Entrevista com

João Ricardo Cozac

Psicólogo Esportivo

Saúde mental esportiva: como o tema é debatido na seleção?

Entrevistamos um psicólogo esportivo para entender como a mente e a saúde mental são debatidas e tratadas entre jogadores de alto rendimento.

27 de Novembro de 2022



Seguindo em ritmo de Copa do Mundo, dessa vez adentrando nos territórios da Mente, decidimos investigar como o tema da saúde mental é tratado dentro do ambiente futebolístico. Para isso, entrevistamos o psicólogo esportivo João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte com 31 anos de experiência na área e trabalhos desenvolvidos em vários times de futebol no Brasil. Confira a seguir!

Como se dá a atuação de um psicólogo esportivo? São consultas individualizadas ou coletivas, por exemplo?

Nesse trabalho, o foco principal é o time, o objetivo primordial é o trabalho com a equipe. Então são desenvolvidos trabalhos de comunicação, de integração e união, de equipe, de motivação, de criação e elaboração do perfil psicológico de personalidades e de cada atleta e sobretudo um trabalho multi e interdisciplinar, ou seja, o psicólogo entra em contato com os demais profissionais da comissão técnica. Sem essa ideia de ser um trabalho isolado, mas incorporado, assim como tem nutrição, fisiologia e fisioterapia. É claro que o trabalho é muito mais produtivo e efetivo quando ocorre de forma contínua, como em grandes seleções do mundo. Nessas seleções, os trabalhos individuais com atletas ocorrem de forma remota e, quando o time vai pra concentração e pros grandes torneios, começa-se aí a elaborar um trabalho mais coletivo. 

Então pode-se dizer que o trabalho do psicólogo esportivo é sempre coletivo, não individual?

Sempre existe essa dúvida, se ele atende o jogador individualmente ou não. E aí é muito importante fazer uma diferenciação entre psicologia do esporte e psicologia clínica. Na psicologia do esporte, como eu disse, o foco é o time. Na psicologia clínica, o foco é o atleta. Então quando um psicólogo do esporte trabalha uma seleção, o foco dele são os processos coletivos. Ah, mas isso significa que ele não vai conversar individualmente com nenhum jogador? Não. Ele pode escutar, fazer um trabalho de orientação individual, mas se houver a necessidade de um processo terapêutico, ou seja, um olhar mais profundo para alguma situação que envolva sofrimento ou algum contexto psicoemocional que possa estar gerando sofrimento e que ele, por sua vez, esteja gerando uma queda no rendimento, o psicólogo do esporte deve indicar e orientar esse atleta a procurar um trabalho fora do clube com um psicólogo clínico da sua confiança. O que acontece é que, ultimamente, os jogadores de futebol profissionais estão procurando muito mais esse apoio fora dos clubes. Até porque, os clubes que têm psicólogos do esporte é o time e eles querem um trabalho mais individualizados, e o psicólogo do esporte não pode fazer isso, mas pode encaminhar e orientar esses atletas a profissionais de sua confiança para processos mais individuais e profundos.  

Quais são os males comuns enfrentados por atletas de alto rendimento? 

Eu diria que a gente pode categorizar em 3 grandes grupos. O primeiro é a parte da dificuldade no gerenciamento da ansiedade pré-competitiva. O segundo é a dificuldade no gerenciamento da concentração, foco e tomada de decisão - e isso também está muito ligado ao plano emocional. Por fim, em terceiro, é muito comum atletas que treinam muito bem, mas não performam bem quando a competição começa. É o que no futebol se chama de leões de treino. Eles treinam super bem, mas não têm a mesma apresentação na performance competitiva durante os campeonatos. Então aumento de ansiedade, queda de concentração e ótimos treinos e más apresentações oficiais. Diria que são esses 3 blocos de demandas muito comuns na questão do alto rendimento e que a gente encontra tanto no plano individual, quando há trabalhos individuais com atletas, e no plano competitivo, quando a gente observa nos treinos e jogos essa defasagem.


A competitividade gera mais estresse do que incentivo?

