Para Inspirar

Por que escutamos música e como usá-la a nosso favor?

Os seres humanos são animais que, dentre seus vários hábitos, ouvem música. A combinação de sons é uma unanimidade e tem benefícios para além do lazer.

21 de Agosto de 2023


Colocar um fone e viajar pelos sons: poucas coisas são tão satisfatórias quanto isso. Não por acaso, há inúmeros benefícios envolvidos nessa prática, como te contamos aqui, e também inúmeras opções de bandas, fones e plataformas de áudios. A indústria dos shows, aliás, é uma das que mais cresce nos últimos anos.

Mas, se olharmos ao redor para as outras espécies, percebemos que somos a única que ouvimos música com frequência, uma atividade diária e que envolve uma série de terminações cerebrais. Por que fazemos isso? Quais são os ganhos dessa prática que podemos usar ao nosso favor? É isso que investigaremos a seguir!

As primeiras notas

Ouvimos música sem nem nos darmos conta. Ela está por toda parte e nem sempre escolhemos o que vamos ouvir, uma simples propaganda já entra em nossos ouvidos sem que a gente perceba. Elas são divididas em gêneros musicais, em estilos e até usadas para determinados momentos específicos: a música para malhar é diferente da música para relaxar. 

Com base no achado de flautas de ossos feitas há 53 mil anos pelos neandertais, como explica este artigo da revista Superinteressante, pesquisadores estimam que a atividade musical deve ter pelo menos 200 mil anos – contra 100 mil anos de vida do Homo sapiens. Ou seja: a música é mais antiga do que o ser humano como nós conhecemos atualmente, e mesmo em tempos de sobrevivência suprema, ela já existia.

Apesar de já se conhecer os seus benefícios, não há ainda um porquê definido para o nascimento das canções. De cientistas a filósofos, todos já buscaram suas próprias hipóteses e ninguém conseguiu cravar uma resposta definitiva. Boa parte dos indícios apontam para uma perspectiva evolutiva e biológica. 

Até mesmo o pai da teoria evolutiva Charles Darwin, já passeava pelo assunto. Para ele, a música era determinante para a escolha de parceiros sexuais. Isso porque, segundo sua teoria, as fêmeas seriam atraídas pelos melhores cantores. Essa teoria explica o comportamento sexual de jovens e até rituais de acasalamento antigos.

Há ainda uma outra hipótese, de que a música tinha papel mediador, amenizando conflitos, fortalecendo comunidades, ampliando canais de comunicação e ajudando a organizar e reconhecer as emoções. E o mais interessante é que nós fomos, muito provavelmente, os primeiros instrumentos. 

Ainda segundo o artigo da Superinteressante, o cientista cognitivo William Benzon, autor do livro Beethoven’s Anvil (“A Bigorna de Beethoven”, sem tradução para o português) especula que tudo começou com a nossa voz imitando o som de outros animais. Isso era feito até mesmo visando a proteção, pois, ao emitir um som ameaçador como o rugido, você afastaria outros animais. 

O som dos nossos passos também pode ter influenciado nessa percepção musical. Segundo o expert musical Michael Spitzer, em vídeo para o portal Big Think, da mesma forma que o som dos animais nos situam no espaço e nos dão indício de seu posicionamento, como o canto dos pássaros ou o deslocamento de uma baleia, os nossos passos têm a mesma função - para nós e outros animais. 

E o que são as notas se não um passo para o outro? A lógica é a mesma: o som de um deslocamento. Nossos ancestrais conseguiram enxergar um padrão nas próprias passadas, o que lhes dava senso de tempo. A gente consegue se situar no mundo através do som dos nossos próprios passos.

Solta o som, DJ

Música e linguagem caminham juntas, e é isso que torna tão difícil cravar quem veio primeiro. Basta observar um bebê, que pode balbuciar sons ritmados antes mesmo de falar mamãe. Mas, não seria essa uma forma de linguagem? Sim, afinal, as duas exigem esforços cerebrais da mesma natureza.

Mas, a música consegue ir além das palavras, não só de forma poética, mas se tratando de mecanismos cerebrais. A ativação que se dá em diferentes estruturas desse nosso órgão tão complexo é potente e profunda, e nos ajuda desde a focar mais em um estudo, até a elaborar melhor um sentimento. 

Há um link muito específico entre o som e os movimentos que torna nossa relação com a melodia diferente de outros animais. Por isso que, para Spitzer, usar a música como uma mera distração é um desperdício. “A música pode unir pessoas e combater a solidão. E você nem precisa ativamente fazer música junto com alguém, apenas ouvi-la já pode plugá-lo em uma rede social de pessoas, porque cada nota musical é formada por convenções sociais”, reflete em vídeo. 

