Para Inspirar
Parece pouco, mas a verdade é que os efeitos de estar sozinho contra a nossa vontade são muitos e afetam o nosso principal órgão, que é o cérebro.
27 de Maio de 2022
Solidão. Quem já se sentiu completamente sem ninguém, ainda que por um breve momento, sabe como a sensação pode ser aterradora. Esse problema, já há algum tempo, é tão sério que deixou de ser algo individualizado e se tornou pauta de saúde pública. Em países como Inglaterra e Japão, existe um ministério para tratar da solidão de seus cidadãos, principalmente os mais velhos. Os ingleses se tornaram os pioneiros nesse combate ao verem 15% de sua população acometida pelo chamado isolamento social involuntário.
Mas o fato de estar sozinho é tão grave assim? Estudos apontam que sim. Ficar sozinho por muito tempo aumenta a liberação do cortisol pelo cérebro, o chamado “hormônio do estresse”. E os efeitos são semelhantes ao de estar estressado: maior probabilidade de desenvolver doenças cardiovasculares, diminuição da imunidade e surgimento de sintomas de depressão e ansiedade.
A solidão atinge o córtex pré-frontal, região responsável pela tomada de decisões. E, portanto, ela também pode prejudicar o sono, a alimentação e gerar maior propensão ao abuso de substâncias. Nessa reportagem da emissora alemã DW, podemos ver que a solidão impacta mais a qualidade e a expectativa de vida do que vilões tradicionais como o alcoolismo e a obesidade.
Ela mostra também um experimento em que pessoas foram submetidas a uma dinâmica semelhante a uma entrevista de emprego. Aquelas que tinham mais suporte de algum grupo, seja de amigos ou familiares, apresentaram menores níveis de cortisol. Quanto menor essa integração, maiores os níveis do hormônio. E eles não decaem ao longo do dia, mantendo uma sensação de estresse.
A história da solidão
O ser humano provavelmente teve sua sobrevivência atrelada à formação de comunidades. Viver em grupo facilitava a caça e a defesa, além da reprodução. Como resquício dessa época, sentir-se sozinho hoje dá uma sensação de desamparo, da ausência de ter alguém com quem contar. Como te contamos neste artigo, ter amigos é essencial, mas é preciso antes de mais nada, valorizar os bons, e não somente a quantidade.
Em seu TED Talk, Ana Paula Carvalho, mestre em psiquiatria pela Unifesp, conta a história da cidade de Roseto, na Pensilvânia, EUA. As pessoas de lá viviam como se fosse uma verdadeira comunidade: diversas gerações de uma família moravam na mesma casa, as portas estavam sempre abertas para a vizinhança, etc. E, surpreendentemente, não havia nenhuma morte por ataque cardíaco na faixa etária de 55 a 65 anos, por mais que o consumo de álcool e tabaco fosse elevado.
Ana Paula pontua também que o advento das redes sociais e aparelhos celulares não diminuiu a solidão. Por mais que tais ferramentas pareçam aproximar as pessoas, estamos ficando muito focados nelas em vez de olhar para as pessoas e coisas reais que acontecem ao nosso redor. Para ela, o que devemos fazer é razoavelmente simples: dar mais atenção aqueles que estão ao nosso redor.
“Uma a cada quatro pessoas não têm com quem contar. Coincidentemente ou não, uma a cada quatro pessoas desenvolve algum transtorno psiquiátrico. Então a mensagem é: se conheçam, olhem nos olhos das pessoas que estão perto de você. Não precisa ser um amigo próximo, pode ser até mesmo o porteiro do prédio”, diz.
Mas qualquer momento solitário pode acarretar em todos esses malefícios? A resposta é não. Existe, cada vez mais, uma divisão maior entre solidão e solitude, como te explicamos aqui, sendo, o segundo, o ato de estar sozinho e bem consigo mesmo. Estar separado do mundo às vezes é bom.
Por mais sociais que sejamos, ainda é possível cansar de tanto interagir com outras pessoas. Ter um momento para si é importante, ajuda a focar no próprio bem-estar e “tirar uma folga” do resto do mundo, até porque, já sabemos que mesmo o silêncio também traz inúmeros benefícios.
O problema em si começa quando há essa sensação de desamparo ou de abandono, tão características da solidão, com efeitos, inclusive, na psique e no cérebro. E isso pode acontecer, inclusive, mesmo ao redor de outras pessoas. O importante é sempre ter alguém com quem contar!
Para Inspirar
Se o propósito é um desejo, logo, ele mora em nosso cérebro. Mas como esse órgão tão vital fica após um trauma?
13 de Dezembro de 2020
Conhecida por todos desde a infância, a apresentadora Angélica cresceu diante dos olhares da câmera e do público de todo o país. O que poucos sabem é que ela entrou para o mundo da televisão em uma tentativa de sua mãe para que ela se distraísse e superasse um grande trauma: ter visto seu pai ser baleado aos 6 anos de idade.
Essas e outras histórias de superação são narradas por ela no terceiro episódio do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir. Apesar de intensas, todas elas levaram Angélica a ser o que é hoje, uma mulher ainda mais cheia de ideais, com mais autocontrole e autoconhecimento e, sobretudo, em constante busca de sua melhor versão.
