Para Inspirar

Henrique Fogaça em "O importante na vida são as pequenas coisas"

A oitava temporada do Podcast Plenae está no ar! Confira a história do chef Henrique Fogaça. Aperte o play e inspire-se!

29 de Maio de 2022


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:


[trilha sonora]


Henrique Fogaça: É fundamental que as pessoas conheçam os benefícios da maconha medicinal. É um fato inquestionável que o canabidiol transforma vidas e traz qualidade pras pessoas que sofrem caladas, trancadas, num quarto um dia inteiro, tomando outras medicações que deixam o paciente com um olhar parado. O CBD traz vida.


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Geyze Diniz: A garra em proporcionar uma vida com mais qualidade para sua filha fez o cozinheiro e empresário Henrique Fogaça abrir um novo caminho para a medicina alternativa e mostrar um mundo com mais sabor e prazer para sua filha Olivia. 


Conheça a relação de amor e perseverança de Henrique Fogaça. Ouça no final do episódio as reflexões do rabino, escritor e dramaturgo Nilton Bonder para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.


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Henrique Fogaça: Quando eu tinha 4 anos de idade, eu fiz uma viagem com meus pais para o  Rio de Janeiro e minha mãe conta que a gente foi almoçar num restaurante no terraço do edifício Santos Dumont. Era um restaurante chique, que ficava no quadragésimo quinto (45º) andar do prédio e lá  tinha uma vista panorâmica de 360 graus pra cidade. Era lindo. O maître chegou falando as opções do cardápio e, segundo a minha mãe, eu disse: “eu quero arroz, feijão, carne e ovo”. E digo pra vocês, até hoje essa é a minha comida preferida no dia a dia. 


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Desde pequeno eu sou um comilão, um verdadeiro glutão. Eu herdei das minhas avós o gosto de provar quase tudo e, mais tarde, de cozinhar. Minha avó materna, Liliza, fazia um rosbife maravilhoso, uma receita da família desde a minha bisavó, Alzira. Ele é temperado com duas horas de antecedência com noz-moscada, ervas, cebola e alho. Depois, ela colocava direto no queimador do forno pra selar e, quando assava, ficava rosado, com aquela crosta deliciosa.


Já a minha vovó Flora, a mãe do meu pai, fazia uma pizza com massa crocante, molho de tomate caseiro, muçarela e manjericão. Era uma delícia. No lanchinho da tarde, ela preparava um bolo cascudo, que no sul do país o pessoal chama de cuca. Ela afundava uvas-passas na massa e cobria com uma farofa que virava uma crosta incrível depois de assada, polvilhada com canela e cravo.


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Eu já tinha uns 23 para 24 anos de idade quando comecei a cozinhar. Eu morava sozinho em São Paulo, estudava comércio exterior e trabalhava num banco. A minha alimentação era à base de congelados que a minha mãe mandava de Ribeirão Preto, mas eu não gostava muito e a grana era curta para ficar comendo na rua, né. O jeito foi encostar a barriga no fogão.

Como minha experiência na cozinha não ia muito além do bom e velho ovo frito, eu telefonava pra minha avó Liliza pedindo socorro. A primeira receita que ela me ensinou foi a de um bife empanado. Não saiu perfeito igual o dela, mas ficou muito bom. Depois, aprendi o bê-a-bá: arroz e feijão com um temperinho caseiro delicioso.


Eu comecei a curtir aquele lance de cozinhar e ficava horas na minha cozinha. Achava terapêutico. Fiz um curso de sushiman pra comer comida japonesa em casa e não gastar em nenhum restaurante. Virei frequentador do bairro da Liberdade, que é famoso pela cultura japonesa. Eu comprava hashi, pratinhos, esteira de bambu para enrolar sushi, faca adequada para cortar peixes e potinhos para colocar o shoyu. Comprava os ingredientes também: wasabi, arroz apropriado, alga, saquê mirin, shoyu e, claro, peixe fresco.


