Para Inspirar
A desafiadora onda emocional que acomete mães de diferentes idades, etnias e classe social é mais comum do que se imagina
18 de Novembro de 2022
A maternidade é o momento mais potente que uma mulher pode experimentar - e por isso mesmo, é uma experiência completamente individual, podendo ressoar de infinitas maneiras em cada mãe. Fundadora do Portal Plenae, Geyze Diniz nos contou em entrevista o quanto a maternidade proporciona aprendizados diários para ela, mesmo mais de uma década exercendo essa função.
Há mulheres que optam pela maternidade solo - e milhares de outras que são abandonadas pelos respectivos pais e são forçadas a serem mães solos; há mães que estão inseridas em um contexto cultural específicos e irão desempenhar o seu maternar de maneira igualmente específica; há mães que só decidem ser mães já na maturidade e, graças aos avanços científicos, conseguem; e até mesmo o momento do parto não é igual para todas, afinal, algumas optam pelas técnicas mais humanizadas, um debate ainda repleto de tabus.
Esse amor que passa de mãe para filho - e promove incontáveis benefícios no cérebro dos pequenos - pode vir também recheado de diferentes culpas e angústias, segundo a psicóloga Adriana Drulla, e muito por causa das pressões e expectativas da sociedade quanto a esse papel tido como “sagrado” e, muitas vezes, negligenciando a mulher-mãe que o exerce.
O tema é tão amplo que dedicamos uma edição inteira do Plenae Drops, extinto canal de vídeos do Plenae, somente para o tema, e contamos com a participação da empreendedora Marina Zylberstajn falando sobre a importância da rede de apoio nesse período, a cantora indígena Djuena Tikuna trazendo o papel da ancestralidade em seu maternar, a psicóloga Blenda Oliveira refletindo sobre os caminhos para ser amiga de seus filhos e a jornalista Izabella Camargo contando sua experiência como mãe aos 40 anos.
No Podcast Plenae, tivemos a participação da apresentadora Mariana Kupfer falando sobre a sua corajosa escolha em seguir o sonho de gerar um filho mesmo sem a participação de um pai. E agora, por fim, temos o relato da médica Thaís Bastos, participante da décima temporada, falando sobre mais um tema complexo e extremamente necessário: a depressão pós-parto.
A depressão
Antes de entrarmos de cabeça no tema, é necessário dar um passo para trás. Apesar de cada dia mais falada, a depressão ainda é assunto espinhoso e cercado por mitos e inverdades. Ela é uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde, mesma entidade que criou o CID, ou seja, um sistema de códigos para a classificação internacional de doenças, de forma o mundo todo esteja com a linguagem padronizada entre os médicos, além de monitorar a incidência e a prevalência de cada doença.
Trata-se de um adoecimento psiquiátrico, ou seja, da ordem mental, mas que acaba afetando o físico depois de um tempo. Ela é crônica, recorrente e produz uma alteração do humor caracterizada por uma tristeza profunda, sem fim, associada a sentimentos de dor, amargura, desencanto, desesperança, baixa autoestima e culpa, assim como distúrbios do sono e do apetite.
Ainda, é importante distinguir a tristeza patológica, ou seja, essa que estamos tratando neste artigo, para a transitória, provocada por acontecimentos difíceis e desagradáveis, mas que são pontuais e parte da vida de todas as pessoas. Enquanto a primeira tende a passar até mesmo sozinha ou com apoio psicológico, a segunda já é mais intensa, incapacitante e precisa de auxílio médico em muitos casos.
Atualmente, de acordo com a Pesquisa Vigitel 2021, um dos mais amplos inquéritos de saúde do país, em média, 11,3% dos brasileiros relataram ter recebido um diagnóstico médico da doença. A frequência foi maior entre as mulheres (14,7%) em comparação com os homens (7,3%). Isso nos coloca como o país com maior incidência da doença na América Latina e o segundo nas Américas.
As causas são múltiplas: histórico familiar; desequilíbrio bioquímico cerebral; exposição a episódios traumáticos ainda na infância; consumo excessivo de substâncias como álcool, drogas ilícitas e até determinados tipos de medicamentos; doenças como hipotireoidismo que atua diretamente com nossos hormônios ou a TDPM que te contamos aqui; vivenciar alguma situação muito marcante que pode modificar toda a sua vida; entre outros.
