Para Inspirar

Adriana Barbosa em “Quem me vê não enxerga as mulheres que vieram antes de mim”

Ouça e leia o episódio da nona temporada do Podcast Plenae, conheça a história da empreendedora Adriana Barbosa, que em busca da sua própria identidade, ajudou milhares de outras pessoas.

11 de Setembro de 2022



Leia a transcrição completa do episódio abaixo:


Adriana Barbosa: Eu sinto que a minha família evitava falar sobre a questão racial, porque esse assunto de alguma forma trazia um certo sofrimento e até dor. Isso é compreensível paras três gerações de mulheres ao meu redor: minha bisavó, minha avó e minha mãe. Há 30, 40 anos atrás, as referências positivas de ser negro quase não existiam. Apesar de não ser fácil, hoje eu percebo que uma forma de lidar com esses preconceitos é falar sobre eles desde cedo.


[trilha sonora]


Geyze Diniz: Com apenas 22 anos ela criou uma feira para reunir empreendedores negros num dos bairros mais ricos e maioritariamente branco de São Paulo. Naquele momento ela  nem imaginava que tal mobilização iniciaria o maior evento de cultura negra na América Latina, a Feira Preta. Adriana Barbosa é uma empreendedora, sonhadora e acima de tudo fazedora. Reconhecida mundialmente por seu trabalho e impacto na sociedade, a menina de Barretos mostra para nós e para o mundo como podemos ser ferramenta de mudança no contexto que estamos inseridos mesmo com tantas adversidades. Conheça a história de força, inteligência, perseverança de Adriana Barbosa. 

Ouça no final do episódio as reflexões da Neurocientista Claudia Feitosa-Santana para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é  o podcast Plenae. Ouça e reconecte-se 

[trilha sonora]


Adriana Barbosa: Eu cresci em uma família de matriarcado. Fui educada por bisavó, por avó, por mãe e eu sou a quarta geração, minha filha é a quinta geração. Pensa em uma família só de mulheres. A Regina, minha mãe, me teve muito cedo, aos 20 anos de idade. Meu pai nem chegou a me registrar no cartório, mas as lembranças que eu tenho dele nos meus primeiros anos de vida são esporádicas, mas com memórias bastante afetivas. Um presente de aniversário, algumas visitas, nada muito contínuo. Na verdade, quem ia me buscar na escola ou participar das reuniões era minha mãe ou até minha avó, a dona Naidê. 


A minha avó nasceu em Barretos, no interior de São Paulo, se mudou pra capital junto com a minha bisa, a dona Maria Luiza, em busca de uma vida melhor. As duas foram morar num cortiço no bairro da Bela Vista, a região conhecida por Saracura. Para pagar as contas, elas trabalhavam como empregadas domésticas, uma profissão que até hoje é muito comum entre as mulheres negras. A liberdade é muito recente para a população preta. Minha tataravó, dona Teodora, essa pegou o tempo da escravidão na cidade de Barretos. 


[trilha sonora]


Para vocês terem uma ideia, a minha mãe chegou a morar com a minha avó na casa dos seus patrões até que uma das minhas tias sugeriu levar a minha mãe para morar com elas e ter uma vida melhor. Esse ciclo de distanciamento não era uma novidade na minha família. A mesma dinâmica aconteceu com a minha avó, com a minha mãe, com meu irmão Douglas, comigo. Só o meu irmão Rafael, o caçula, que conviveu mais tempo com a minha mãe. 


[trilha sonora]


Com o apoio dos patrões, o Junior e a Elisa, que também se tornaram meus padrinhos, minha avó comprou uma casa no bairro da Saúde, na zona sul de São Paulo. Fomos todos morar com ela: minha bisavó, minha mãe, e eu e meus irmãos. Depois, nos mudamos pra um sobrado bonito, com três quartos, na Praça da Árvore, um bairro bem classe média. Era uma casa confortável, mas bastante simples, em comparação com as outras que cercavam a gente. 


Minha bisavó ficava em casa, era responsável por todos nós. Mas como ela era bem idosa, eu que levava os meus irmãos pra escola e ajudava eles na lição. Enquanto eu equilibrava esses pratinhos, tinha que lidar com todo o fato de ser uma criança negra crescendo em um bairro onde a maioria era branca. 