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Aos poucos, o meu interesse pela gastronomia foi aumentando e o curso de comércio exterior foi ficando de lado. Eu larguei a faculdade, mas continuei trabalhando no banco. A minha mãe viu que eu estava meio perdido profissionalmente e sugeriu que eu virasse cozinheiro. Eu pensei e falei pra ela: “Mãe, não tem nada a ver isso comigo. Tá louca?”.

Mas, mesmo assim, eu continuava ligando pra ela pra pedir receitas e ela continuava insistindo pra eu mudar de profissão. Ela tinha razão. Mãe sempre tem razão né. Aquele trabalho burocrático do banco não tinha nada a ver comigo, mas eu precisava dele pra pagar as contas. Aí, eu decidi arriscar e, no ano seguinte, entrei no curso de gastronomia da FMU e não larguei o emprego. 


Eu me destaquei logo no começo e passei a receber convites dos professores pra fazer o mise-en-place em feiras e eventos. Para quem não sabe, mise-en-place é a preparação dos ingredientes, um processo fundamental que acontece antes da execução da receita. Comecei a testar em casa os pratos que eu aprendia e arrumei a minha primeira cliente: a irmã da Fernanda, a minha namorada. Ela era muito festeira e pedia pra eu fazer os petiscos que ela servia pros amigos. Eu servia comidas em potinhos individuais, novidade na época, e a galera curtia muito. 


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A coisa mudou de patamar quando eu passei a estagiar em restaurantes famosos. A academia que eu frequentava ficava ao lado do D.O.M, o restaurante do chef Alex Atala. Eu fiz amizade com o Giovani Carneiro, que era o sub-chef do D.O.M, e pedi um estágio pra ele.

Ele topou e eu fiquei no restaurante só um mês, porque uma panela de óleo quente caiu por acidente na minha perna e abriu um buraco na minha pele. Fiquei semanas parado. Quando me recuperei, estagiei no Julia Cocina, da Paola Carosella, que mais tarde seria uma colega no
MasterChef Brasil, e também passei no restaurante francês do chef Laurent. 


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A experiência e as técnicas que eu aprendi nesses lugares me deram confiança pra pedir demissão no banco. A convite do irmão da Fernanda, a minha namorada, fui criar as receitas pra uma kombi de lanches que a gente fundou juntos. Se chamava o Rei das Ruas. Eu montei um cardápio diferente do que existia, com carne louca, linguiça louca, carne seca acebolada e hambúrguer de picanha. Para sobremesa, fui revirar os cadernos de receitas das minhas avós e achei o pretinho, um tipo de pudim de chocolate, e um bolo de cenoura com calda de chocolate.


A kombi ficava estacionada na esquina da Alameda Tietê com a Rua Augusta, no Jardim Paulista. Aquela foi a minha primeira experiência como pequeno empresário no universo da gastronomia. Depois de 6 meses tivemos uns problemas administrativos e precisamos fechar o negócio. Eu continuei trabalhando por conta própria, eu fazia sanduíches, bolos e mousses para deixar em consignação em lan houses, cafés e lojas de conveniências. Antes de terminar a faculdade, ainda trabalhei no Na Mesa, no shopping Iguatemi, por um ano.   


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O sonho de ter o meu negócio chegou com o telefonema de um amigo, o Marcelo, de Ribeirão Preto. Ele me contou que um colega dele tinha inaugurado uma galeria e estava procurando um chef pra abrir um café nesse espaço. Eu liguei pro cara e fui conhecer a galeria, que ficava praticamente na continuação da Avenida Paulista. O espaço pro café era bem pequeno, com uns 8 metros quadrados, estreito, com uma porta de rolo, dessas de ferro. Eu tinha medo, mas acreditei na minha força de vontade de fazer algo virar ali.