A depressão pós-parto
Um dos motivos que listamos acima como potencial causa para a depressão é vivenciar um momento grandioso, e aqui, não faremos julgamentos sobre ser um momento bom ou ruim, somente ao fato de que nada será igual depois do seu acontecimento.
Dar à luz a uma criança é certamente um deles. Ao longo da gravidez, como já sabemos, uma série de mudanças acontecem com o corpo da mulher e há um trânsito intenso de hormônios. Após dar à luz, uma nova onda de mudanças tanto em seu corpo, em sua dinâmica de vida e, claro, quimicamente há uma queda de uma série de neurotransmissores que atuavam durante a gestação.
Durante a gravidez, a quantidade dos hormônios estrogênio e progesterona aumenta bastante e, já nas primeiras 24 horas após o parto a quantidade desses hormônios baixa rapidamente e continua a cair até a quantidade anterior à gravidez. Mas, é impossível definir essa a única causa para a depressão pós-parto, afinal, há outros fatores que podem contribuir para o adoecimento que podem estar em curso.
O cansaço pós-parto, padrão de sono irregular e falta de descanso suficiente que vêm na sequência geralmente impedem que a mãe recupere sua força total por semanas, especialmente se ela tiver sofrido cesariana. Ela pode ainda sentir-se muito ocupada com um novo bebê para cuidar e duvidar da sua capacidade de ser uma boa mãe - que foi um pouco da angústia que acometeu Thaís Bastos em sua experiência.
Sentir estresse em virtude das mudanças na rotina de casa e do trabalho e estranhar essa nova dinâmica também contribui para a angústia. A cobrança em ser uma ótima mãe, que não irá errar ou que irá amar cada segundo daquela nova vida, pode provocar estafa e gerar um sentimentos de perda – seja perda de controle, da identidade (quem era antes do bebê),da silhueta magra ou até de tempo livre.
Por fim, o confinamento em casa durante o puerpério pode ser muito nocivo - e recentemente, durante a pandemia, todos nós bebemos um pouco da fonte dessa angústia e podemos imaginar, ainda que não completamente, o que passa essa recém-mãe que se vê enclausurada entre quatro paredes, atribuídas com novas funções e muitas responsabilidades.
Sintomas e cura
Para detectar os sintomas da depressão pós-parto, é preciso estar atento nessa mãe não só nas primeiras semanas, afinal, a depressão pós-parto pode surgir até o primeiro ano de vida daquele bebê. Existe até mesmo a depressão pós-parto “tardia”, que surge em seis, oito e em até um ano após o nascimento do bebê. Os sintomas podem incluir:
Inquietação e irritação; uma tristeza muito profunda seguida de choros intensos; falta de energia; dores de cabeça ou no peito; palpitações no coração e/ou hiperventilação (respiração rápida e superficial); dificuldade (ou até incapacidade) para dormir - que gera muito cansaço; perda de peso e/ou ganho de peso, ambos proveniente de uma dieta desbalanceada; problema de concentração e de memória, prejudicando a capacidade de tomar decisões; excesso de preocupação com o bebê; sentimento de culpa e inutilidade; medo de machucar o bebê ou a si mesma; falta de líbido; tendência a olhar para as coisas de uma forma negativa; em casos mais graves, ideações suicidas.
Há ainda três tipos de depressão pós-parto: tristeza materna – a mãe tem mudanças súbitas de humor, como sentir-se muito feliz e depois muito triste; depressão pós-parto – pode acontecer por alguns dias até meses depois do parto de qualquer bebê, não só do primeiro; psicose pós-parto: a mulher pode perder contato com a realidade, geralmente tendo alucinações sonoras.
Há ainda o Baby Blues, mais comum e mais leve, quando essa mulher sente uma espécie de tristeza, nostalgia, cansaço e fragilidade, mas está muito mais atrelado às variações hormonais do puerpério e tende a passar sozinho. Se ele demorar mais do que um mês para ir embora, é um sinal de alerta.