Apesar de não ser um bairro periférico, eu me sentia à margem o tempo todo. Na minha classe, mesmo sendo uma escola pública, só tinha mais um negro. Quando o assunto era namoro, era como se eu só pudesse ser aceita por ele. Eu nunca era escolhida, por exemplo, para dançar. Sabe aquelas festinhas, aqueles bailinhos? Pois bem, tava eu lá com a vassoura. Não me lembro de ter recebido um correio elegante na festa, a não ser os trotes das minhas amigas. 


Enquanto isso, nas horas em que a grana apertava em casa, a minha bisavó via o que tinha na despensa e se virava. Se fosse farinha, fubá, ovo e óleo, fazia um bolo pra vender. Se tivesse frango, preparava coxinha. A sala e a garagem viraram um pequeno restaurante durante um período. Minha bisavó era semianalfabeta, mas tinha muito tino comercial. Eu herdei dela a veia empreendedora.


[trilha sonora]


Minha família, tanto materna quanto paterna, nunca foi militante. A gente não falava de racismo ou coisa do tipo. Eu não vim de um ambiente com letramento racial. O foco era sobreviver da melhor forma possível. Foi na escola que eu me descobri preta, quando os colegas de classe se referiam a mim como “aquela garota negra”. Sim, eu me descobri negra pelo apontamento do outro.


A minha timidez crônica e a minha sensação de pertencimento não me fizeram recuar quando chegou a minha vez de enfrentar o mundo. O meu lema sempre foi: “Tá com medo? Vai com medo mesmo”. Trabalhar era um movimento natural pra mim. Eu não lembro de nenhum momento sequer em que as mulheres ao meu redor não trabalhassem. Eu usei a capacidade intelectual que as minhas antepassadas haviam transmitido a mim como uma herança: a habilidade de transformar escassez em abundância.


[trilha sonora]


Eu comecei a trabalhar aos 15 anos, em uma fabriqueta de fundo de quintal que fazia biscuit, pintando peças de artesanato. Também fui vendedora de roupa e lingerie, até conseguir um emprego na Rádio Gazeta. Naquela época, nos anos 90, as emissoras incentivavam seus ouvintes a irem até um lugar específico pra ganhar um adesivo. Eu era a aquela pessoa que colava o adesivo no carro. E o locutor sempre dizia ao vivo: “Passa lá que a Crioulinda tá adesivando os carros”.


No começo, confesso, isso me incomodava a forma como ele me chamava, mas depois eu entendi a origem dessa expressão e passei a não esquentar mais a cabeça. Eu sei que o tom pode parecer um pouco estranho, mas eu escolhi não discutir. Até porque eu já sabia que a resposta seria algo como: “mas eu estou te elogiando, afinal tu é uma crioula linda”.


[trilha sonora]


O melhor desse período foi conhecer outras meninas negras que trabalhavam na emissora, eram meninas pretas como eu, como a Zeila e a Bombom. Na passagem da adolescência pra vida adulta, elas e outras amigas foram essenciais pra mim. Afinal, eram mulheres impulsionando outras mulheres.


Esse também foi o período em que eu comecei a curtir as baladas blacks. Eu me tornei frequentadora dos bailes de casas como Blen Blen, Mood, Balafon, Sambarylove, Clube da Cidade, Radial. A cultura foi a porta de entrada para que eu compreendesse melhor o que significava ser uma mulher preta. E, como acontece com muitos de nós no Brasil, as minhas referências norte-americanas eram fortes. Eu conheci a história dos Panteras Negras, a vida do Malcom X e os filmes críticos do cineasta Spike Lee. 


Comecei a frequentar reuniões do movimento negro organizado. No começo, eu fui até radical. Eu só falava e pensava na cultura preta.. Virou uma espécie de obsessão, mas precisava ser assim. Era o tempo do videocassete e tinha uma locadora bem na frente da minha casa. Quando a minha avó me via chegando, dizia: “Lá vem a Adriana de novo com esses filmes de preto”.


[trilha sonora]


A música era outra aliada. Eu ouvia muito rap, R&B, soul music. Escutar Run-DMC, Wu-Tang Clan e Public Enemy fazia com que eu me sentisse parte de algo maior. Todo esse contexto me ajudou a entender a luta pelos direitos civis da população negra nos Estados Unidos. Me deu também pistas de como tudo isso se reproduzia aqui.


Foi nessa época que eu me aproximei do meu pai. Ele e toda a minha família paterna é de sambistas. Meu pai é um dos fundadores do Grupo Mé Menor, e ele ajudou a construir a comunidade do Samba da Laje, uma das mais tradicionais do samba paulista. A reaproximação com o meu pai marcou também a minha aproximação com a cultura afro-brasileira.