Meus pais vieram de Ribeirão Preto pra conhecer o lugar. Eles acharam muito pequeno e isolado, mas resolveram emprestar o dinheiro que eu precisava pra reforma. Mesmo cabendo só seis mesinhas, ficou demais, decorado com caveiras, a minha marca registrada. O nome era um pouco pretensioso pra um restaurante que servia sucos e lanches: “Sal Gastronomia”. Eu escolhi esse nome porque o sal é um ingrediente fundamental pra temperar a vida.


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No início, a gente tinha poucos funcionários. A Fernanda ajudava a servir as mesas, ficava no caixa e comprava os ingredientes no supermercado mesmo, porque o volume de compras era muito pequeno pra um fornecedor entregar na porta. A primeira receita que eu inventei foi um suco de limão com manjericão. Ele era bem verde e delicioso, muito refrescante.

Os sanduíches eram diferenciados, tipo carne seca com rúcula e tomate, tinha um também que era de legumes confitados no pão de miga preto. 
Depois de um mês de inauguração, passamos a servir almoço, mesmo naquele espaço minúsculo. Coloquei no cardápio um risoto de açafrão. Depois, um risoto de carne seca, queijo coalho e caju. Em pouco tempo, o Sal fez sucesso entre os críticos gastronômicos e começou a fazer fila de espera na porta.


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A vida ia de vento em popa. A Fernanda e eu nos casamos com uma festona, o restaurante foi crescendo e a maior aventura da minha vida estava pra começar: a paternidade. Embora a gente pensasse em ter filhos, a gravidez não foi planejada. Ainda mais porque a gente estava começando com o Sal, imagina a correria hein. 


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A gravidez foi tranquila e a gente estava ansioso pela chegada da Olívia. Mas, logo que ela nasceu, a gente teve um susto: ela não chorou. A Olívia foi levada diretamente para uma incubadora e ficou uns 10 dias no hospital. Nesse tempo, a gente percebeu que ela era um bebê mais frágil, mas nenhum médico deu um diagnóstico. Depois de um mês que ela nasceu, caiu a ficha de que ela era diferente, uma criança com necessidades especiais. Não foi um choque, não foi um baque, mas claro que não era algo que a gente esperava e toda a família ficou bem sensibilizada. 


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Durante os dois, três primeiros anos de vida da Olivia, a gente procurou médicos geneticistas e hospitais tentando saber o que ela tinha. Ela passou por um monte de exames, mas ninguém dava um diagnóstico. A Olívia não andava, não falava e tinha que comer por sonda. É no mínimo curioso que eu, uma pessoa que trabalha pra alimentar os outros, não pudesse alimentar a minha própria filha. Para piorar, por ficar muito tempo deitada, ela estava começando a apresentar problemas sérios na coluna, que a deixavam com a cabecinha baixa. 


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Hoje, a Olívia tá com 15 anos e começou a melhorar há alguns anos. Tudo começou com uma cirurgia na coluna que permitiu que ela enxergasse o mundo de cabeça erguida. Depois veio a dieta cetogênica, que é isenta de carboidrato. Mas ela melhorou mesmo depois que começou a usar o canabidiol, um componente extraído da maconha e também conhecido como CBD. 


A mãe da Olívia já tinha me falado sobre os benefícios sobre o CDB e eu já tinha lido sobre o assunto em alguns lugares, e imaginava que realmente poderia ajudar a Olivia. Aí a minha assessora, a Patrícia, conheceu uma pessoa que trabalhava com canabidiol e tudo se encaixou. 


O processo pra conseguir a medicação foi fora do país, nos Estados Unidos, porque lá há muitos anos é usado o CBD, principalmente no estado da Califórnia. Os primeiros resultados foram uma tranquilidade e um lindo sorriso no rosto da Olívia. As convulsões que ela tinha diminuíram bastante. Esses pontos foram fundamentais e primordiais no tratamento. O CBD, atrelado com a dieta cetogênica, só trouxe alegria pra gente.


