Para Inspirar

Lorrane Silva em “Do tamanho do seu sonho”

Na quinta temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir, a humorista "Pequena Lo" conta como fez do riso um remédio

20 de Junho de 2021


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

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Pequena Lo: Eu cresci recebendo olhares de curiosidade. Eu lembro de uma vez em que eu tinha uns 10 anos e estava no shopping com a minha mãe. Um homem ficou me encarando tanto, que andou sem olhar pra frente e acabou batendo a cara numa porta. Eu dei risada. Nessas situações, a minha mãe procurava contornar a situação. Ela falava: “Deixa isso pra lá, a pessoa ficou olhando porque não tá acostumada”. Ela sempre me incentivava a sair de casa e não me importar com o julgamento alheio. Ela dizia que a minha limitação física não deveria ser um impedimento pra eu fazer tudo que eu tinha vontade de fazer.


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Geyze Diniz: Psicóloga e humorista, Lorrane Silva, mais conhecida como Pequena Lo, a menina de Araxá, aos 25 anos, é um fenômeno da internet com mais de 8 milhões de seguidores nas redes sociais. Mas é no dia a dia que a Pequena Lo mostra toda a sua irreverência e alegria de viver. Lo nasceu com os membros curtos, por causa de uma doença rara, mas com o apoio dos pais, entendeu que isso não era impeditivo pra levar uma vida normal. 


Conheça a história bem-humorada e cheia de lições de vida da Pequena Lo. Ouça, no final do episódio, as reflexões do rabino Michel Schlesinger para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se. 


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Pequena Lo: Quando eu ainda estava na barriga da minha mãe, o ultrassom mostrou que eu teria os membros curtos. Os médicos não deram um diagnóstico, mas avisaram que eu não cresceria como as outras pessoas. Já fiz exames genéticos e os resultados foram analisados até fora do Brasil, mas nunca deram um nome pra minha condição. Eu só sei que tenho uma doença rara. E sou a única na minha família.


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A minha infância em Araxá, Minas Gerais, foi marcada por fisioterapia, exames, terapia ocupacional. A primeira operação foi aos 7 anos. Eu me recordo da tensão do centro cirúrgico, de passar mal por causa da anestesia geral, do incômodo do pós-operatório. A cirurgia que eu mais me lembro foi a última, aos 11 anos, pra colocar um pino no quadril e na sequência outro no joelho. Eu passei 75 dias deitada numa maca, engessada do peito pra baixo. Mas, por incrível que pareça, eu não guardei esse período na memória como uma época ruim. Todos os dias, meus primos iam em casa me visitar. A gente brincava na maca mesmo e eles faziam de tudo pra me entreter. 


Eu tive uma infância muito boa. Corri e brinquei como qualquer outra criança até os 11 anos, quando eu fiz essa operação. Desde então, eu ando de muletas. Achei que a adaptação ia ser difícil, mas tirei de letra. Em pouco tempo já estava subindo e descendo escadas.


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Meus pais nunca me trataram como coitadinha, e a minha condição física não me impediu de levar uma vida normal. Sou muito comunicativa e faço amizade fácil. Eu tinha muitos amigos na escola, e eles me aceitaram como eu era. Sempre fui a palhaça da turma. Uma vez, eu tinha uns 15 anos e estava numa roda com amigos, um deles pediu: “Lorrane, imita o fulano dançando”. Eu imitei, eles morreram de rir. Pediram pra eu imitar outro. Acabou que eu imitei todo mundo. Nunca fiz aula de teatro, mas eu sou observadora, percebo as caras e bocas, os movimentos das mãos, o jeito de falar. Em 5 minutos, pego os trejeitos de uma pessoa. É algo natural pra mim.


