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Ciúmes: como entendê-lo e como curá-lo?

Tão comum quanto nocivo, o ciúmes é parte da nossa gama possível e infinita de sentimentos, e envolve nosso cérebro mais do que nosso coração

14 de Dezembro de 2022


Se você foi jovem nos anos 2000, certamente assistiu a obra de Manoel Carlos, Mulheres Apaixonadas. Para além dos vários enredos possíveis que uma novela propõe, um deles se conecta com o nosso artigo: o ciúmes doentio da personagem Heloísa (Giulia Gam), que via em cada movimentação do seu marido, Sérgio (Marcello Antony), uma potencial ameaça ao relacionamento.

A palavra doentio aqui não é usada em vão: o ciúmes, quando em excesso, deve ser tratado como uma doença, uma condição que atrasa a vida da pessoa de quem sente e, claro, de quem é o objeto do sentimento. Há até um grupo de apoio - também mencionado na telenovela - para isso: o MADA, ou Grupo de Mulheres Que Amam Demais Anônimas. Sim, como um Alcoólicos Anônimos, mas aqui, o álcool não é o problema.

O ciúmes, é claro, não se trata de uma exclusividade feminina. Aliás, é bastante comum entre os dois gêneros e é fonte até mesmo de crimes passionais. Revogada em 2015, a Lei do Feminicídio (nº 13.104), prevê pena de 12 a 30 anos para homens que violentam mulheres de alguma maneira, motivados pelo fato delas serem isso: mulheres.


E, como sabemos, muitos desses crimes, classificados como “passionais” pela lei, são fonte desse sentimento de posse tão difícil que é o ciúmes. A seguir, explicaremos sua origem, seu trajeto em nosso cérebro e os caminhos possíveis para sentí-lo de forma moderada. 

A psicanálise e o ciúmes

Te contamos aqui neste artigo um pouco mais sobre os mecanismos da paixão no nosso cérebro, esse sentimento tão intenso e avassalador que ativa circuitos potentes e opera em nosso metabolismo como o uso de substâncias químicas recreativas - as drogas. 

“A paixão, do ponto de vista do cérebro, se assemelha a uma espécie de demência temporária, hipermotivacional, com características de estresse, obsessão e compulsão” explica o neurocientista e professor Pedro Calabrez em vídeo para a Casa do Saber. 

Com o ciúmes, o processo não é muito diferente. Para o psicanalista Guilherme Facci, em entrevista à Revista Gama, o ciúme é um dos sentimentos mais humanos que existem, comum desde a infância, e é considerado hoje como saudável se ocorre em certa medida.

Mas, se ele se torna persistente, se é baseado em um “imaginário inflacionado”, ou fundado em uma “verdade absoluta”, como descreve nessa entrevista, pode ser delirante e virar uma patologia próxima à paranoia. A investigação acerca do tema é tamanha que, ainda no começo do século, outro psicanalista - esse bastante famoso - se debruçou sobre o tema em um dos seus vários escritos: Sigmund Freud.

Em
“Alguns Mecanismos Neuróticos no Ciúme, na Paranoia e na Homossexualidade”, o considerado pai da psicanálise traça justamente esse mesmo paralelo citado por Guilherme, que é o do ciumento como um paranoico. Ele ainda fazia uma distinção: havia o ciúme normal, comum, corriqueiro; o projetivo, que ainda estaria dentro da normalidade; e o patológico, que seria o delirante.

Mas essa não é uma teoria absoluta e causa divergência entre os estudiosos.

Os níveis normais de ciúmes É difícil cravar essa questão, já que ela é individual e diz respeito também à linguagem de amor que aquele indivíduo foi exposto. Para alguns, ciúmes ainda é sinônimo de amor, e sua ausência indica uma clara falta de afeto.

Para outros, a movimentação é justamente contrária, e a natureza desses entendimentos podem ser múltiplas. Crianças que foram expostas a um relacionamento tóxico ainda na infância, por exemplo, podem entender o ciúmes como um modus operandi, ou seja, é assim que se ama quando se ama.

Outras, que buscaram a ajuda de um psicoterapeuta, por exemplo, podem ir para o caminho oposto e entender até o mínimo sinal de ciúmes como algo que as sufoca.  Para o especialista mencionado anteriormente, há algum nível de classificação possível. “No normal, tem alguém olhando para meu par, aquilo me incomoda um pouco. Tem algum apego ao objeto amoroso, um desconforto, mas que passa rápido, é algo que não se sustenta muito, é uma bobagem”, explica.

Mas esse duelo de sentimentos começa a se tornar um problema quando a certeza absoluta, aquela mencionada no tópico anterior, entra em jogo. É nesse imaginário muito inflacionado que mora o problema, o grande divisor de águas para um diagnóstico de uma psicose. O problema é que isso pode acontecer na neurose também, como ele prossegue.