[trilha sonora]


Quem tem preconceito contra o canabidiol é porque não tem a mínima informação. Eu só ouço elogios e perguntas de familiares de pessoas que também têm síndromes e acompanham a evolução da Olívia. A minha filha hoje continua na cadeira de rodas, mas fica de pé com uma prótese que a gente põe na perna dela. Ela não anda, mas se equilibra em pé. Mesmo sem falar, a gente percebe que a fisionomia dela mudou com o canabidiol. Ela sorri mais e tem uma expressão de felicidade. 


Pra ajudar mais pessoas, a gente vai criar o Instituto Olívia, para difundir os benefícios do CBD e acabar com o preconceito em relação à cannabis. A maconha é uma planta que traz muitos benefícios para vários tipos de doenças e é muito importante que as pessoas tenham acesso ao CBD, pra ter uma qualidade de vida além do que a medicina tradicional oferece. 


[trilha sonora]


Eu me considero uma pessoa abençoada por ter a Olívia na minha vida, por ela ter me escolhido como pai. Como ela não fala, a gente se comunica através do olhar, um sorriso, um movimento. São gestos que me trazem muita felicidade e humanidade. Eu tenho muito amor no coração em poder partilhar o que a minha filha tem e mostrar ao mundo que é possível ter uma vida digna e feliz, acima das dificuldades e dos limites que a saúde impõe. O importante na vida são as pequenas coisas. 


[trilha sonora]


Nilton Bonder: Sim, Deus está nos detalhes. Esta parece ser a receita que Fogaça compartilha conosco. Ele aplica isso na construção de sua carreira de empresário e chef, e dá os ingredientes: ter gosto pelo que se faz, buscar aprimoramento e muita dedicação. A outra receita diz respeito ao nascimento da filha e, novamente, o chef se voltou aos detalhes. Meu avô dizia que você faz um cozido, e se passar do ponto vira um assado, e se passar do ponto vira um churrasco. É o tal fazer do limão uma limonada.


E esse é um relato frequente de pais que têm filhos com necessidades especiais. De que essas necessidades se transformam em abundância de afeto e humanidade, e terminam por produzir um senso de benção e de que são eles, esses seres com tantas carências, que dispõe da maior potência para presentear e surpreender.

Afinal, a gastronomia da vida, o que a torna deliciosa e irresistível, depende mais de condimentos do que de ingredientes, mais do encanto e do borogodó adicionado, do que as tais medidas ou descrições da receita. E não tem outra forma, esse resultado só se consegue ali, junto da bancada e do fogão da vida. 


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Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


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Para Inspirar

Izabella Camargo em “Uma dor invisível”

Na terceira temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir, conheça a jornada de resistência e limites de Izabella Camargo