A música, continua ele: 

  • reduz o estresse porque reduz os níveis do hormônio cortisol; 

  • te dá prazer e te traz felicidade inundando o seu cérebro com dopamina; 

  • é um excelente modo de trabalhar a memória, seja criando novas recordações com uma música ou relembrando antigas; 

  • expressa suas emoções mais profundas e te ajuda com autoconhecimento e formação de identidade;

  • é um atalho para o mindfulness, para a contemplação e até para a meditação; 

  • melhora a sua saúde mental pela junção de todos os fatores mencionados anteriormente;


“Não é só puramente relaxar porque há muito acontecendo ao mesmo tempo, e a palavra relaxamento traz uma ideia de passividade, enquanto ouvir é uma atividade muito ativa e criativa”, diz ele. 

O fato de imitarmos sons trabalha o nosso neurônio espelho. Esse mesmo neurônio é trabalhado quando ouvimos uma canção, seja ela feliz ou triste, e ela ativa automaticamente esses sentimentos. E, sentimentos, como já apontava Darwin, não são levianos, mas estão relacionados aos objetivos que nos fizeram sobreviver. 

Ficamos felizes quando alcançamos uma meta, com medo quando estamos em perigo, irritados quando algo foge ao nosso controle, tristes quando perdemos alguém: tudo isso, um dia, estava intimamente ligado à nossa sobrevivência. A música é muito parecida com tudo isso e mexe também com nossos sentimentos. 

É por isso que somos tão conectados a ela, pois ela suscita nossas mais profundas e complexas emoções sem nos deixar em perigo e ainda nos trazendo benefícios. E essa é, enfim, a resposta da pergunta que fizemos no começo deste artigo. É por isso que o ser humano é tão musical. 

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Para Inspirar

O que é riqueza, afinal?

Para mim, para você, para o planeta: o conceito de riqueza varia em cada indivíduo, mas segue alguns padrões em qualquer lugar do mundo

21 de Outubro de 2020


“Quando eu falo de riqueza, não é o dinheiro pelo dinheiro, não é o poder pelo poder. É o poder pela possibilidade de transformar.” Essa frase tão potente foi dita por uma figura tão potente quanto: Celso Athayde, personagem do último episódio da segunda temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir.

A partir dessa provocação, dúvidas inquietantes pairavam no ar: o que é riqueza, afinal? Por que há diferentes concepções de um mesmo conceito? Como ela se manifesta em diferentes culturas? Há algum símbolo em comum que categorize uma pessoa rica em qualquer lugar do mundo?

Para a economia, sociologia e antropologia, e para a cultura, a riqueza pode de fato atravessar diferentes explicações e métricas. Mas uma coisa pode ser dita em comum: ela é um símbolo social capaz de incluir e excluir na mesma medida.

Código da riqueza

Imagine um carro considerado “de última geração”. Conversível ou com teto solar, SUV ou rebaixado, preto ou vermelho: não importa o seu modelo, você saberá que ele é um carro “de rico” assim que bater os olhos. E por que será que isso acontece? A semiótica pode ser uma das primeiras explicações.

Em linhas gerais, a semiótica é o estudo dos signos, ou seja, dos elementos que nos cercam e o que eles significam. Parte-se do princípio de que verbal ou não, todos esses elementos possuem um significado para o ser humano, ainda que inconsciente, pois nossa espécie atribui essa interpretação a tudo que nos cerca.

Um exemplo prático disso é justamente o carro mencionado. Ele não é somente um veículo qualquer, pois traz consigo a ideia de velocidade, de deslocamento, de modernidade - e, porque não, de riqueza. Ele poderia ser só uma lata sobre 4 rodas, mas nenhum objeto é somente um objeto, pois vem sempre carregado de sentidos e significados.

E é a partir de todos esses códigos que temos os considerados “artigos de luxo”. Os “códigos da riqueza” são compostos por vários desses artigos, e são eles quem vão definir ou não se você está apto a fazer parte dessa casta. São objetos, mas também são locais que se frequentam, empregados que se possuem e maneiras de se portar.

Mais do que simples mercadorias, eles são representações desse universo que é feito, sobretudo, de acessos, palavra-chave que nos guiará para o próximo entendimento do que é riqueza. “Um dos pilares de entendimento para a Antropologia é a de que a riqueza é medida por um sistema de exclusões” explica a antropóloga e comunicóloga Valéria Brandini, especialista em ciências do consumo.

E, aqui, é necessário voltar duas casas. Não se trata somente de possuir os artigos de luxo mencionados ou não. Acesso é um conceito que pode englobar um universo de coisas. “No Brasil, uma pessoa que tem acesso, tem primeiramente acesso à alimentação, saúde e segurança. Você imagina o que é o contrário disso?” provoca Valéria.

Portanto, além da semiótica, temos a segunda possível explicação para a questão da riqueza: pode-se afirmar que, quanto mais acesso o indivíduo possuir, maior o seu nível de riqueza. “E esses acessos, em um país de tamanho continental e desigualdade social igualmente gigante, podem variar de serviços básicos a luxos inimagináveis. O rico, por aqui, pode ainda ter acesso a brechas da lei, por exemplo, que não se vê em outros países” comenta a antropóloga.

A mercadoria que não se vende

“A Sociologia entende por riqueza a capacidade de produzir e acumular algum tipo de recurso que tenha valor para uma cultura específica. Isso pode ser dinheiro, mas não apenas isso. Pode ser a capacidade de doar ou doar-se a alguém, a honra, o conhecimento, entre outros” explica o sociólogo e professor Liráucio Girardi.