Algumas mulheres podem enfrentar a chamada depressão gestacional, que se dá pelos mesmos motivos e apresenta os mesmos sintomas, porém durante a gestação, e não após o parto. Muitas das depressões pós-parto, inclusive, são resultados de uma depressão gestacional negligenciada.
É importante reforçar que esse mal afeta mulheres de todas as idades, classes sociais e etnias. Qualquer mulher que está grávida que teve bebê nos últimos meses, sofreu aborto ou recentemente parou de amamentar, pode desenvolvê-la. A quantidade de filhos que uma mulher tem não afeta as chances dela desenvolver depressão pós-parto - no caso de Thaís, em seu relato, a depressão se deu mesmo quando ela já havia tido outros filhos e tecnicamente conhecia aquela realidade, o que não a impediu de sofrer da mesma maneira.
A doença pode ser tratada com medicamentos e psicoterapia, mas é preciso encará-la com a seriedade que ela pede, afinal, estamos falando de uma doença que não irá embora se não for devidamente enfrentada. A tendência, diferente de outros tipos de depressão, é que ela vá embora e não apareça mais, pois não possui um caráter tão crônico, e sim mais pontual. Mas não tratá-la pode fazer com que ela se torne crônica e evolua para um quadro de depressão comum.
O tratamento também irá depender, é claro, de cada caso e condição social e psíquica da paciente. Ela pode contar com medicamentos prescritos por um médico que irá levar em consideração sua condição de lactante, ou seja, está amamentando - se for o caso dela.
A psicoterapia será sugerida na maior parte dos casos e é um hábito que não só pode como deve acompanhar essa mulher pelo tempo que for necessário, mesmo após a cura. Por fim, grupos de mães que estão passando pelo mesmo momento são aconselháveis, pois ali essa mulher irá ouvir relatos semelhantes aos seus, o que pode amenizar, por exemplo, a questão da culpa que ela sente em estar assim.
No Brasil, estima-se que 25% das mulheres tenham depressão pós-parto, segundo um estudo feito por pesquisadores da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). Ou seja, uma em cada quatro mães apresenta sintomas após o nascimento do bebê. Liberte-se da expectativa alheia de que o momento da gravidez ou do pós-parto deve ser de extrema excitação e felicidade. Lembre-se que são experiências únicas e, portanto, individuais. Não há certo ou errado, e tudo que você está sentindo é legítimo à sua maneira.
Para Inspirar
Como enxergar as miudezas do dia a dia e fazer delas o seu próprio propósito pode te fazer atingir a felicidade? Especialista responde
25 de Junho de 2020
Apesar de muito usada, poucos conhecem a etimologia da palavra propósito . Conhecê-la pode fazer com que ela faça ainda mais sentido quando aplicada em sua vida. Proveniente do latim, proposĭtu pode ser desmembrada em pro (para mim) + positum (posto, colocado). Portanto, propósito é aquilo que está posto para mim, originalmente.
É claro que, com o tempo, o termo evoluiu. Hoje o utilizamos para designar tudo aquilo que é da ordem da intenção, do objetivo, da finalidade. É quase que um sinônimo para projeto, é aquilo que se busca alcançar todos os dias , segundo a definição da Oxford Languages .
Como diz o seu nome, o bem-estar subjetivo é subjetivo, portanto, pode variar de indivíduo para indivíduo, conforme o seu momento de vida. E o que se sabe sobre ele até então é algo muito próximo ao estudos acerca do estoicismo, também conhecido como “budismo do oriente”.
Esse apelido se dá por conta de suas semelhanças com a filosofia de vida: assim como Buda pregava, os estóicos também não vivem em uma busca exaustiva por essa experiência agradável constante. Para eles, é mais valioso cultuar o agora e a nossa capacidade de fluir conforme o ambiente. “Muito da sabedoria do Buda era também sobre não se amarrar às certezas, que eventualmente poderiam nos obrigar a ir contra o mundo. Mas parte-se do princípio que não se deve nunca deve ir contra ele, pois ele é sempre maior do que nossas expectativas e desejos. E por isso nos adequar é tão importante” continua Fabiano.