27 de Dezembro de 2020


Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

[trilha sonora] Izabella Camargo: A Síndrome de Burnout é um conjunto de sinais e sintomas relacionados ao excesso de trabalho. Essa é a definição da Organização Mundial da Saúde. Já, na minha definição, burnout é a ausência de si mesmo. A pessoa ama tanto o que faz, que não vê problema em trabalhar demais, em deixar de dormir, de conviver com a família, por exemplo, pra trabalhar. Eu colocava o trabalho na agenda antes de mim mesma. Só que pra acumular mais e mais tarefas, eu tinha que abrir mão de muitas coisas. Nesse caso, das minhas horas de sono. Eu ultrapassei tanto os limites físicos e mentais, que cheguei ao ponto de receber o diagnóstico da Síndrome de Burnout. E esse diagnóstico mudou a minha vida. [trilha sonora] Geyze Diniz: Abrindo mão do sono, trabalhando madrugadas adentro e com a sensibilidade à flor da pele, o corpo e a mente da jornalista Izabella Camargo chegaram ao limite. A partir do diagnóstico de Síndrome de Burnout, Izabella se recolheu para recuperar a saúde. Neste processo, se reconectou com o próprio corpo, reorganizou suas prioridades e conquistou uma vida com mais sentido. Ouça no final do episódio as reflexões da professora Lúcia Helena Galvão para ajudar você a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se. [trilha sonora] Izabella Camargo: Eu sempre fui uma pessoa de sono fácil, daquelas que encosta a cabeça no travesseiro e apaga, sabe? Eu deitava às 10 da noite e levantava às 5 ou 6 da manhã sem despertador, olha que beleza! Eu sou do dia, então eu durmo cedo e acordo cedo. Eu vivi essa rotina de sono na maior parte do tempo até 2014, quando eu passei a trabalhar no telejornal Hora Um, que começava às 5h da manhã ao vivo na TV Globo. Por quatro anos, até o burnout e ser dispensada, eu precisava acordar meia-noite, uma ou duas da manhã. Só que para acordar meia-noite, por exemplo, eu tinha que dormir às 5h da tarde. Então, tente imaginar como é se deitar às 5h da tarde com o barulho da cidade, o calor, a claridade desse horário, especialmente no verão. Mesmo assim, com todas essas dificuldades, eu fiz de tudo para tentar me adaptar a essa dinâmica de vida.  Eu mudei do 3º pro 16º andar do prédio para ter menos barulho, mas não adiantou. Eu adotei um ritual pro cérebro desligar, tomando banho morno e bem demorado, muito chá de camomila, florais, meditação … Nada disso funcionou. Até que eu comecei a tomar remédios pra dormir. E ainda assim, não deu certo. Às vezes eram oito da noite e eu ainda nem tinha conseguido dormir. Fritava na cama. E aí, eu fazia a conta: 8, 9, 10, 11, meia-noite. Daqui 4 horas eu preciso levantar. E aí, o cérebro não desligava mesmo. Resultado: eu passei a dormir muito pouco e muito mal. E a privação do sono por muito tempo fez a minha mente e consequentemente o corpo saírem do eixo. [trilha sonora] O meu corpo começou a mandar sinais que algo não ia bem. O primeiro aviso veio pelo estômago. Tudo o que eu comia e bebia inflamava o meu estômago. Eu procurei uma nutricionista e depois um gastroenterologista. E aí, os alimentos levaram a culpa. Eu cortei lactose, café, como se a comida fosse a minha inimiga. E aí, vieram outros problemas de saúde. Problemas na pele, manchas, queda de cabelo, taquicardia. A privação de sono também atrapalha a recuperação venosa. Eu já acordava com as pernas inchadas e tive que fazer uma cirurgia pra retirar a safena esquerda. Os meus exames foram ficando completamente desregulados. O cortisol, por exemplo, que é o hormônio do estresse, chegou a 31, enquanto o máximo estabelecido para mulheres é de 18.  