Acho que é importante dizer que cada atleta reage de uma forma diante de níveis elevados de ativação resultantes comuns da competição, da expectativa, da pressão e de uma porção de outros fatores. Não necessariamente o fator competitivo é gerador de pressão, tem atletas que se dão muito bem, que têm perfis comportamentais extremamente competitivos. Então o gerenciamento interno dessas emoções é muito de cada atleta, e aí claro que a psicologia do esporte ajuda bastante nesse contexto, de você ensinar e ter ferramentas e instrumentos pro alto gerenciamento dessas emoções, que são absolutamente comuns no alto rendimento e na performance esportiva, mas novamente, é preciso também uma atenção individual de cada um. 

A saúde mental dos jogadores é encarada com mais seriedade hoje em dia, na sua opinião?

Não vejo ainda os clubes no Brasil preocupados com saúde mental. Embora a presença de psicólogos do esporte nas categorias de base seja obrigatória, até por conta do Estatuto da Criança e do Adolescente, no profissional, onde não é obrigatório, acho que menos de 30% dos times da série A e B contam com esse trabalho. Isso é fruto do preconceito e da falta de boas informações sobre o que é, o que significa e como é desenvolvida a psicologia do esporte. Por muitos anos ela foi uma área banalizada, muitos profissionais de ocasião de outras áreas invadiram o futebol brasileiro como os coaches, os palestrantes motivacionais, os animadores culturais. E aí as pessoas do futebol começaram a duvidar da eficiência da psicologia do esporte, porque esses profissionais de ocasião vendiam projetos dizendo que iam trabalhar motivação, a união da equipe, quando na verdade eles não têm essa habilitação. Então, à medida que os anos foram passando, foi criado um conceito muito corrompido do que significa a psicologia do esporte enquanto ciência e área da preparação esportiva já muito presente em boa parte das modalidades esportivas do nosso país. Há muitos anos que a seleção brasileira não tem esse trabalho.

Isso pode ser reforçado pela fala do técnico Tite, que argumenta que a Copa é curta e que, por isso, a presença de um psicólogo surtiria pouco efeito?

O Tite não é psicólogo, não conhece todas as linhas do trabalho e do treinamento. Há linhas que têm formatos mais breves de atuação, por exemplo. É óbvio que o ideal é que esse trabalho seja realizado de uma forma permanente, e não apenas durante um campeonato. Seleções como a Inglaterra, Argentina, México, Alemanha, Holanda, contam com departamentos de psicologia do esporte atuantes durante todo o processo, ano a ano. Os psicólogos trabalham os jogadores individualmente, no formato online, até porque jogadores moram e atuam em outros países europeus, e aí quando os atletas se reúnem nas convocações, começam os trabalhos psicológicos que visam ampliar a motivação, comunicação, coesão e integração de equipe e liderança. Em paralelo, quando as equipes não são convocadas, os atletas trabalham individualmente. 


Isso não existe no Brasil?

Essa iniciativa o Tite e a CBF não tem. Eles deveriam entender que a psicologia pode trabalhar antes das convocações, e quando os atletas estiverem convocados, um trabalho de equipe poderá ser realizado. O segundo ponto, que é muito importante também, enfatizar minha primeira fala, é que você tem linhas, abordagens psicológicas que podem ser realizadas com grande apoio também, inclusive em momentos de torneio, de competições, os mais importantes.


Mas frisa-se: não é que há tempo curto, o tempo é hábil para um trabalho psicológico, desde que esse trabalho inicie individualmente com os atletas antes das competições. E aí, o tempo que você vai ter junto com os jogadores antes do campeonato é mais do que suficiente para desenvolver as competências competitivas e psicológicas para desenvolver tanto no plano individual quanto no coletivo. 

Você mencionou as seleções de outros países. Como se dá o trabalho por lá? Em alguns países, como a Alemanha, existe um psicólogo para o mirim, para o infantil, para o juvenil, para o juniores e para o profissional. Isso é muito importante porque dá uma noção de continuidade e crescimento do atleta nas categorias de base até ele chegar no campo profissional, e há uma integração entre os psicólogos do esporte de cada categoria. Novamente na Alemanha, o psicólogo que trabalha com o treinador tem contato com vários outros psicólogos de equipes europeias onde os jogadores atuam. Então eles realizam ali a troca de informações sobre o perfil psicológico de cada atleta, o momento comportamental de cada um, tudo isso são informações que o psicólogo responsável pelo profissional da seleção alemã, por exemplo, irá precisar para poder conversar com o treinador, assim como faz um preparador físico. Afinal de contas, a mente e o corpo são igualmente importantes num alto rendimento esportivo. O problema é que aqui, infelizmente, há muitos treinadores que se julgam psicólogos e acham que um comportamento paternal ou uma narrativa já fazem o trabalho psicológico, demonstrando mais uma vez o quão superficial é o conhecimento deles em relação ao trabalho da psicologia.