Eu nasci com talento pra fazer humor. E tive um bom professor: meu pai. Ele é dessas pessoas engraçadas, que fazem piada em qualquer rodinha. Eu sou assim também. Desde criança, gostava de chamar atenção. Tem vídeo meu fazendo palhaçada nas minhas festas de aniversário e o pessoal rindo. Eu lembro que, quanto mais os outros riam, mais eu queria fazer graça. Quando eu tinha 12 anos, os meus livros preferidos eram de piada. Eu lia e decorava, pra contar depois. Virou até rotina nas festas da minha família. Tinha uma hora em que meus pais, meus tios, meus primos faziam uma roda e eu ficava no meio contando piada, interpretando os personagens. Era tipo um stand-up. O povo adorava e eu mais ainda.


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Me formei no colégio, passei no vestibular de psicologia e fui morar com amigas em Uberaba. Na república, a gente dividia as tarefas domésticas. Eu aprendi muita coisa que eu não fazia, tipo lavar louça, varrer e passar pano. Cansava um pouco coordenar os movimentos do rodo e da vassoura com a muleta, mas pra mim era tudo novidade. Eu achei o máximo.


Eu curti demais a minha vida universitária. Adoro balada e lembro da primeira festa que eu fui na faculdade. Eu estava com um triciclo que eu uso pra me locomover às vezes e chamei a atenção. Os estudantes não estavam acostumados a ver pessoas com deficiência e ficaram impactados com a cena. Mas eu acho que em pouco tempo eles se acostumaram.


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Desde que eu comecei a andar de muleta e cadeira de rodas, eu recebo muitos olhares. Tem olhar de dó e tem olhar de curiosidade, que é a maioria. 


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Embora normalmente eu lide bem, às vezes machuca. No último ano da faculdade, fui fazer estágio em uma clínica de psicologia. Um dia, cheguei com muita pressa, porque tava dando o meu horário e eu tinha hora marcada com uma paciente. Como eu tava de muleta, a minha altura, de 1 metro e 30, fica bem evidente. Aí eu tô chegando de jaleco, uma senhora vem na minha direção e fala, com voz de bebê:

“Tá procurando a mamãe?”


Aí eu olhei pro lado, pra trás e pensei: “Essa mulher tá falando comigo? Não é possível”.


Eu respondi: “Desculpa, mas a senhora está enganada”.


Aí ela falou assim: “Nossa, tão fofinha! Que bonitinha!”.

 

Eu agradeci e disse: “Acho que a senhora tá confundindo, porque eu sou psicóloga, eu vim atender minha paciente”. 


Ela ficou MUITO sem graça na hora e falou: “Nossa, menina! Eu tô muito atrasada”, e saiu correndo.


Não é raro que, pela minha condição física, algumas pessoas me tratem como se eu não fosse tão capaz em alguma coisa, falando no diminutivo ou, nesse caso, como se eu fosse uma criancinha. Eu sei que a mulher não fez por maldade, ela realmente se confundiu. Esse tipo de situação eu levo pro humor e dou risada. Mas, tem episódios de preconceito escancarado. 


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Teve um que marcou e é uma situação comum pra pessoas com deficiência. Há uns anos, eu fui com a minha mãe a uma loja de roupas em Uberaba, onde a gente morava. Quando a vendedora chegou pra atender, ela só olhou pra minha mãe e perguntou: “Posso te ajudar?” Eu estava do lado. A minha mãe respondeu: “Pode, sim, mas quem vai comprar é ela, então, você pode perguntar pra ela que ela vai saber te informar direitinho o que ela quer”. A moça ficou muito sem graça durante toda a venda. Eu fiquei nervosa na hora, me senti inferiorizada, mas não falei nada. Depois eu refleti que talvez ela não tenha recebido um treinamento adequado.


Teve outra vez que eu estava saindo de uma balada com os meus amigos, na época da faculdade. Era madrugada, estava caindo uma tempestade fortíssima. Um amigo conseguiu um táxi, mas, quando o taxista viu o meu triciclo, recusou a corrida. A minha moto desmonta facilmente, ela é feita pra caber no carro. O cara negou por preconceito mesmo. Nesse dia eu fiquei muito chateada.