Sendo o propósito uma vertente do desejo - seja qual for a sua raiz - portanto, ele habita em nosso cérebro. Mas como esse órgão tão vital fica após sofrer um trauma de ordem emocional, e não física? Há alguma correlação entre ambos e, indo mais afundo, alguma mudança do que queríamos antes e depois de sofrer um trauma?
Sabemos que o cérebro é composto por milhares de neurônios que, diariamente, exercem conexões complexas e sensíveis, facilmente afetadas por fatores externos. Excesso de estresse, medo, amargura, ansiedade: tudo isso reflete não só no trabalho dessas pequenas conexões, como despejam uma alta carga de hormônios que estimulam a adrenalina, por exemplo.
Você pode imaginar que isso, a longo prazo, pode trazer malefícios imensos. Mas a curto prazo também. Imagine, por exemplo, o cérebro de uma criança - como foi a Angélica em seu primeiro episódio traumático. Como um dos órgãos mais essenciais de um corpo ainda em formação responderia à exposição de um grande trauma?
Se você respondeu mal, acertou. E isso não é achismo. Uma pesquisa publicada por Bruce D Perry, chefe de psiquiatria no Hospital para Crianças do Texas, revelou por meio de imagens de tomografias computadorizadas que o cérebro de uma criança de 3 anos que sofreu “negligência severa por privação sensorial” acaba sendo expressamente menor do que as de outras de mesma idade.
Além disso, ele apresenta ventrículos aumentados, atrofia cortical e diminuição do hipocampo, que apesar dos nomes científicos assustadores, significam em linhas gerais que essa criança poderá ter funções como a memória, atenção e o processamento de emoções afetados.
Um outro estudo de 2015, analisou crianças residentes em orfanatos na Romênia e não só constatou os mesmos fatos, como também observou que as 26 crianças observadas apresentavam menos massa branca cerebral, responsável por transportar a informação de maneira ágil no nosso cérebro. Elas também apresentavam mais dificuldade no processamento sensorial.
Nos adultos, as consequências também não são das melhores. Uma pesquisa desenvolvida pela UNIFESP comprovou que pacientes expostos a um trauma e depois vítimas de estresse pós-traumático apresentam redução de até 10% no córtex pré-frontal (a região responsável pela tomada de decisões, por exemplo) e também do hipocampo, como as crianças.
Sendo assim, os seus sintomas seriam os mesmos que dos pequenos: alteração na memória, concentração e processamento de emoções.
Um outro estudo
também aponta para uma piora até mesmo do sistema imunológico do indivíduo, além de uma perda de memória recente.
As pesquisas são sim sérias e um tanto assustadoras. Mas, como tudo na vida, há duas formas de se olhar um mesmo tema. O codiretor do Centro de Trauma, Resiliência e Crescimento da Universidade de Nottingham, Stephen Joseph, contou em sua coluna de jornal um experimento que conduziu com os sobreviventes do acidente com a balsa Herald Of Free, na Bélgica, que deixou 193 mortos em 1987.
De imediato, ele pôde observar danos psíquicos severos em todos eles, provenientes do estresse pós-traumático. Mas, 3 anos depois, em uma nova avaliação, apesar de alguns ainda apresentarem bastante dificuldade de retomar à realidade, muitos deles - inclusive esses com mais dificuldades - relataram mudanças positivas.
Essas mudanças todas apontavam para uma espécie de mudança de perspectiva em suas vidas. Ao serem questionados se suas visões sobre a vida mudaram depois do desastre de forma positiva ou negativa?" 43% afirmaram ter mudado para melhor, um número considerado alto e bastante otimista.
Para ele, que continuou estudando sobre o assunto e até lançou um livro a respeito da “nova psicologia pós-traumática”, o trauma pode fazer com que a pessoa reflita sobre temas como responsabilidade, compaixão e finitude, e que elas passam a olhar mais a si mesmas e ao seu redor.
Um outro autor, que é também psicólogo e neurocientista brasileiro, chamado Julio Peres, foi ainda mais a fundo nessa questão em seu livro “Trauma e Superação: o que a psicologia, a neurociência e a espiritualidade ensinam”.
Ao longo dos 15 capítulos da obra , ele não só disseca cientificamente os termos dados às doenças que acometem o traumatizado, como também como a personalidade do sujeito, o ambiente em que está inserido, sua resiliência e até a sua espiritualidade podem influenciar na “volta por cima”.
Essa linha de pensamento não ignora os efeitos negativos de um trauma, mas apenas busca olhar sob todos os ângulos. Um estudo feito com mais de 1300 adultos que presenciaram o 11 de setembro corrobora essa tese de que há um lado positivo no trauma.
Isso porque 60% dos entrevistados relataram benefícios principalmente atrelados às suas relações familiares e como elas mudaram para melhor. Há uma urgência latente em amar antes que seja tarde, em não ir dormir com desafetos - como reforça a primeira personagem da terceira temporada do Podcast Plenae, Veruska Boechat - de que o amanhã é agora.
Para Angélica, viver todos seu trauma de infância e os que se sucederam, foram os gatilhos que faltavam para que ela tomasse mais consciência de seu corpo, sua respiração, do milagre da vida e do seu porquê, que a faz levantar todos os dias. O que Stephen busca mostrar é que há engrandecimento por meio da dor, e isso vai muito além do que um exame laboratorial possa mapear. É um movimento interno demorado, custoso e exigente, mas muito valioso.
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