Essas filosofias não nasceram hoje, é claro. Desde muito antes de Cristo, existiu um sábio tibetano chamado Confúcio, que também pregava a máxima de “para ser feliz, basta querer ser o que és”. Portanto, feliz é aquele que ama o que tem, ou seja, aquilo que está posto para ele. Lembram do significado de propósito lá do começo do texto? Pois bem.
Parece confuso, mas não é! Enxergar a felicidade como um efeito colateral de outras atitudes e nunca como o objetivo principal é o que nos faz efetivamente atingi-la. E entender que ela não se dá de forma absoluta e suprema, como fomos ensinado, mas sim que ela mora nos momentos cotidianos da vida.
“Existem artigos de neurologia e psiquiatria que apontam que as pessoas que mais buscam felicidade são as mais adoecidas mentalmente. É super importante deixar isso claro: a felicidade é um efeito colateral de um propósito. Se tivéssemos uma fórmula para alcançá-la, ela basicamente só teria dois componentes: momentos de bem-estar no dia a dia e, de forma mais ampla, uma ideia que me dá sentido à vida” diz.
Qual é uma das maneiras mais efetivas de tornar o presente prazeroso? Sendo grato, como dissemos neste artigo . E qual é a maneira mais fácil de tornar minha vida mais adequada? Tendo um propósito. Se você juntar os dois, o efeito colateral será a felicidade.
Voltando um pouco ao sábio Confúcio, a felicidade tem mais a ver com desejar o que já se tem, com essa sensação, ainda que transitória, de completitude. A felicidade não se trata de uma viagem onde o que importa é o destino, mas sim um passeio onde o que importa é a trajetória.
“O cérebro tem uma capacidade muito grande e espontânea de desejar, mas muito pequena em se sentir satisfeito com o que tem. Isso não é só cultural, existe algo de biológico mesmo e hoje nós sabemos dos circuitos neurais e do processo que a gente chama de adaptação hedônica ” explica o especialista. E o que seria essa adaptação? “Vamos imaginar assim: você começa a namorar e no começo é tudo maravilhoso, mas passando um tempo, você começa a antecipar o comportamento do outro. Quando o cérebro começa a ter maior competência de previsibilidade, menor é a liberação de dopamina, portanto menor o prazer daquela ação de forma isolada” continua.
E aí, de repente, o trabalho que você queria tanto já não tem mais graça, assim como seu novo carro ou viagem. Essa confusão em achar que satisfação momentâneas são felicidades plenas é onde mora o erro: é preciso exercitar nossa mente e entender que não enxergamos o mundo como ele é, mas sim como nós somos. E por que isso é importante? Porque eu preciso entender que, sem essa compreensão, eu vou estar sempre nesse modo automático do desejo na falta, e não na presença.
O filtro que temos do mundo é um processo ativo, influenciado pela nossa família e pela cultura onde estamos inseridas. Para mudar esse cenário interno e passar a enxergar a vida com mais propósito, é preciso enxergar os pequenos bem-estar subjetivos cotidianos que, quando juntos, resultam em um ser humano feliz e satisfeito.
O propósito do sujeito pode ser somente individual, mas quando aliado à uma preocupação com o bem-estar coletivo, ele é potencializado. “Vivemos no Ocidente, lugar onde o grande alvo da felicidade é o indivíduo. No Oriente, mesmo hoje em dia, é o coletivo que importa. Nem sempre a felicidade de uma pessoa tem a ver com o propósito de toda uma sociedade. Mas a evidência maior é a de que, quando agregamos um propósito pessoal à um acréscimo de bem-estar para humanidade , a felicidade é ainda maior” continua.
“Então considerarmos o outro nesta fórmula é muito importante, porque de novo, eu acho que esse ponto é super importante dialogar no texto. O outro importa muito, nós não somos uma ilha, fazemos parte de um contexto. E importar-se com esse contexto torna seu propósito muito mais forte” conclui Fabiano.
Atente-se às miudezas do seu próprio cotidiano, enxergue valor nelas e faça disso o seu propósito. A felicidade virá como consequência para sua vida e sua rotina.
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