Quais benefícios traria a presença de uma psicóloga na seleção? 

Os benefícios são inúmeros. Primeiro, os atletas aprendem a gerenciar a ansiedade pré-competitiva, otimizar os processos de concentração, foco, tomada de decisão, velocidade de reação. Hoje em dia, a psicologia do esporte tem uma vertente extremamente tecnológica, com aparelhos que atuam diretamente na esfera neuropsicológica dos atletas, melhorando competências comportamentais extremamente importantes.

Além disso, muitas vezes os atletas têm suas questões pessoais, que são importantes. Lembrando que atleta e ser humano fazem parte da mesma unidade, você não pode isolar a história e o desenvolvimento do indivíduo e pensar só no indivíduo atleta. Portanto, resumindo, os benefícios são de uma equipe mais focada, mais equilibrada, mais resiliente e com a possibilidade de um alto controle emocional individual que, dependendo do momento do torneio e das exigências, expectativas e pressões, podem ser determinantes para vitória ou para derrota. 

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#PlenaeApresenta: Celso Athayde e a mudança no coletivo

Conheça e história do empreendedor social, Celso Athayde, fundador da CUFA, na segunda temporada do Podcast Plenae

19 de Outubro de 2020



O último episódio da segunda temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir, apresenta uma potência única: o empreendedor social Celso Athayde.

Representando o pilar Contexto, Celso conta como ter morado na rua ainda na infância e os diferentes encontros que a vida o proporcionou levaram ele a ser quem é hoje.

Ao conversar com um morador de rua que foi próspero antes da vida mudar, Athayde entendeu que o caminho inverso também poderia ser trilhado: ele também poderia ter tudo um dia. Mas ele não queria “ter tudo” só pra si, não queria ser a exceção de uma realidade toda condicionada à pobreza.

Ele queria mais. Queria que a exceção se tornasse a regra. “Eu sempre acreditei que o meu valor pessoal, o meu projeto de vida, não é individual, mas, sim, coletivo”. Então, começou a novamente, ouvir o outro. Foi conversar com a juventude de sua região para entender: onde eles queriam chegar?

De cara, ouviu o nome do grupo Racionais MCs. O quarteto do rap que bombou nos anos 90 e até hoje segue fazendo sucesso, se tornou ícone para muitos jovens de periferia como eles foram um dia. Celso, ouvindo isso, entendeu que há diferentes formas para o “chegar lá”, como a cultura, por exemplo.

Esse momento também marca a virada de quando o empresário entendeu a sua raça como algo maior, e não só seu. “Foi uma virada porque me fez entender que eu era preto e dar a isso uma visão de coletivo. E isso é grande.”

A Central Única das Favelas (CUFA) , seu maior projeto, é então criada. “A CUFA nasce de eu estar sempre inconformado. Essa ânsia, essa vontade de alterar o cenário em que vivo, está na origem dela. Lá, não quero ser apenas um líder que muda de vida. Quero liderar uma mudança para todos, quero que mais gente tenha voz no caminho, que mais gente mude de vida.”

Desde o seu nascimento até os dias de hoje, a CUFA já mudou a realidade de muitos jovens por meio da arte, do esporte, da educação e várias outras frentes. “Queremos conscientizar as camadas desprivilegiadas da população da potência que têm, por meio de oficinas de capacitação profissional e ações que elevem a autoestima da periferia.”

Isso envolve dar voz a quem nunca teve oportunidade de falar e ser ouvido. Ouvir, aliás, foi tudo que Celso fez a vida toda. “Eu preciso tirar a favela da invisibilidade e fazer ela a potência que é. Os invisíveis são invisíveis em qualquer atividade que estão desenvolvendo, então, cabe às pessoas que têm a responsabilidade de ter uma fala pública mudar isso. Eu não largo essa responsabilidade em nenhum momento da minha vida.”

Ouça mais sobre essa trajetória tão rica e inspiradora no último episódio da segunda temporada do Podcast Plenae, disponível na sua plataforma de streaming.

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