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Atualmente, esse tipo de situação não acontece tanto, porque eu me tornei uma figura pública. Por incentivo de um primo publicitário, criei um canal no Youtube pra compartilhar as piadas e as imitações que eu fazia. Eu gravava com uma câmera que eu tinha em casa e ele editava. 


A coisa começou a crescer no fim de 2018 e explodiu com um vídeo que viralizou em 2020. Eu precisei ficar famosa pra ganhar respeito. Isso me incomoda, porque todo mundo merece um bom tratamento. 


[trilha sonora]


No meu trabalho na internet, eu quero, além de levar humor, combater o capacitismo, que é o preconceito de considerar uma pessoa com deficiência incapaz ou inferior. Eu encontrei uma maneira de transmitir uma mensagem de representatividade sem um tom professoral, sem dizer “o preconceito é isso ou aquilo”. O meu jeito de falar sobre esse assunto é mostrar com humor episódios cotidianos que acontecem com qualquer pessoa, independente da condição física. 


O preconceito sempre existiu e sempre vai existir. Mas nesses meus anos na internet, eu já notei uma mudança enorme na postura dos meus seguidores. No começo, eu era conhecida como “aquela que anda de muleta”. Hoje, me conhecem pelo meu humor, não pela minha condição física. 


Eu sinto que eu tenho uma influência grande na vida de muita gente. Esses dias, recebi uma mensagem da mãe de um cadeirante de 9 anos. Ela diz que, quando ele me assiste, vê que vai poder fazer o que quiser quando ficar mais velho. Eu acredito que o meu conteúdo ajuda os deficientes, ajuda os pais deles, que ficam meio perdidos, e ajuda gente que não tem nenhuma deficiência a entender que todos nós somos diferentes uns dos outros. 


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Muitas pessoas me perguntam se eu usei o humor pra superar a minha deficiência. Eu respondo que não. Eu nasci com uma condição física e, ao mesmo tempo, nasci com um talento pro humor. Eu desenvolvi esse dom desde criança e por isso ele ficou tão forte em mim. Mas eu não usei esse talento pra superar nada. A minha doença rara faz parte de mim e nunca vai mudar. Eu aprendi a lidar com ela. É claro que o humor ajuda a encarar as adversidades com mais leveza. Só que  isso vale pra qualquer pessoa. A vida de todo mundo é marcada por uma sucessão de problemas. Acaba um, começa outro. Rir e fazer uma pessoa sorrir é um remédio contra todos os males e uma terapia pra ser mais feliz. 


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Miguel Schlesinger: A história da Lorrane nos remete à beleza da diversidade. Não existe no Universo dois seres humanos idênticos. Nem os gêmeos univitelinos são iguais, porque cada um tem a sua criatividade, a sua energia, a sua inteligência, a sua sensibilidade. Mas a sociedade convencionou que algumas diferenças são impressionantes e outras não. Eu tenho miopia, astigmatismo e daltonismo. Só na visão são 3 dificuldades. Mas por algum motivo, elas não são consideradas um tabu social. Não faz sentido incluir alguns desafios como parte do nosso cenário e outros não. 


A história da Pequena Lo também nos fala sobre a importância do humor, que está conectado ao tema da diversidade. A capacidade de rir da gente mesmo, é uma ferramenta para enfrentar as adversidades que todo mundo tem. Quando a gente se leva a sério demais, começa a acreditar que existe um certo e um errado, um padrão e um fora do padrão. Na verdade, existe a beleza na diversidade, e o desafio da gente aprender todos os dias com a diferença. 


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Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


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Solidão: como ela pode afetar o nosso cérebro?

Parece pouco, mas a verdade é que os efeitos de estar sozinho contra a nossa vontade são muitos e afetam o nosso principal órgão, que é o cérebro.

27 de Maio de 2022


Solidão. Quem já se sentiu completamente sem ninguém, ainda que por um breve momento, sabe como a sensação pode ser aterradora. Esse problema, já há algum tempo, é tão sério que deixou de ser algo individualizado e se tornou pauta de saúde pública. Em países como Inglaterra e Japão, existe um ministério para tratar da solidão de seus cidadãos, principalmente os mais velhos. Os ingleses se tornaram os pioneiros nesse combate ao verem 15% de sua população acometida pelo chamado isolamento social involuntário.