O ciumento se aproxima muito de um paranóico justamente porque busca essa tal verdade que se quer chegar a qualquer custo. Mas, para a psicanálise, não há em nenhuma hipótese uma verdade absoluta.  “O problema já começa por aí: acreditamos que é possível encontrar o nosso objeto amoroso que vai nos completar. E é o primeiro equívoco. O segundo equívoco é que a gente vai poder apreender esse objeto, tê-lo”, explica.
É aí que se consagra o ciúme patológico: quando acredita-se que perder aquela pessoa é perder uma parte de si, o que não é verdade.  A falta que todos temos. Como te contamos neste artigo, segundo o famoso psicanalista francês, Jacques Lacan, nós só existimos a partir do olhar do outro.

Portanto, o que sabemos sobre nós mesmos é baseado em evidências que “nos contaram”. Exemplo: você sabe que tem uma personalidade forte pois cresceu ouvindo que tinha. Se considera uma pessoa engraçada pois sempre fez o outro rir. E assim por diante.
Partindo desse princípio, sabemos que o outro é imprescindível para que a gente se reconheça, por exemplo, dentro de uma relação - seja ela qual for!

O ciúmes entre irmãos, por exemplo, também é normal,
como mencionamos aqui. Mas é importante ressaltar que sempre haverá a falta, em todo ser humano. Nascemos faltantes e estaremos sempre em busca, pelo resto de nossas vidas, de preencher esses vazios que nos habitam.  Essa busca pode ser instigante, como a busca por um propósito, mas também pode gerar angústia e frustração.

Todos esses sentimentos são legítimos e válidos, fazem parte, e cabe a nós saber nomeá-los e gerenciá-los,
como mencionamos neste artigo É no processo de análise, por exemplo, que podemos entender que essa falta é estrutural. “Eu sei que eu não vou encontrar o objeto que me completa porque esse objeto não existe”, como pontua Guilherme.

E aí começa o entendimento de que, se esse objeto não existe, então sentir ciúmes de algo que foi produzido pelo meu inconsciente é uma batalha em vão, que só irá machucar e não terá de fato um fim. Há ainda quem relacione o ciúme ao ato sexual, o desejo que haja essa terceira pessoa imaginária para que então, durante o ato, haja a ilusão de que você está possuindo aquele objeto que o outro queira, mas que agora é seu.

E novamente: tudo isso é fruto da ilusão de controle.
Falamos dela por aqui também, lembra?  É tudo parte de crença, que afinal, é o que nos torna humanos em sua maior potência. Crer é intrínseco a nossa existência, e crenças são indiscutíveis porque são individuais, partem da experiência de vida daquele ser humano, como explicamos lá naquele comecinho. 

O problema é crer que um outro ser humano será seu, ou que o outro ser humano está tomando determinadas atitudes segundo o seu próprio olhar, o que posiciona tudo ainda mais no campo da imaginação, já que é impossível decifrar o que o outro está fazendo, essa é uma leitura somente sua.  

É possível curar o ciúme? A neurociência já identificou quais circuitos cerebrais são ativados quando a sensação dá as caras. Uma pesquisa publicada pelo Instituto Nacional de Ciências Radiológicas do Japão na revista Science, por exemplo, mostrou que quando sentimos inveja de uma pessoa - sentimento próximo ao ciúme - o córtex anterior cingulado (CAC), mesma área que está mais ativa quando sentimos dores físicas, funciona com mais intensidade. 

 Pesquisadores da Universidade da Califórnia em Los Angeles fizeram um experimento onde os participantes iam lentamente se sentindo excluídos e reforçaram a tese de que o CAC era intensamente provocado e deixava a pessoa à beira de um ataque de nervos. Ainda, de acordo com uma pesquisa publicada na "Frontiers in Ecology and Evolution" e reveladas neste artigo, o ciúmes faz com que níveis de testosterona – ligados à agressividade e competitividade – e de cortisol – um indicador de estresse do organismo – aumentem exponencialmente.

Se a dor de um ciúmes pode ser comparada a uma dor física, então parte-se do princípio de que há um remédio para curá-la. Mas, infelizmente, ainda não há nenhuma droga dessa natureza fabricada, apesar das incessantes buscas. Isso porque o mecanismo neuroquímico exato por trás desses sentimentos ainda não foram decifrados de maneira exata. 

Mas,
como explica esse artigo da Revista Galileu, o processo para se chegar a um novo composto e comercializá-lo é longo, demanda muito investimento de tempo e de dinheiro, além das várias etapas de segurança obrigatórias que devem ser submetidas.  O que já se sabe é que seria uma droga comparável às que já conhecemos, ou seja, tarjada, vendida controladamente e sempre com a indicação de um acompanhamento de psiquiatra e psicólogo juntos.