“Esses recursos, para o sociólogo Bourdieu, podem ser culturais, sociais, simbólicos e econômicos. E podem ainda variar entre as culturas e, historicamente, dentro de uma própria sociedade” continua. “A própria Floresta Amazônica abriga um tipo de riqueza, a maior do nosso século, que é a sua imensa riqueza em biodiversidade riqueza do século XXI” diz.

Perceba então que riqueza pode ainda abrigar conceitos mais subjetivos do que somente artigo de luxo e acessos.“Existe um lugar chamado Ilhas Trobriand no Pacífico Sul, onde a pessoa mais rica é aquela que consegue oferecer mais pro outro, num processo chamado Kula. O mais rico é aquele que consegue doar o melhor presente, ou seja, a riqueza mora nessa troca. Quem oferece mais ao outro é o mais rico” explica a antropóloga Valéria.

A antropologia possui uma perspectiva de maior relativização do que é riqueza de acordo com o contexto cultural e como as pessoas percebem isso. “Você pode ir a um país do Oriente Médio onde não se vê muitos efeitos da globalização, e ter uma impressão até mesmo de um cotidiano mais tribal. Mas essas pessoas podem se acharem ricas, talvez não se sintam excluídos por sentirem que têm os acessos suficientes”.

Há um denominador em comum, contudo, que atravessa e diferencia todas essas definições: a cultura. “É a mesma coisa que higiene, o que é considerado higiênico em um país não é no outro. Esse padrão é cultural. Cada país vai desenvolver a sua mensuração de acordo com aquilo que confere qualidade de vida ao seu povo, e essa qualidade de vida num geral é mensurada na dinâmica de acessos que conversamos” explica.

O casamento da cultura e da riqueza

Não há como falar do segundo sem mencionar o primeiro. Mais do que mencionar, e preciso aprofundar-se no que é cultura. Ela, que ora caracteriza-se por ser um conjunto de hábitos sociais e religiosos que definem um determinado grupo de pessoas, e ora também pode significar manifestações artísticas e intelectuais produzidas por indivíduos.

“Existem três sistemas culturais estudados pela Antropologia: os sistemas culturais lato sensu , a alta cultura e o acesso ao conhecimento” menciona Valéria. Novamente retomando sociólogo Bourdieu, para ele o acesso à cultura constitui o chamado “hábitos de classe”.

“A pessoa pode nascer numa família com um determinado nível socioeconômico e ela pode virar um total rebelde e não querer nada com a alta cultura. Certamente, ela vai conseguir compreender determinadas estruturas culturais e históricas, porque ela teve acesso ao conhecimento, e a alta cultura se constrói a partir do conhecimento. Mas ela não terá justamente o hábito de classe” explica a antropóloga.

Cultura, portanto, não se compra. “Você pode comprar mil livros e não ler nenhum, porque a cultura é uma construção que vem de um investimento pessoal no conhecimento. Existem pessoas com riqueza econômica abundante, mas sem cultura, porque não tiveram uma disposição pessoal no conhecimento”.

O contrário também é verdadeiro. “A cultura é realmente uma riqueza, mas que depende em parte a criação que a pessoa foi submetida e exposta, mas também de um interesse pessoal.” É fato de que quanto maior a pobreza econômica, mais difícil o acesso - sim, novamente o acesso - pois os recursos pessoais são tão escassos, que devem ser voltados à sobrevivência.

Há duas formas de ler a cultura: ela pode ser um conjunto de normas de um povo ou pode ser a quantidade de estudo de um indivíduo. Ambas influenciam na concepção de riqueza.


É aí que entra a cultura não como manifestação artística ou de conhecimento, mas como uma norma que rege uma nação ou um grupo de pessoas que possuem a proximidade geográfica como denominador comum, pois estão todas concentradas em um mesmo lugar e reproduzindo os mesmos padrões.

“A pobreza gera um nível de necessidade e de exaustão de recursos que beira a animalidade” como descreve a antropóloga. Mas a riqueza, por sua vez, não garantirá ao indivíduo a alcunha de um ser culto. “Veja, há pessoas têm acesso e podem visitar outros países e enriquecer culturalmente, mas tudo que ela faz chegando lá é consumir somente bens e produtos, e não conhecimento. Não houve  o investimento pessoal. Enquanto isso, você tem poetas na periferia.”

Riqueza, cultura, poesia, periferia. Isso nos leva justamente a quem? Celso Athayde, empreendedor social mencionado no início desta reportagem. Um dos trabalhos fundamentais da CUFA, instituição fundada pelo mesmo, é levar cultura para as favelas, a cultura que pode ser consumida, produzida, reproduzida e, por fim, ser libertadora.

Isso porque, apesar de não ser um produto passível de ser comprada e depender de um investimento pessoal do sujeito, ela é capaz de abrir portas. Riqueza, portanto, para além da semiótica, dos acessos, dos artigos de luxo, dos países e suas concepções, é a predisposição a ter cultura e ser um ser cultural.

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