[trilhas sonora]


O meu desejo de enfrentar limites me levou a pedir demissão da Gazeta. Eu acabei indo trabalhar na gravadora Trama, como parte da equipe do Tadeu Negreiros, um dos poucos negros que ocupava um cargo de liderança numa grande gravadora. Eu fiquei perto de artistas que eu amava, como Cláudio Zoli, Leci Brandão, Jairzinho, Wilson Simoninha e a Luciana Mello. Aquilo pra mim não era um trabalho, era a realização de um sonho, que ajudava a fortalecer a minha própria autoestima. Só que, depois de dois anos, eu fui demitida, e fiquei sem o meu sonho.


[trilha sonora]


No primeiro mês em casa, eu entrei em depressão. Foram aquelas minhas amigas que me ajudaram a lidar com aquele sentimento de frustração, decepção e autopiedade. Depois de sair do banzo, o meu primeiro passo foi separar roupas bacanas pra tentar vender nas ruas e feiras da cidade. Esse era o meu método de “sevirologia”, a arte de saber se virar. 


[trilha sonora]


Minha parceira de sevirologia era a Deise Moyses, que vendia pastel na feira. Dessa experiência eu comecei a idealizar a Feira Preta, um evento pra valorizar produtos e serviços de empreendedores negros. 


A primeira edição da Feira Preta aconteceu em 2002. Eu tinha só 22 anos. A Deise e eu escolhemos a Praça Benedito Calixto, em Pinheiros, por ser um lugar aberto, bonito e acessível. Já tinha ali uma cena de feiras e mercados alternativos. Além disso, muitos jovens negros frequentavam o bairro pra ouvir música. Tinha também os negros da cadeia de produção das baladas, como DJs, hostesses, gente que trabalhava em bilheteria, chapelaria, técnico de som e de luz.


No dia da feira, eu pendurei faixas nas ruas pra sinalizar o local, ajudei a montar as barracas e varri o chão. Junto comigo estavam minha avó, meu avô, minha mãe, meus irmãos. Eu tinha medo que ninguém aparecesse e fiquei plantada em pé, na esquina da rua Teodoro Sampaio, olhando em direção à saída do metrô Clínicas. Até que eu comecei a ver mulheres, homens e crianças com tranças, black power e cabelos alisados. Gente com pele mais clara, gente com pele mais retinta, eita que era gente de tudo quanto era jeito. Sete mil pessoas parecidas comigo lotaram a praça, numa das regiões mais ricas e brancas de São Paulo. Foi ali que o sonho começou a se tornar realidade.


[trilha sonora]


A Feira Preta passou a ser realizada anualmente. Mesmo com muitos percalços, ela se transformou no maior evento de cultura e empreendedorismo negro da América Latina. Tem de tudo um pouco, de venda de roupas, acessórios, artesanatos, música, bate-papo, palestra, brinquedoteca, espaço saúde e bem-estar, eita que é muita coisa. A Feira Preta deixou de ser um evento de um único dia pra se transformar num festival com uma programação extensa, com atividades que ocorrem até fora da cidade de São Paulo.


[trilha sonora]


Hoje vivo de propósito, pode até soar estranho isso que eu to falando, mas é no sentido de trabalhar com aquilo que eu acredito e ser remunerada pra isso. A maioria das pessoas no Brasil não tem essa oportunidade. O meu propósito hoje é trazer equidade e processos mais equânimes pra população negra no Brasil. Nos últimos 30 anos, a gente avançou, mas ainda tem muito pra avançar. À medida que a população negra ascende, mais o racismo aparece. Com tudo que eu já fiz, se eu tivesse condições mais favoráveis, eu hoje seria rica. Mas eu sou uma mulher negra, e mulher negra no Brasil tá na base da pirâmide social e econômica. As mulheres negras são as que mais estudam, as que mais estão dentro do mercado de trabalho informal, as que mais empreendem, mas ainda estão na base da pirâmide. Por que? Eu sempre me faço essa pergunta. Por que? Por que ainda tem tanta diferença, se nós contribuímos tanto para o desenvolvimento desse país? 


Em 2021, a Feira Preta chegou na sua 19ª edição. A menina que eu fui não vislumbrava ser a mulher à frente de um empreendimento social que já recebeu mais de 200 mil pessoas. Mas ela é. O impacto da Feira é muito maior do que o esperado por mim e pela minha parceira em 2002. E aí é que está: tem coisas que simplesmente precisam existir. Eu me vejo como uma interlocutora, uma fazedora, alguém que, com o tempo, a coragem e muitos tombos, topou desbravar um campo frutífero ao lado de outras pessoas. 


