
Quando eu cheguei lá, desci de um ônibus, tava chovendo, coloquei uma jaqueta e já sai andando até os pirineus (uma cadeia montanhosa), só parei quando cheguei no albergue onde dormi aquela noite.
No albergue é legal porque sempre tem uma confraternização. E aí me perguntaram o que trouxe cada um pro Caminho de Santiago. E a minha resposta, que foi de mais da metade também, foi “eu ainda nao sei”. Então é uma coisa que até faz parte do espírito do caminho. Hoje enxergo melhor, mas não era claro pra mim quando eu estava lá. E aí você percebe que tinham coisas que você não sabia, que eram um chamado interno, e de repente você consegue enxergar.
Sempre fui do mercado financeiro, da lógica, do planejamento, e eu precisava jogar fora tudo isso, viver uma vida onde nem tudo é racional, ouvir mais o coração. Eu achava que eu precisava me reenergizar, sair da rotina, despertar uma consciência sem as distrações hiperativas de uma viagem repleta de roteiros milimetricamente planejados.
É um processo de transcendência, você ri sozinho, chora bastante, é um caminho interno muito profundo. Você tem que confiar no universo, e ele joga a favor, não adianta se desesperar quando você está sozinho, até porque não se tem nem pra quem reclamar, então você engole a reclamação e isso te dá muita força.
Há, evidentemente, as dificuldades físicas e psicológicas. Eu não tive muita dificuldade física porque pratico bastante esporte, mas é comum as pessoas todas terem bolhas no pé. Terminei o caminho em 23 dias, o normal é terminar em 30, 31. Mas o maior problema é o psicológico, estar longe da família, amigos, caminhando e se punindo por questões do passado, é uma limpeza que se faz em um processo de silêncio e autoconhecimento muito difícil e doloroso, mas necessário. Fazer isso por um dia ou dois é difícil, mas por 30 dias… Na primeira semana ou nos primeiros 10 dias, você enfrenta uma fase de provação psicológica.
Mas eu falo para todo mundo: não dá pra morrer sem fazer. Ainda pretendo fazer várias vezes, hoje eu olho penso que o Caminho de Santiago é uma experiência inesquecível, mas existem ainda muitos outros que eu quero fazer. Eu não gostaria de dizer o que eu recomendo ou não, isso faz parte da humildade que conquistei, não me vejo na posição de ensinar alguém, porque são experiências pessoais, completamente individuais e intransferíveis. Um pouco do aprendizado é saber que os planejamentos muitas vezes podem dar errado, como tudo na vida. E acredite: caminho te impacta aos poucos, até hoje estou assimilando ou sendo impactado com coisas que não tinha percebido até então. É muito forte”
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