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Encerramos a sétima temporada do Podcast Plenae com um relato pra lá de emocionante: a história de Deborah Telesio, que mergulhava enquanto um dos piores desastres naturais da história do planeta ocorria. Em viagem à Tailândia no fatídico ano de 2004, a administradora viu o tsunami ocorrer mais de perto do que gostaria.
Para além desse acontecimento que, por si só, já possui a força necessária para guiar uma narrativa, Deborah ainda traz as nuances de um mesmo acontecimento e, claro, o seu trauma posterior. Representando o pilar Espírito, ela ganha esse espaço justamente pela presença da religião em seu relato.
Praticante do judaísmo, ela pôde contar com a ajuda de árabes que a auxiliaram em seus momentos mais críticos, oferecendo transporte, roupas e acolhimento. Além disso, ela ainda relata ter tido visões e sensações sobrenaturais durante o ocorrido, e garante que foram elas que salvaram sua vida.
O estresse pós-traumático
Se no relato de Deborah, a religião é presente durante o seu período trágico, para muitas outras pessoas, ela surge depois. Isso porque a religião pode ser uma forte aliada no combate ao Transtorno do Estresse Pós-Traumático, também conhecido como TEPT. E o que é ele, afinal?
“O transtorno do estresse pós-traumático faz parte dos distúrbios de ansiedade e é caracterizado por um conjunto de sinais e sintomas físicos, psíquicos e emocionais que acontecem em decorrência do portador ter vivenciado uma situação muito traumática ou violenta, que apresentaram uma ameaça para a vida dele”, explica a psiquiatra Maria Fernanda Caliani, em vídeo para seu canal Neurologia e Psiquiatria.
Esse tipo específico de estresse também pode acontecer caso essa pessoa tenha sido testemunha de uma situação traumática ou violenta, sem necessariamente ter participado ativamente dela. A questão toda é ter sido exposta a algo que ofereceu risco de vida e, apesar de superado, deixou marcas.
“Quando a pessoa se recorda do fato ocorrido, ela revive essa situação como se estivesse acontecendo naquele mesmo momento. Então ele tem a mesma sensação de dor, o mesmo sofrimento. Essa recordação a gente chama de revivescência, e ela desencadeia alterações tanto neurofisiológicas quanto mentais”, continua Maria.
Mas isso não quer dizer que todas as pessoas que vivenciaram uma situação extrema irão sofrer desse transtorno: acredita-se que de 15 a 20% irão desencadear o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. “Mas a parte triste é: a grande maioria só vai procurar ajuda cerca de 2 anos depois e é aí que está o problema. Porque o que os estudos têm mostrado é que, no caso do transtorno, quanto antes se procurar ajuda profissional e especializada, melhor a recuperação e o prognóstico do paciente a longo prazo”, explica a especialista.
Essas pessoas traumatizadas, que podem pertencer a qualquer faixa etária, podem levar meses ou anos para manifestar esses sintomas. Elas ainda estão divididas em três grupos diferentes a partir de suas sequelas:
1- Reexperiência traumática: quando a pessoa começa a ter pensamentos recorrentes e intrusivos - ou seja, ela não quer ter aquele pensamento, mas eles invadem a cabeça dela mesmo sem ela querer. “Ela pode acordar no meio da noite assustada, tendo flashbacks ou pesadelos em que ela relembra tudo que viveu”, diz.
2- Grupo da esquiva e do isolamento social: por medo de relembrar a situação, o indivíduo começa a fugir de situações, contatos ou atividades que possam reavivar as lembranças dolorosas do trauma. “A pessoa deixa de sair, começa a evitar quem estavam junto com ela, deixa de fazer atividades habituais por medo de voltar a sentir tudo que sentiu no dia do trauma”, pontua Maria.
3- Hiperexcitabilidade psíquica e psicomotora: são sintomas autonômicos, ou seja, sintomas físicos decorrentes da descarga de adrenalina. “A pessoa começa a ter taquicardia, começa a suar frio, tonturas, dores de cabeça frequentes, dificuldade para dormir, distúrbios de concentração, começa a ficar mais irritado e hipervigilante”, enumera a psiquiatra.
O diagnóstico só é feito quando os especialistas reconhecem e identificam a existência de um ambiente estressor. Algo como “se não tivesse acontecido aquilo, a pessoa não teria desenvolvido o sintoma”. O tratamento vai envolver o uso de medicações e uma terapia cognitiva-comportamental associada.
Religião X Trauma
Sabemos que o trauma afeta de múltiplas formas o nosso cérebro, e te contamos um pouco mais sobre esse assunto neste artigo. Excesso de estresse, medo, amargura, ansiedade: tudo isso reflete não só no trabalho das pequenas conexões que compõem esse órgão, como despejam uma alta carga de hormônios que estimulam a adrenalina, por exemplo.
Uma pesquisa desenvolvida pela UNIFESP comprovou que pacientes vítimas de estresse pós-traumático apresentam redução de até 10% no córtex pré-frontal (a região responsável pela tomada de decisões, por exemplo) e também do hipocampo, como as crianças. E também sabemos que situações vivenciadas na primeira infância podem reverberar por anos na pessoa.
Sendo assim, os seus sintomas seriam os mesmos que dos pequenos: alteração na memória, concentração e processamento de emoções. Um outro estudo também aponta para uma piora até mesmo do sistema imunológico do indivíduo, além de uma perda de memória recente.
Nessa busca pela cura, a espiritualidade não só pode como deve ser uma das ferramentas utilizadas. Já te contamos aqui no Plenae, inclusive, como a religião pode ser um caminho importante para o autoconhecimento. E quer mais autoconhecimento do que conseguir superar um trauma?
Isso porque o ato de rezar é também uma forma de meditar, e a meditação é tão potente que pode até mesmo alterar o formato do nosso cérebro, como explicamos neste artigo. Mais do que isso, ela possui benefícios amplamente reconhecidos pela ciência no que diz respeito à saúde mental.
Já se sabe que, quando uma pessoa está em plena atividade espiritual, o seu cérebro ativa a região de recompensa - a mesma área ativada quando estamos apaixonados, quando um sujeito usa droga, escuta música ou até quando recebemos um like nas redes sociais.
Tudo que é ligado ao prazer ativa esse mesmo circuito, que por sua vez, libera uma cadeia de hormônios em nossa corrente sanguínea, todos relacionados ao nosso bem-estar - como a dopamina e a serotonina. Isso tudo pode auxiliar não só no prazer momentâneo, mas na cura a longo prazo de um trauma.
A religião, por fim, além de desencadear processos cerebrais tão importantes ainda te ajuda na busca por um propósito de vida. E encontrar a sua missão seria o “lado bom” do trauma, como explicamos neste artigo. É comum em pesquisas com pacientes que sofreram de estresse pós-traumático se depararem com essa segunda fase, onde eles buscam mais sentido para a vida.
E a espiritualidade é uma importante aliada nessa busca, afinal, a fé nos proporciona um encontro direto com nossos valores e ideais. Por essas e outras que a religião - seja ela qual for - deve ser um dos seus pilares principais na jornada do equilíbrio, superação e autoconhecimento.
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