Agora, o curioso é que e não negligenciei nenhum sintoma, tá? A cada sinal de descompasso, eu procurava um especialista. Todos os profissionais diziam que o meu problema estava relacionado ao horário de trabalho e o que eu fazia nessas horas de trabalho. Eu já fazia terapia cognitivo-comportamental há muito tempo. Eu sempre cuidei da espiritualidade, então não faltou Deus, não faltou psicólogo, não faltou exame médico, remédio, não era alimentação. Faltou apoio profissional mesmo para mudar aquela situação, eu pedi pra mudar de horário, mas eu não fui ouvida. Quando eu dizia pros outros o que estava acontecendo, sabe o que parecia? Reclamação. Mas na verdade, hoje eu vejo que eu estava pedindo socorro. [trilha sonora] Pra fazer televisão ao vivo, você precisa estar com o raciocínio ágil, porque você tem pouco tempo pra falar muita coisa. E eu trabalhava em três telejornais praticamente simultâneos. Já fazia um mês que eu estava muito mal, com o braço esquerdo adormecido, que, depois eu descobri, era um sinal perigosíssimo de infarto. Até que naquele dia 14 de agosto, às 6 e pouco da manhã, eu falava da previsão do tempo para algumas capitais do país. Quando chegou no Paraná, que é o meu estado natal, eu travei. Eu não consegui avançar na palavra “Curitiba”, eu não lembrava da palavra "Curitiba". E mais do que isso: eu não sabia onde eu estava, quem eu era, nem pra onde eu ia.  Se eu não estivesse com tantos problemas de saúde, aquele apagão teria passado batido, como outros passaram. Afinal, eu só esqueci a palavra “Curitiba”, não é? Mas ali não era um lapso de memória: era um ultimato. Quem rege o corpo é a mente. E o meu cérebro já tinha dado todos os sinais de que algo não ia bem. Com aquele apagão, ele quis me dizer: “Agora deu, né?” [trilha sonora] Assim que acabou o jornal, eu fui ao psiquiatra. E foi ali, que eu descobri que eu estava vivendo a temida Síndrome de Burnout. Receber aquele diagnóstico foi como levar uma pancada na cabeça. Como assim, doutor? [trilha sonora] O tratamento começou pelo afastamento do ambiente estressor. Na minha licença, eu chorei demais, fiquei confusa, senti angústia e muita culpa por ter deixado chegar naquele ponto. Ainda mais porque o burnout é um desequilíbrio invisível, então além de cuidar da minha saúde, eu ainda gastava muita energia, muito tempo e muita saúde tendo que compreender os julgamentos alheios. Eu ainda tive a sorte de contar com o apoio do meu marido, da minha mãe e de algumas amigas, que se mantiveram ao meu lado. O suporte emocional é tão ou mais importante que o tratamento. Eu recomendo para quem convive com pessoas que estão passando pela Síndrome de Burnout que não forcem a barra. Na minha opinião, a melhor maneira de oferecer ajuda é dizer: “Quando você estiver confortável, eu estou aqui para te ouvir, tá?”. Ou: “Como eu posso te ajudar?”, respeitando o tempo daquela pessoa. O meu marido soube fazer tudo isso e foi extremamente importante pra que eu não pirasse ainda mais. [trilha sonora] Mas daí, depois do laudo do perito do INSS, eu voltei ao trabalho depois de dois meses e 15 dias, mas sem estar totalmente recuperada, tá? Quantos anos levaram pra eu chegar naquele estado? Então a cura não viria de um mês pro outro. Mas o meu comprometimento com a carreira era tão grande, que eu não vi problema em me restabelecer trabalhando.  No mesmo dia em que eu retornei à emissora, eu fui demitida. Se eu tivesse o conhecimento que eu tenho hoje, dos direitos e responsabilidade do empregador sobre problemas ocupacionais, das leis, aquela demissão não teria acontecido da forma como foi. Por isso eu estou aqui pra te dizer: informação é tudo. [trilha sonora] Eu passei a estudar o burnout e a falar com quem recebeu o diagnóstico. Já entrevistei mais de 4 mil pessoas. Totalmente diferentes, mas com as mesmas dores. Aprendi também que burnout é um nome novo para um problema antigo. Burnout já foi chamado "neurastenia" em 1869. Naquela época, gente, que não existia nem luz elétrica, mas a sociedade já estava estressada pelo excesso de modernidade. [trilha sonora] A síndrome é cercada de julgamento e preconceito porque, por muitos séculos, medidas higienistas tacharam como loucos pessoas com qualquer desequilíbrio mental, de lapso de memória a esquizofrenia. Eu descobri que a intolerância a uma dor invisível é muito grande. A família não sabe como lidar, muitos médicos têm dificuldade para fazer