Quem me vê hoje não enxerga todas as mulheres que vieram antes de mim e sustentaram a minha caminhada até aqui. Eu chamava a minha avó de sócia, porque a aposentadoria dela foi a grande financiadora da Feira Preta no início. A minha vó me ajudava até pagar a passagem de ônibus. A minha mãe, eita, que essa pagou muita coisa também. A forma como tomo decisões, como insisto naquilo em que acredito, como crio, ou até como busco soluções e até mesmo a minha mania de ser forte o tempo todo… Tudo isso é herança. E, por acreditar nesse legado, tenho trabalhado para transformar a sobrevivência negra em uma vida cada vez mais livre e realizada. Chega de sobreviver e lutar. Eu quero mesmo é ser feliz!


[trilha sonora]


Claudia Feitosa-Santana: Adriana Barbosa é um modelo para além do contexto negro e feminino. Uma inspiração pra todos nós. Ela continua uma história que provavelmente começou muito antes de sua tataravó escravizada. Sua herança é a habilidade de transformar escassez em abundância. Como ela também podemos impactar nosso contexto. Já que somos uma criatura criada por nós mesmos. O contexto é fundamental nessa construção. Você participa ou já pensou em participar ajudando a transformar o preconceito em pertencimento? A sobrevivência em liberdade? E assim por diante? Nós nos fortalecemos em grupos mais diversos, pois somos muito mais inteligentes no coletivo. E assim podemos melhorar nossa cultura, a cola que nos conecta uns aos outros, portanto esculpindo a nossa humanidade


[trilha sonora]


Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


[trilha sonora]



Compartilhar:


Para Inspirar

A importância das relações durante o luto

Conversamos com uma psicóloga para entender como ter uma rede de apoio pode ser vantajoso e até necessário após uma perda

26 de Novembro de 2020


No primeiro episódio da terceira temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir, mergulhamos no relato profundo e cheio de emoção de Veruska Boechat, a viúva do jornalista Ricardo Boechat. Assim como todo o resto do país, Veruska foi pega de surpresa com a partida súbita e precoce dele que era não só o seu marido, mas também o seu melhor amigo e pai de suas duas filhas.

Como lidar então com uma ruptura tão brusca e violenta? Não há, é claro, uma única resposta para essa questão. Isso porque, como afirma Juliana Picoli Santiago, psicóloga clínica especializada em questões do luto, esse é um processo individual de cada sujeito e composto por diversas nuances e momentos.

“A morte de um ente querido é a experiência mais desorganizadora que um ser humano pode viver no seu ciclo vital. Quando vivemos o luto, vivemos a queda do mundo presumido, ou seja, aquilo que dá pra gente o conforto e a segurança de que as coisas são de uma certa maneira aquilo que nos coloca no mundo e nos faz viver” explica ela.

"A morte de um ente querido é a experiência mais desorganizadora que um ser humano pode viver no seu ciclo vital" diz a psicóloga. Diante desse cenário complexo e, muitas vezes, inédito, como é possível voltar ao dia a dia? “Quando falamos de rotina e organização do luto, a gente não pode falar disso sem falar necessariamente sobre rede de apoio. A pessoa que vive a situação de enlutamento tem pessoas próximas que vão viver junto com ela, e cada um de forma muito distinta. Então aquele que se percebe capaz e dispõe de mais recursos emocionais, possa servir como rede de suporte de apoio para uma pessoa mais fragilizada” diz a psicóloga.

Veruska conheceu isso na prática. “As pessoas diziam pra eu ficar numa sala reservada [no enterro]. Pra quê? Era muito melhor receber o abraço de uma pessoa que saiu de casa para me dar carinho. E eu descobri que simples presença é mais importante do que qualquer coisa que se diga” conta ela, em seu episódio.

“As pessoas ficam aflitas em saber o que falar. Na verdade, quanto menos falar, melhor. Sou grata por ter conseguido filtrar o que me diziam. Eu não fiquei com raiva, nem guardei mágoa, mas as pessoas precisam aprender o que dizer no luto do outro. E também a se comportar. Enquanto teve gente que levou comida na minha casa, outros chegaram pedindo pra lanchar” conta. “Quando eu finalmente conseguia levantar, me arrumar e botar o pé pra fora, as pessoas vinham me dizer: ‘eu era fã dele, eu adorava ele’. E eu sei que é por amor, mas eu tava exausta de chorar e só queria poder falar: ‘Nossa, tá bonito o dia’”.