Mas o fato de estar sozinho é tão grave assim? Estudos apontam que sim. Ficar sozinho por muito tempo aumenta a liberação do cortisol pelo cérebro, o chamado “hormônio do estresse”. E os efeitos são semelhantes ao de estar estressado: maior probabilidade de desenvolver doenças cardiovasculares, diminuição da imunidade e surgimento de sintomas de depressão e ansiedade.


A solidão atinge o córtex pré-frontal, região responsável pela tomada de decisões. E, portanto, ela também pode prejudicar o sono, a alimentação e gerar maior propensão ao abuso de substâncias. Nessa reportagem da emissora alemã DW, podemos ver que a solidão impacta mais a qualidade e a expectativa de vida do que vilões tradicionais como o alcoolismo e a obesidade.


Ela mostra também um experimento em que pessoas foram submetidas a uma dinâmica semelhante a uma entrevista de emprego. Aquelas que tinham mais suporte de algum grupo, seja de amigos ou familiares, apresentaram menores níveis de cortisol. Quanto menor essa integração, maiores os níveis do hormônio. E eles não decaem ao longo do dia, mantendo uma sensação de estresse.


A história da solidão


O ser humano provavelmente teve sua sobrevivência atrelada à formação de comunidades. Viver em grupo facilitava a caça e a defesa, além da reprodução. Como resquício dessa época, sentir-se sozinho hoje dá uma sensação de desamparo, da ausência de ter alguém com quem contar. Como te contamos neste artigo, ter amigos é essencial, mas é preciso antes de mais nada, valorizar os bons, e não somente a quantidade.


Em seu TED Talk, Ana Paula Carvalho, mestre em psiquiatria pela Unifesp, conta a história da cidade de Roseto, na Pensilvânia, EUA. As pessoas de lá viviam como se fosse uma verdadeira comunidade: diversas gerações de uma família moravam na mesma casa, as portas estavam sempre abertas para a vizinhança, etc. E, surpreendentemente, não havia nenhuma morte por ataque cardíaco na faixa etária de 55 a 65 anos, por mais que o consumo de álcool e tabaco fosse elevado.


Ana Paula pontua também que o advento das redes sociais e aparelhos celulares não diminuiu a solidão. Por mais que tais ferramentas pareçam aproximar as pessoas, estamos ficando muito focados nelas em vez de olhar para as pessoas e coisas reais que acontecem ao nosso redor. Para ela, o que devemos fazer é razoavelmente simples: dar mais atenção aqueles que estão ao nosso redor.


“Uma a cada quatro pessoas não têm com quem contar. Coincidentemente ou não, uma a cada quatro pessoas desenvolve algum transtorno psiquiátrico. Então a mensagem é: se conheçam, olhem nos olhos das pessoas que estão perto de você. Não precisa ser um amigo próximo, pode ser até mesmo o porteiro do prédio”, diz.


Mas qualquer momento solitário pode acarretar em todos esses malefícios? A resposta é não. Existe, cada vez mais, uma divisão maior entre solidão e solitude, como te explicamos aqui, sendo, o segundo, o ato de estar sozinho e bem consigo mesmo. Estar separado do mundo às vezes é bom.

Por mais sociais que sejamos, ainda é possível cansar de tanto interagir com outras pessoas. Ter um momento para si é importante, ajuda a focar no próprio bem-estar e “tirar uma folga” do resto do mundo, até porque, já sabemos que mesmo o silêncio também traz inúmeros benefícios.


O problema em si começa quando há essa sensação de desamparo ou de abandono, tão características da solidão, com efeitos, inclusive, na psique e no cérebro. E isso pode acontecer, inclusive, mesmo ao redor de outras pessoas. O importante é sempre ter alguém com quem contar!

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