o diagnóstico. Mas sabe também o que eu aprendi? Que quando você vive uma experiência com burnout, você não é um profissional ruim. Você só está vivendo um momento ruim. O burnout atinge pessoas que, como eu, amam o que fazem, são idealistas e aí, por trabalharem tanto, se negligenciam. A Síndrome do Burnout acomete pessoas que trabalham demais não só para os seus padrões, mas para os padrões de todo ser humano. Não é à toa que a lei estabelece uma jornada de 8 horas. A gente sabe que existe uma cultura de valorização do workaholic, não é? É o máximo dizer que a gente tá sem tempo, porque tá trabalhando muito. Mas, me conta uma coisa, se não é legal falar de vício em drogas, cigarro, por exemplo, vício em trabalho pode? Tá tudo bem?   [trilha sonora] Hoje, eu faço um trabalho de prevenção, pra mostrar que a Síndrome de Burnout é só um freio, não é o fim. Dependendo da humildade da pessoa em reconhecer o diagnóstico, esse freio, essa pausa para o tratamento pode ser momentâneo, e não pra sempre. Atualmente, eu, Isabella, não preciso mais de remédio. Sou saudável, mesmo com um problema de saúde, aliás, isso é muito importante a gente dizer. E já sei que meu gatilho é excesso de trabalho como o diabético sabe que o gatilho é alimentação. simples assim. Eu entendi que se eu tiver uma agenda em que eu não consiga dormir direito, em que eu fique emendando um compromisso no outro, isso vai me deixar enjoada com a vista turva … Quando percebo que eu estou passando do meu limite, aí eu tenho que dizer "não", não pra mais trabalho, não pra entrevistas, não pra mais compromissos. Eu preciso dizer "não". Eu preciso treinar, lembrar que dizer "não" é o que vai me proteger do burnout.  [trilha sonora] Eu acredito que o fato de ter tornado público o diagnóstico de burnout tenha contribuído muito para trazer o tema pra pauta positiva. Saúde mental, a gente sabe, sempre foi o patinho feio das conversas. Mas em 2020 já entendemos que não é bem assim, não é? As 4 mil pessoas com quem conversei me dão força para continuar com a minha missão, porque uma informação correta pode transformar o futuro de uma pessoa que está chegando à exaustão. Uma informação correta tira alguém do sofrimento. Todos os dias recebo comentários ou pedindo ajuda ou agradecendo por alguma informação que eu tenha compartilhado. [trilha sonora] Hoje, eu luto com unhas e dentes pelas minhas horas de sono e também luto com unhas e dentes para lembrar que as suas horas de sono também são essenciais. São nas horas de sono que a gente recarrega a nossa bateria, de tão simples que é, eu sei que incomoda. Mas, eu repito, dormindo bem, você vive bem. Pode confiar. [trilha sonora] Lúcia Helena Galvão: Competição é palavra de ordem na pauta do dia. Êxito e sucesso só podem vir daí, ainda que o ponto mais alto do pódio possa ser um lugar bem solitário e não tão glamuroso quanto se pinta. O que a Iza começou cedo a perceber foi que este tipo de vida profissional utiliza o efeito torniquete, aperta sempre um pouco mais tirando o fôlego, a respiração, o sangue, a vida … Mas sempre exigindo que se mantenha uma boa aparência e um sorriso nos lábios até o fim. Aí vem o drama da doença invisível, negada e ignorada por tantos. Nós sabemos que o burnout é o irmão caçula de uma lista de doenças invisíveis, que incluem a depressão, a ansiedade e outras. Onde o doente parece não ter nada e estar simulando o próprio sofrimento. Isso faz com que a dor, que já é muito pesada, chegue ao nível do insuportável. Mas a terapêutica que ela empregou é altamente eficiente e sem contra indicações. Acolheu o sofrimento dos outros, discutiu, orientou, posicionou-se, comprometeu-se. Altruísmo é sempre analgésico de alta potência que não só alivia, mas pode até extinguir a dor. E aí está nossa Izabella, profissional como sempre, realizada, curada de burnout, mas severamente contagiada de humanidade. [trilha sonora] Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae. [trilha sonora]

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