Para Juliana, “é adequado que nós possamos falar sobre a pessoa que se foi, sobre sua história, não se deve evitá-la. É importante que possamos trazer ao nível da palavra aquilo que nos traz significado. E muitas vezes, dar significado a uma perda, está necessariamente ligado ao poder falar sobre o que aquela pessoa significava, trazia na sua experiência e no seu papel pra vida de quem ficou. Uma pessoa não é feita só do luto, ela é feita de história, estrutura”.


Só que a dor do luto pode ser tão dolorosa quanto incapacitante, e por isso muitas vezes é confundida com a depressão. E, ao mesmo tempo que esse processo ocorre, a vida lá fora continua acontecendo. “Quem olha pro enlutado não vê que, além da tristeza, os boletos vão chegar normalmente. Você perde o seu marido num dia, no outro tem que ir ao cartório pegar a certidão de óbito. Numa hora em que você não quer conferir um papel que descreve um acidente que você nem conseguiu digerir ainda. Ninguém me disse isso” conta Veruska.

“Eu tinha tantas tarefas burocráticas pra resolver, que não conseguia mais dormir de ansiedade. Um dia, peguei um desses caderninhos tipo moleskine , de brinde, e comecei a anotar tudo que eu precisava fazer. Mesmo sem vontade, eu escolhia a tarefa mais idiota, tipo ‘trocar a titularidade da TV a cabo’ e riscava da lista. Resolver uma coisinha dessas me dava um pouquinho mais de força pra ir em frente” complementa.

Retomar a rotina aos poucos pode trazer a tão desejada sensação de normalidade que o enlutado busca. Mas “só no sentido do que a pessoa dá conta de fazer” como explica Juliana. E, para que isso seja possível, é preciso ter ajuda. “Minha primeira dica é: formar uma rede de apoio, ter pessoas próximas que possam cuidar até de suas necessidades mais básicas até que ela possa se integrar e começar entrar em contato consigo mesmo” explica a psicóloga.

“Mesmo quando se recebe cuidados adequados, a experiência do luto é tão desorganizadora que vai se refletir no sono, nos hábitos alimentares e também na cognição e memória” diz Juliana. Com todos esses aspectos da vida prejudicados, a presença de outras figuras que possam estar em condições emocionais melhores é mais do que bem-vinda, como também necessária.

Há pessoas que buscam refúgio no trabalho. A própria Veruska conta que, depois de 14 anos sem trabalhar, voltar a ativa lhe deu forças e ajudou a ocupar a cabeça. Outros preferem encarar um longo processo terapêutico e buscar uma escuta capacitada. Há ainda os que erroneamente preferem ignorar os sentimentos, sem saber que o luto não acaba, mas sim passa a fazer parte dos seus dias.

As redes de apoio podem ser feitas por amigos, familiares e escutas capacitadas

Para todas essas alternativas, a rede de apoio é o que manterá a pessoa em condição de poder optar qual caminho seguir. “Tem uma filósofa chamada Hannah Arendt que escreveu ‘Toda dor pode ser suportada se sobre ela puder ser contada uma história’. E é justamente aí que mora a importância de falar sobre aquilo que me dói para alguém. Isso dá sentido para minha vida, quando uma pessoa me escuta, ela também me traz existência. Escutar alguém é trazer alguém pra minha existência” explica.

Portanto, falar sobre o assunto é de suma importância - ter alguém não só para ajudas cotidianas, mas para que seja esse ouvido que traz à luz a existência do enlutado como um indivíduo único e independente. “Pode ser que alguém não possa contar com essa rede de apoio, então existem alguns serviços como Centro de Valorização da Vida (CVV - Disque 188) e serviços que são disponibilizados pela rede pública como o Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental (CAISM). O importante é poder falar” conclui Juliana.

Compartilhar:


Inscreva-se na nossa Newsletter!

Inscreva-se na nossa Newsletter!


Seu encontro marcado todo mês com muito bem-estar e qualidade de vida!

Grau Plenae

Para empresas
Utilizamos cookies com base em nossos interesses legítimos, para melhorar o desempenho do site, analisar como você interage com ele, personalizar o conteúdo que você recebe e medir a eficácia de nossos anúncios. Caso queira saber mais sobre os cookies que utilizamos, por favor acesse nossa Política de Privacidade.
Quero Saber Mais