Esses, aliás, já podem ser usados para atenuar a dor de quem sente ciúmes, mas tratando seus sintomas finais, como uma depressão ou a ansiedade que o sentimento causa. Ele pode ser entendido até mesmo como um TOC, mas isso tudo, claro, com indicação. Por fim, uma outra possibilidade cogitada pelos pesquisadores e levantada pela Galileu é desenvolver uma terapia baseada em estimulação magnética transcraniana (EMT), uma técnica, que consiste em emitir correntes elétricas que alteram a atividade cerebral.

Porém, a técnica, já usada em tratamento de doenças como depressão, mal de Parkinson e enxaqueca, só pode ser aplicada na superfície do cérebro, mas os circuitos do ciúme e da dor social se localizam mais profundamente no órgão. Por ora, olhar profundamente para o que causa esse transtorno segue sendo a melhor saída possível.

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Porque você não deve temer o tsunami prateado

Muitos temem que o envelhecimento da população destrua a economia mundial. Entenda por que isso não vai acontecer

29 de Agosto de 2019


A sabedoria convencional é que um envelhecimento da população é tóxico para o crescimento econômico. Quem fará todo o trabalho? Como pagaremos por todos os programas médicos e sociais dos idosos? Os economistas gostam de mostrar projeções assustadoras de como esta crise demográfica está chegando para nós. Os avisos soam ameaçadores. Mas talvez o que realmente não esteja envelhecendo bem seja a preocupação de uma crise inevitável. Queda na produtividade Nicole Maestas, economista de Harvard, e seus colegas calcularam, com base em dados de 1980 a 2010, que um aumento de 10% na população com 60 anos ou mais diminuiu o crescimento do PIB per capita em 5,5%. Ou seja, o envelhecimento dos americanos poderia desacelerar o crescimento econômico em 1,2 ponto percentual nesta década. Na próxima, a queda seria de 0,6 ponto percentual. Maestas adverte, no entanto, que as projeções são baseadas em tendências históricas e podem não ser previsões precisas. Seu palpite é que a produtividade diminuiu porque as pessoas mais qualificadas deixaram o mercado em número maior. Afinal, elas são mais bem-sucedidas e ricas e podem se dar ao luxo de se aposentar. Se ela estiver certa, não é que os trabalhadores se tornem menos produtivos à medida que envelhecem, mas que os mais produtivos parem de trabalhar. O que pode ser feito Porém, uma grande queda na produtividade não é inevitável. Novas tecnologias e políticas de negócios podem manter pessoas talentosas trabalhando por mais tempo. Equipes formadas por jovens e idosos, com diversas experiências, podem até ser mais produtivas. “Há poucas evidências de que as sociedades em envelhecimento sejam piores economicamente”, diz Daron Acemoglu, economista do MIT. Observando os dados do PIB de 1990 a 2015, Acemoglu não encontrou correlação entre o envelhecimento demográfico e o crescimento econômico mais lento. De fato, países como Coréia do Sul, Japão e Alemanha, todos com populações em rápido envelhecimento, estão indo bem. Uma razão possível? Automação. Países com força de trabalho envelhecida foram mais rápidos em adotar robôs industriais. Preconceito etário Faz 12 anos que o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, afirmou que “os jovens são mais inteligentes”. Há quase uma década, o bilionário Vinod Khosla disse: “Pessoas com menos de 35 anos são as que fazem a mudança acontecer”. Pesquisas acadêmicas indicam que Zuckerberg e Khosla estão errados. Em um estudo que analisou 2,7 milhões de fundadores de empresas, economistas do MIT, do US Census Bureau e da Universidade Northwestern concluíram que os melhores empreendedores são de meia-idade. Segundo eles, um empresário de 50 anos tinha quase duas vezes mais chances de construir uma empresa de sucesso do que um de 30 anos. O preconceito pode explicar por que o Vale do Silício fez um trabalho tão terrível na criação de startups em biomedicina, energia limpa ou em outras áreas que exigem conhecimento e experiência científica. Em pesquisas anteriores, Benjamin Jones, economista da Northwestern, apresentou evidências de que a maioria das grandes realizações científicas nas ciências físicas e na medicina ocorre na meia-idade, e não nos jovens. Trata-se de uma mensagem perdida no Vale do Silício e em seus investidores que gostam de jovens. Parece que os bilionários estão, afinal, estabelecidos em seus caminhos. Mesmo que eles não mudem suas idéias sobre o envelhecimento, é fundamental que nossa sociedade mude. O dano não será apenas econômico. O impacto financeiro e emocional dos trabalhadores mais velhos, incapazes de encontrar um emprego por causa do preconceito, é devastador para as famílias e as comunidades. E é uma dor causada por nosso próprio pensamento restrito e imaginação limitada. Mas, embora o envelhecimento possa ser inevitável, tornar-se improdutivo não é. Podemos estar enfrentando um tsunami demográfico, mas não precisamos ficar sobrecarregados. Fonte: David Rotman, para MIT Technology Review Síntese: Equipe Plenae Leia o artigo original aqui .

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